Houve falha no manejo dos alimentos oferecido às girafas importadas da África do Sul pelo Bioparque do Rio, em novembro de 2021 – considerado pela Polícia Federal como ”o maior caso de tráfico de animais da história do Brasil’ – e, por isso, mais uma foi à óbito em 8 de julho.
Divulgado em 12/7, o laudo da necropsia da quarta girafa morta nas dependências do Resort Safari Portobello, em Mangaratiba, na Costa Verde do Rio de Janeiro – realizada pela equipe de patologistas da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) – revelou que o animal faleceu devido a “acidose láctica ruminal“, causada por sobrecarga de carboidratos, o que certamente levou a um distúrbio do metabolismo.
Portanto, a hipótese de que ela teria morrido devido à infecção provocada pelo parasita Haemonchus sp e à sua resistência aos medicamentos (como contamos aqui) foi descartada. Segundo o Bioparque, seis girafas foram infectadas. Agora, são cinco.
Assinado por Daniel Guimarães Ubiali, professor de Patologia Veterinária da UFRRJ, e Asheley Henrique Barbosa Pereira, doutorando em Patologia Veterinária, o laudo ainda informa que a girafa apresentou periodontite (inflamação da gengiva e dos tecidos que sustentam os dentes), sem relacioná-la com a acidose.
O BioParque informou que tomografia simples do crânio da girafa já foi realizada e que será feita mais uma – desta vez computadorizada de alta geração, em Araçatuba, São Paulo-, para investigar se há relação da periodontite com o distúrbio alimentar.
Dieta
Grãos como milho e soja – além de alfafa, capim e feno – fazem parte da dieta de girafas que vivem em zoológicos e em cativeiro, e as porções devem ser ministradas por seus cuidadores de acordo com peso e idade do animal.
Este cuidado é imprescindível para sua saúde visto que certos grãos têm carboidratos que fermentam rápido e alteram o rúmen (parte do estômago de ruminantes que tritura os alimentos), tornando-o mais ácido, ou seja, com PH reduzido, o que pode levar à ‘acidose ruminal’.
Quando esse problema acontece, o animal fica apático e desidratado, diminui o consumo de alimentos ou para de comer e a frequência respiratória aumenta, assim como os batimentos cardíacos.
Para detectar o problema, o ideal é medir o PH do sangue e da urina, mas como a coleta costuma ser difícil em animais de grande porte, recomenda-se retirar ou diminuir a quantidade de grãos.
“O que aconteceu foi algo fora do controle deles. Provavelmente, algum acidente ocorreu e o resultado foi acidose ruminal”, declarou Ubiali ao G1, destacando que, no histórico sobre os animais, enviado pelo BioParque à universidade, a empresa disse que a “dieta é ideal e balanceada”.
A dieta: “alimento concentrado: ração de bovino (Bezerrão Guabi 18%) dividido em três alimentações diárias de 1,8kgs (8h, 12h e 16h); volumoso seco: Feno de alfafa (ad libtum); volumoso fresco: Sansão-do-campo e leucena (como enriquecimento alimentar)”.
A seguir, leia a nota divulgada pelo BioParque em 12/7, a cerca do laudo da necropsia.
Nota de esclarecimento
“O Bioparque do Rio apresentou para as autoridades, na data de hoje, o laudo de necropsia elaborado pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) que aponta a causa mortis da girafa que veio a óbito na madrugada do dia 8 de julho.
O laudo de necropsia indica que a causa mortis foi ocasionada por acidose láctica ruminal que é um distúrbio metabólico de ruminantes podendo ser causada por diversos fatores, que continuam sendo investigados para uma conclusão mais precisa.
O parque reitera mais uma vez o seu pesar pela perda da girafa e segue comprometido com o bem estar dos animais e em esclarecer com transparência os fatos relacionados ao ocorrido aos órgãos competentes e a sociedade”.
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Foto de abertura (apenas ilustrativa): Andy Holmes on Unsplash