Com o intuito de ir além do presente e evoluir na forma de contar histórias, em 2019 a revista americana TIME lançou uma nova lista de pessoas influentes, a TIME100 Next, que apresenta líderes em ascensão ou lideranças do futuro, chamando a atenção para aqueles que têm alcançado o máximo de influência em suas áreas, periodicamente.
“Uma grande revista e uma grande empresa de comunicação não devem apenas refletir o presente, mas também impulsionar-nos para a frente, mostrando os futuros líderes e como será o futuro da sociedade”.
Na edição de estreia, a deputada federal Tabata Amaral foi a única escolhida do Brasil, classificada na categoria Líderes. Em 2021, foram a cantora Anitta (categoria Artistas) e o então líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) Guilherme Boulos, atual deputado federal (Líderes).
Agora, no 2023 TIME100 Next, o país está muito bem representado por três brasileiras: a jovem liderança e ativista indígena, Txai Suruí (Defensores), e as deputadas federais trans Erika Hilton e Duda Salabert (Líderes).
Jovem e pioneira
Filha do cacique Almir Suruí, da etnia Paitér Suruí, e da ativista Neidinha Suruí, Txai “já possui o tipo de credenciais acumuladas ao longo de uma vida inteira em defesa de direitos”, destaca a TIME em seu perfil.
“Integrante da comunidade indígena Paiter Suruí no Brasil, a ativista de 26 anos fundou o Movimento da Juventude Indígena de Rondônia, que mobiliza jovens de seu estado e coordena a Associação de Defesa Etnoambiental – Kanindé, organização comunitária que tem atuado com os povos indígenas há mais de 30 anos”.
Txai é formada em Direito – a primeira mulher em sua comunidade a obter o diploma -, o que lhe valeu
(juntamente com colegas) processar o governo brasileiro por não cumprir seus compromissos de emissões no âmbito do Acordo de Paris.
Ela também foi a primeira indígena a falar na Cúpula dos Líderes numa COP do Clima– Conferência de Mudanças Climáticas da ONU, em novembro 2021 (COP26, em Glasgow, na Escócia).
A revista conta que, “com a ajuda de câmeras, drones e tecnologia GPS, ela trabalha com sua comunidade para monitorar invasões de terras e melhorar a responsabilização”.
Para Txai, defender os direitos humanos implica proteger os direitos e as terras dos povos indígenas: “Somos filhos da Mãe Terra. Estamos propondo soluções para adiar o fim do mundo”.
Primeiras parlamentares trans do Congresso
As trajetórias da mineira Duda Salabert e da paulista Erika Hilton são marcadas por episódios de perseguição, ódio, violência e ameaças de morte. Antes e durante a carreira política.
Afinal, elas vivem no país que mais mata pessoas trans e travestis no mundo: em 2022, foram 132. E, apesar dessa realidade tão brutal, não deixaram que nada as impedisse de conquistar suas aspirações.
Antes de entrar para a política e ser eleita vereadora em Belo Horizonte (a mais bem votada da cidade), em 2020, Duda dedicava-se às aulas de literatura – até 2021, quando foi demitida, segundo ela, por “preconceito, a partir da pressão de pais de alunos”, e também ao ativismo como ambientalista, que nunca abandonou.
Em 2022, disputou uma cadeira na Câmara dos Deputados e se elegeu, tornando-se uma das parlamentares trans do Congresso (com Érika) e a primeira por Minas Gerais.
“Estamos na luta para ressignificar tudo isso a cada dia e dizer ao mundo que existimos, somos humanas e merecemos dignidade”, declarou no Instagram.
A revista revela, ainda, que Duda é apaixonada por questões como falta de moradia e transporte público, e estava em negociações para concorrer à prefeitura de Belo Horizonte, a sexta maior cidade do Brasil. Em pesquisa de ‘intenção de voto estimulada’, realizada pelo DataTempo, a Duda aparece em 3º lugar, “empatada tecnicamente com o 2º lugar”, explicou.
A história de rika também tem rejeição: não aceita pela família, viveu na rua e teve que se prostituir para sobreviver. Formou-se em pedagogia e gerontologia, mas sua vocação para a política se manifestou já na universidade, no movimento estudantil.
Antes de ser eleita deputada federal, nas eleições de 2022, participou da Bancada Ativista do PSOL, de 2018 a 2019, e em 2020 foi eleita a vereadora mais votada do Brasil e a primeira trans na ALESP – Assembleia Legislativa de São Paulo.
“É com muito orgulho que, pela segunda vez, faço parte de uma lista da TIME de novas lideranças escolhidas pelo impacto na formação do futuro” (em 2021, Erika e a cantora Iza estiveram entre 20 líderes da Nova Geração da TIME). “Este ano, ao lado de figuras como a liderança indígena Txai Suruí e minha colega de parlamento, Duda Salabert”, completou no Instagram.
“É uma honra e uma responsabilidade fazer parte desse novo imaginário que representa a mudança na sociedade e na representação política”, finalizou.
Em julho redigiu o projeto de lei que implementa quotas para pessoas transexuais nas universidades, num esforço para diminuir a dependência econômica das pessoas trans na prostituição.
“Um diploma de ensino superior pode tornar realidade para muitos de nós o sonho de sair das ruas e, para os mais novos, a possibilidade de nunca entrar nessa vida”, escreveu no X (ex-Twitter). “Não são apenas as pessoas trans que serão beneficiadas. Será o Brasil inteiro”.
______________
Leia também:
– René Silva é eleito um dos 10 jovens mais influentes do mundo pela revista TIME (2023)
– Anielle Franco está entre as doze “Mulheres do Ano” da Time, líderes que lutam por um mundo mais equalitário (2023)
– Lula entra na lista de 100 pessoas mais influentes de 2023 da revista TIME (2023)
– A líder indígena Sonia Guajajara e o pesquisador Tulio de Oliveira estão entre as 100 pessoas mais influentes do mundo eleitas pela revista TIME (2022)
– Luiza Trajano está entre as 100 pessoas mais influentes da revista TIME (2021)
– Lázaro Ramos, Taís Araújo, Gil do Vigor, Erika Hilton e Edu Lyra estão entre os 100 afrodescendentes mais influentes do mundo (2021)
– Duas brasileiras estão entre as 100 mulheres mais influentes e inspiradoras do mundo na lista da BBC 2020: educadora Cibele Racy e a modelo transgênero Lea T. (2020)
– Revista ‘Time’ elege os dez jovens mais influentes do mundo: entre eles, a sueca Greta Thumberg e o brasileiro David Miranda (2019)
– Duas brasileiras estão na lista da BBC das 100 mulheres mais inspiradoras e influentes do mundo (2019)
Fotos (destaque): Gabriel Uchida (Txai) e divulgação/TIME