Assim que a votação sobre a tese jurídico-política do marco temporal sobre a demarcação de terras indígenas foi derrubada pela maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), em 21 de setembro, integrantes da bancada ruralista se uniram para afirmar que o resultado não altera sua estratégia de aprovar a pauta no Congresso Nacional.
Os povos indígenas sabem que a luta continua – o PL sobre o marco temporal está em tramitação no Senado -, mas não têm um minuto de paz.
Os senadores que defendem o agronegócio (e a mineração) em terras indígenas afirmam que, mesmo que a decisão do STF seja de repercussão geral – ou seja, sirva de base para outros 226 processos menores sobre o mesmo tema que estavam parados aguardando o resultado do julgamento – “não gera efeito vinculante para o Poder Legislativo”, declarou o senador Marcos Rogério (PL/RO). Sendo assim, “o Parlamento pode legislar sobre esse assunto, seja uma legislação ordinária ou mesmo alteração do texto constitucional”.
Por isso, eles querem apressar a votação do Projeto de Lei 2903 (ex-PL 490, aprovado na Câmara dos Deputados) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado esta semana (talvez na próxima-quarta-feira, 27/9) e viabilizar a deliberação do texto no Plenário.
Parlamentares contrários ao marco temporal reivindicam que, antes de seguir para votação no Plenário, o PL seja apreciado pelas comissões de Direitos Humanos e do Meio Ambientevisto que sua aprovação impactaria a vida dos indígenas e resultaria em mais devastação.
Em 11 de setembro, as ministras Sonia Guajajara, dos Povos Indígenas, e Marina Silva, do Meio Ambiente, também empreenderam esforços nesse sentido ao se reunirem com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e suas equipes para tratar do tema e reforçar o perigo dos “jabutis” embutidos no texto, que vulnerabilizam, ainda mais, os indígenas, em especial dos povos isolados.

PEC para fixar a tese na Constituição
Além de avançar com o PL no Congresso, a bancada ruralista está elaborando um “plano B”: uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que fixaria a tese do marco temporal na Constituição, para a qual o senador Hiran Gonçalves (PP-RO) recolheu as assinaturas necessárias e protocolou a PEC com o aval do presidente da Frente Parlamentar da Agricultura, Pedro Lupion.
A intenção é que a PEC garanta maior segurança jurídica para o conteúdo do projeto de lei(que envolve os ‘jabutis’), que poderia ser questionado após a decisão do STF.
Durante sessão da CCJ, a senadora Eliziane Gama (PSD/MA), o PL xxx que poderia ter sua constitucionalidade questionada. “Não há dúvida nenhuma de que a lei não vai vigorar porque a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) será impetrada, sem nenhuma dúvida, pelos órgãos que trabalham a questão ambiental brasileira. Ou seja, nós poderemos votar um projeto que vai cair por vício de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal”.
“Se presidente vetar, a gente derruba o veto”
Para justificar a insistência agressiva pelo marco temporal, os parlamentares ruralistas dizem que a decisão do STF cria insegurança jurídica e que é preciso “devolver tranquilidade para o setor produtivo”.
“Há um clima de preocupação no Brasil a partir dessa decisão. Cabe ao Parlamento devolver um conjunto normativo que devolva a segurança para quem está no campo produzindo”, declarou o senador Marcos Rogério, que é relator do PL 2903.
Parece que eles acionaram o rolo compressor para passar por cima de qualquer iniciativa que possa impedi-los de vencer. Tanto é que o senador Zequinha Marinho (Podemos/PA) disse, taxativo, que, se o presidente Lula não sancionar o que for decidido no Congresso [certo da vitória], a bancada ruralista vetará seu veto.
“Não muda nada. Nós queremos aprovar (o PL), vamos trabalhar para que o presidente possa sancionar a lei. Se vetar, a gente vai se unir para derrubar o veto. A missão continua”, declarou. “[O julgamento] não altera em nada o nosso trabalho”.
(Vale lembrar que Zequinha Marinho é citado na Operação Handroanthus, da PF, sobre a maior apreensão de madeira da história, que tornou réu o ex-ministro do meio ambiente e atual deputado federal Ricardo Salles).
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Fontes: Agência Brasil, Brasil de Fato, G1, BBC Brasil
Foto (destaque): Joédson Alves/Agência Brasil