Após dois anos e dois meses, finalmente a maioria do Supremo Tribunal Federal (STF) julga inconstitucional a tese jurídico-política do marco temporal sobre a demarcação de terras indígenas.
A votação ainda estava no inicio quando o ministro Luiz Fux declarou sua decisão (foi o primeiro a se pronunciar hoje) e, em todas as partes do país indígenas celebraram: se abraçaram, choraram de emoção, gritaram, iniciaram rituais, cantorias e danças para marcar a vitória, que também tomou as redes sociais. E que vitória!
A votação continuou e, em seguida, foi a ministra Cármen Lúcia que se uniu a Edson Fachin (relator), Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli e Luiz Fux contra o marco temporal. E disse não!
Ela e Rosa Weber, presidente da Corte, têm sido aguerridas colaboradoras na luta pela proteção dos povos indígenas desde a gestão de Bolsonaro, e tornaram-se muito mais próximas deles com o governo Lula e as presenças de Sonia Guajajara, Joenia Wapichana, presidente da Funai, e Célia Xakriabá, deputada federal (que aparece na foto de destaque deste post, de autoria de Edgar Kaynako).
O voto de Weber foi declarado depois do intervalo e também confirmou a inconstitucionalidade do marco. A ministra não queria se aposentar (ela sai em 28 de setembro) sem, antes, finalizar este julgamento e entregar resultado favorável para os verdadeiros donos destas terras. E conseguiu!
Até Gilmar Mendes – que, no segundo dia do voto longo e cansativo do “ministro terrivelmente evangélico” André Mendonça, fez um aparte que gerou revolta entre os indígenas e todos que lutam por eles -, hoje votou contra o marco temporal. Foi o último: 9 x 2.
Resultado incide sobre processos judiciais em curso
Assim, Kássio Nunes Marques e Mendonça ficaram isolados em sua descarada posição a favor de proprietários de terra e contra os indígenas, ignora a história dos povos indígenas.
Neste julgamento, os ministros do STF analisaram pedido de reintegração de posse – feito pelo governo de Santa Catarina sobre terras demarcadas do povo Xokleng -, baseado na tese ruralista, que determina que a demarcação de uma terra só pode ser feita se os povos indígenas a ocupavam no dia da promulgação da Constituição Federal: 5 de outubro de 1988. Ou seja, não leva em conta que a maioria havia sido expulsa de seus territórios ou fugiu para não ser exterminada.
Por ser considerado julgamento de repercussão nacional, a decisão sobre o marco temporal e o destino do povo Xokleng tem impacto também em processos judiciais em curso, que tratam de disputas de terras, quanto em relação à demarcação de terras pelo governo federal. Ou seja, deve orientar o Poder Executivo (Congresso) em questões semelhantes.
Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, em agosto, havia 226 processos suspensos nas instâncias inferiores do Judiciário, aguardando a definição deste tema. Imagina resolver todas essas pendências com mais rapidez…
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Foto (destaque): Edgar Kanayko