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Há tantos voos além daquele da bituca…

Como ninguém dá muita bola, o gari segue varrendo. Um trabalho solitário e, já se disse, invisível. Quem já prestou atenção, já olhou o rosto do gari, aquele mesmo que vem atrás da lixeira ambulante na qual o passante faz voar para dentro a bituca de cigarro acesa? Quem olhar um dia qualquer, pode acabar vendo uma cara agitada, mas que nem se assusta mais, tentando apagar um começo de incêndio, usando a água da garrafa que carrega quase que obrigatoriamente durante o trabalho. Seria para beber, mas a vida é assim. Quando menos se espera somos chamados a apagar esses pequenos incêndios, me conta o gari, que só conversa porque eu puxo papo.

Vai falando e varrendo. Perto do ponto de ônibus, a concentração de bitucas que voaram para o chão, com aquele chega pra lá do indicador, é maior. O coletivo vindo, a última tragada indo… E já não dá tempo de correr até a lixeira mais próxima. Depois de tanto perigo de incêndio estou para te dizer que o gari deve preferir varrer as bitucas misturadas às flores murchas que voaram do ipê, trazendo cor para a calçada e tornando esse inverno, já quase primavera, menos cinzento e enfumaçado.

Mas não é fácil fugir do enjoo e escuridão ao encarar o conteúdo de certas lixeiras. As do muralista paulista Eduardo Kobra, então, carregam tanta desilusão, engano e falta de compromisso com o cidadão, que enjoo vira vômito nesse emparedamento doente de inoperância e problemas.

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Com uma escada real que se molda à arte, Kobra atinge um jeito de tornar o dia mais bonito, de fazer o vento soprar colorido e infantil. Sensível e delicado como o catavento que movimenta alegria, brincadeira pintada e… Também emparedada. No muro, no espaço público, na fronteira entre o escondido e o mostrado. Entre aquilo que o olhar vê e deixa passar pela agitação do horário para chegar ao trabalho. Um emparedamento que deixa a cidade, às vezes mais bonita, às vezes mais crítica, às vezes mais  o que você quiser…  Que deixe sempre mais plural. Que represente os cidadãos que a ocupam, que pintam, esculpem e vivem o que se tem para viver na cidade, cheia de dimensões e formas. Objetos e exageros.

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O 4D de Kobra no chão poderia encerrar essa necessidade de estar na frente, de dirigir, de precisar da armadura do carro para tudo. E de se esconder atrás da direção.

Que tal se mostrar atrás do guidão. Da bicicleta. Aberta romanticamente à carona como nesse mural de Kobra, ainda sem nome, que foi inaugurado em São Paulo, na semana passada.  A obra está na parede lateral de um hotel na Faria Lima, na Rua Tavares Cabral, 61, em Pinheiros.

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A parede tem 60 metros de altura por 13 de largura.  É a segunda vez que ele fala de bicicleta em sua obra. Em maio de 2015, pintou na Rua Oscar Freire, em São Paulo, o mural “Genial é Andar de Bike”, em que mostra  \Albert Einstein pedalando uma bicicleta, pensada a partir de uma foto famosa do cientista.

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Viagens pelo mundo, mural para Olimpíada, pintura para Neymar. Kobra está em todas. Tem grafites por mais de cem países. É pop. É exemplo. É um apaixonado por bicicletas. Pedala por São Paulo há mais de uma década. E está chamando você para pedalar também.

Resolva as suas equações. Os ingredientes todos temos. Energia, massa, velocidade. Não precisa ser a da luz. E se quiser põe um fone de ouvido e vai curtindo um Luiz Gonzaga. Isso se estiver num lugar calmo… No meio do trânsito é capaz de você se distrair demais… Não pense muito. Vá em frente. Às vezes, é bom não relativizar tanto e sentir o vento na cara, essa coisa rara para nossa alma tão desacostumada a voar por aí.

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https://youtu.be/-HOpYMRFG1A

Fotos: divulgação Eduardo Kobra

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