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A fome pelos 25 centavos


A base. O suporte. A falta dele. A falta do mínimo, do ínfimo, a falta de centavos. Dos 25 centavos. De 25 em 25 vamos sendo engolidos pelo casamento da ganância com a dura falta de consciência social. De 25 em 25 o arroz vai faltando no prato e só sobra mesmo quando é jogado no lixo depois da comilança na festa em que os casais de noivos abastados recebem a chuva de arroz como demonstração dos convidados de desejo de prosperidade e fertilidade.

Infrutíferos governos que só sabem oferecer à população, além dos discursos de violência e preconceito, retirada de direitos e aumentos de tarifa. No caso da tarifa do transporte coletivo – que subiu no calor do período de feriado de carnaval, quando ninguém pensa em outra coisa – é a prefeitura de Curitiba que vai se firmando como a mais irresponsável nessa área. Já subiu duas vezes a tarifa na gestão e pretende subir mais uma vez ano que vem. A intenção deve ser incentivar a locomoção por aplicativos.

Vai-se enchendo a rua de carros, poluição e neuróticos congestionamentos. Vai, a prefeitura, desincumbindo-se da função básica do bem cuidar do transporte. Menos gente andando de ônibus, tarifas absurdas, horários cada vez mais espaçados entre um ônibus e outro e nós empilhados, enquanto quem deveria estar amontoada – na cadeia – é a corja responsável pela desadministração e roubo no transporte coletivo, que afunda em problemas.

Queríamos é deixar mergulhadas as nossas moedinhas jogadas na fonte depois do pedido de que nos salvemos dessa bandalheira em que somos obrigados a chafurdar. Mas não podemos deixar nossos 25 centavos lá no fundo. Precisamos deles. Somados são quinze reais a mais por mês. Do arroz, do feijão, do pão. Da falta de chão. De desejos e pedidos em vão. E não tem tapete que abafe o choro da frustração, que amorteça a queda. O ruído do tilintar do nada é impiedoso. O capital consome. E bem mal consumimos.

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Nossa preocupação está no âmago, no cerne, no eixo. Equilibrados, sim, no nosso salário que mal dá para comprar a comida – com agrotóxico, lógico.  Com moeda em flor e em dor nem nós, nem os animais, nem as abelhas conseguimos nos defender dos defensivos.


De minha parte, me consolo com esse marcador de livros da artista francesa Marie Lamarche. Ganhei da minha amiga cineasta, também francesa, Silvi Simon. Há anos quero falar dele. E agora achei a oportunidade.

Como é reconfortante saber que também sou uma, mais uma que pertence, que está nesse mundo, que tenta não ser código de barras. Mais uma que some, se dissolve na multidão. Mais um risco sem nexo, mais um ser que preserva, apesar de tudo, identidade e certezas. Ainda tenho o grão de feijão que me cabe nesse latifúndio e espero que continue a ter até que eu vire adubo. Torço para que você também tenha a sua refeição, ração e não tenha que escolher entre ela e andar no busão do abusão que é essa cidade, esse estado, esse país.

Fotos, vídeo e concepção: Karen Monteiro

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