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Suje os pés para entrar

Wilson Castilho: suje os pés para entrar

Limpar os pés para entrar em casa. Melhor. Tirar o sapato para deixar o que é da rua na rua.  Não é só para facilitar a limpeza semanal do chão que recebe mais do que os passos apressados das chegadas e saídas. Entre sutilezas e rudezas, o andar com os pés nus confere a eles, os pés, o direito de marcar salas e quartos com rastros um tanto suados do descalçar fresco. As relações entre casa e dono mudam. A sensação de descanso solto passa a imperar.

Se o capacho da entrada for como esse do artista paranaense, da Universidade Estadual de Ponta Grossa, William Castilho, a coisa melhora muito. Você tira os sapatos na entrada e esfrega os pés bem esfregados nesse tapete de terra. Dá um ufa, uma aterrissagem segura, um descarrego do cotidiano em que nos enterramos.

Aquele pé todo cheio de nova energia. Todo forrado de terra limpa. Preparação de um novo terreno, um novo chão… Entre a sujeira profissional e perdoável da rua na sola do sapato e a terrinha livre no pé, sou mais a terrinha.

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Uma terrinha boa… O tapete podia começar lá no saguão do prédio… Dava até para plantar umas couves, alfaces… Orgânicos, não preciso nem dizer.  Sabe que um pessoal inteligente de condomínio tem plantado hortas junto com o jardim? Tem visto beleza nos frutos, legumes e folhas. Outra estética de paisagismo, outra via de pensamento, outra forma de se alimentar…

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Enquanto isso, uma amiga que quis fazer isso na frente da casa dela no condomínio sofreu represália do síndico. E olha como estava bonito. Teve que tirar tudo e deixar só grama. O reinado da grama e da grana. Belas e caras espécies decorativas (só porque o pessoal da moda e consumo acha) invadindo o lugar dos matinhos medicinais que poderiam estar se alastrando e curando por aí. Tudo em nome dessa beleza apática, programada e sem vida.

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Você vai me dizer que laranja, abacaxi, banana são feios? Me diz: romã é feia? Aquela que você come na passagem do ano, seca e guarda as sementes na carteira para dar sorte…  Vê como as coisas se completam… O tapete de William já vêm com romã. O final do ano está chegando. Dá para plantar um pomarzinho como meta para 2017.  E a barra de ferro você usa para alimentar e suportar a pequena árvore.

Ferro na terra, com ar e água, vai deixar as romãs ainda mais vermelhas. Vai ajudar a fixar o nitrogênio, sintetizar a clorofila. Troncos e raízes vão se desenvolver melhor. Nós nos desenvolveremos melhor. E é esse o desenvolvimento que importa, BRICS.  Deixar em pé ou colocar em pé, célula verde, em cima de célula verde. É uma construção: tijolo por tijolo.

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Pode ser queda por queda. De água. Movida à pincelada grossa. Tinta espessa que William coloca para fazer a catarata caminhar, a natureza fluir. Que sempre haja espaço para o transitório se transformar com plenitude. Que todas as romãs sejam tratadas como obra de arte. Algo que não se prende, que não pode ser detido. Compreendido talvez quando se enxerga o ponto em que terra e semente se confundem. Em que morte e vida já fazem parte da mesma imensidão. Onde belo-feio, sujo-limpo, grande-pequeno, rico-pobre não existem.

Tem que haver nesse universo inteiro algum planeta assim, sem essa dualidade barata… Um lugar que nunca tenha ouvido falar desses conceitos e diferenças. Lá os seres vivem de vento, na brisa. E isso não é monótono. É um emocionante nada, então, diríamos? Para nós que vivemos no mundo das classificações e estamos à mercê da montanha russa das emoções, pode até ser. Mas, nesse planeta não. Ato e palavra emocionante são desnecessários. Só há paz.

Fotos: divulgação e arquivo pessoal

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