Um áudio obtido pela organização Ampara Silvestre esta semana revela que a deputada federal Carla Zambelli, que assumiu em março a Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, está tentando barrar a aprovação do projeto de lei (PL 6054/2019), que acrescenta um parágrafo ao artigo 82 do Código Civil para dispor sobre “a natureza jurídica dos animais domésticos e silvestres“.
Na gravação, a deputada conversa com o biólogo e apresentador de TV, Richard Rasmussen, e pede o apoio dele e do “pessoal da bancada pet” para “tentar segurar a questão da segurança jurídica dos animais”.
Ouça o áudio abaixo:
O PL 6054, de autoria do deputado federal Ricardo Izar, e conhecido como #AnimalNãoÉCoisa, pode ser um grande avanço para a proteção da fauna brasileira.
“Os animais ganham defesa jurídica em caso de maus-tratos, já que não mais serão considerados “coisas” (maneira como são referidos na atual lei), mas seres passíveis de sentir dor ou sofrimento emocional. Outro grande avanço é o aumento da pena contra maus-tratos, que passe a ser de até 4 anos – hoje não ultrapassa 1 ano. Isso vai ajudar no combate ao tráfico de animais silvestres”, explica a Ampara Silvestre.
O projeto já foi discutido e aprovado pela Câmara dos Deputados e no Senado. Como sofreu alterações neste último, o texto deve ser aprovado novamente pelos deputados. E segundo a gravação mostra, é aí que Zambeli está usando seu poder de presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável para não pautar a mudança na vida de milhões de animais.
Rasmussen, a quem a deputada pede ajuda, foi nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro ‘Embaixador do (eco)turismo’ há dois anos. Uma péssima escolha. Entre 2002 e 2009, ele foi autuado oito vezes pelo Ibama por causa de denúncias e flagrantes de maus tratos contra a fauna, com multas que ultrapassam 250 mil reais. A maior parte das autuações aconteceu em Carapicuíba, São Paulo, onde o apresentador tinha o Criadouro Conservacionista Toca da Tartaruga, sem comprovação de origem das espécies, e que foi fechado em 2005.
Já a “bancada pet” a que Zambelli se refere são os parlamentares interessados em aprovar a ampliação da lista de espécies consideradas ‘de estimação’ e com comércio permitido no Brasil.
Desde 2007 existe no Brasil uma resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) que estipula os critérios para que uma espécie silvestre nativa possa ser autorizada como animal de estimação no país, a chamada “Lista Pet”. Já o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) teria seis meses para elaborar a referida lista e assim definir quais espécies poderiam ser criadas e comercializadas. Todavia, a que foi apresentada não foi aceita e desde então, não há uma nova.
No entanto, nos últimos quatro anos iniciou-se um debate, entre esses órgãos do governo e representantes de organizações não-governamentais (que sonhavam com uma lista zero) e também criadores de animais silvestres (que gostariam de uma lista extensa) para se chegar a um acordo sobre a polêmica Lista Pet (leia mais aqui).
Nas redes sociais, há vários protestos contra a intenção de Carla Zambelli em barrar o PL #AnimalNãoÉCoisa.
Ontem, 08/07, por 10 votos a 8, o projeto foi retirado da pauta da Comissão de Meio Ambiente. A deputada alegou que o texto é inconstitucional e que quer abrir a proposta para mais debates e ouvir outras partes envolvidas, como por exemplo, criadores de cães guias ou associações que usam animais em terapias. Afirmou ainda que “ama os animais”.
“A proposta que a Zambelli está fazendo já aconteceu. O debate já foi feito. O projeto tramita desde 2013. Ele já passou por todas as comissões de mérito da Câmara, passou pela constitucionalidade na CCJ, foi pro Senado, onde foi discutido nas comissões, foi feito acordo com o pessoal da pecuária dos animais de produção e agora não tem mais o que se discutir, o projeto já está aprovado – o que está em discussão são as emendas do Senado, sim ou não”, diz Ricardo Izar.
O autor do PL ressalta que o texto está há dois anos na comissão e isso é inadimissível. Ele tramita com regime de prioridade, por isso precisa ser votado logo. “A presidente da comissão precisa ser imparcial. Ela deve colocar o projeto em votação e deixar o plenário, que é soberano, decidir. Inconstitucionalidade não tem nenhuma no projeto, que inclusive foi tema de um seminário na OAB, que reuniu advogados do país inteiro”, afirma.
Izar destaca que se Carla Zambelli quer fazer uma consulta pública sobre as emendas do Senado ao texto, ótimo, mas não ao mérito do projeto, pois ele já foi amplamente discutido.
*Texto atualizado às 13h para incluir a entrevista do deputado Ricardo Izar ao Conexão Planeta
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Foto: Divulgação/Câmara dos Deputados