Revista ‘Time’ elege os dez jovens mais influentes do mundo: entre eles, a sueca Greta Thumberg e o brasileiro David Miranda

Desde 2014, a revista americana Time escolhe os jovens mais influentes do mundo, aqueles que, por sua atuação, fazem a diferença e podem ser considerados futuros líderes: The Next Generation LeadersAlgumas listas já tiveram 30 ou 20 indicações e se limitaram a adolescentes. A deste ano tem dez eleitos com idades que variam entre 16 e 35 anos,

Cada um, a seu modo, é um ativista: pelo clima, pela transformação social, de gênero, na ciência, na política, na arte… trilhando caminhos bem diversos. São eles:
– Greta Thunberg, a adolescente de 16 anos sobre a qual falamos, aqui no site, desde o ano passado e pela qual temos profunda admiração. Num dia de agosto do ano passado, ela “matou aula” pra protestar contra a inércia dos adultos – empresários, governos etc – em relação às mudanças climáticas e inspirou milhares de jovens pelo mundo a fazerem o mesmo. Em fevereiro, com seu movimento Fridays for Future, reuniu quase um milhão e meio de jovens em mais de 120 países; e
– David Miranda, 34 anos, brasileiro, negro, gay, que cresceu na favela do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, é deputado federal e luta na Câmara dos Deputados, em Brasília, pelos direitos dos negros, dos LGBTs, de minorias como indígenas e quilombolas e dos pobres, contra os retrocessos defendidos pelo governo Bolsonaro; 
Tessa Thompson, atriz americana bissexual, que acredita no poder do cinema para criar empatiapara temas como a desigualdade de gênero; 
Tune Wey, chefe de cozinha nigeriano, que usa a comida como ferramenta para denunciar injustiças; 
Ramla Ali, boxeadora que fugiu da guerra civil da Somália e quer ser a primeira atleta olímpica da categoria por seu país de origem; 
Ethan Lindenberger, ativista americano que luta pelo direito às vacinas: ele se vacinou contra a vontade da mãe; 
Kim “Geguri” Se-Yeongamerda Coreia do Sul, que está ajudando a transformar o mundo dos e-sports, ainda sob domínio masculino; 
Diana El Wedidi, cantora e compositora egípcia, que se inspira na história de seu país para inspirar mudanças para o futuro; 
Rosalía, cantora catalã que faz interpretações modernas para composições flamencas e é um fenômeno pop e 
Carryminati (Ajey Nagar),youtuber indiano que está entre os mais seguidos e usa sua influencia para abraçar suas origens.

Mas, para mim, dois dos jovens eleitos pela Time se destacam de maneira especial, falam mais ao meu coração. Greta, por entender que é preciso agir contra as mudanças climáticas já e inspirar jovens que até agora estavam adormecidos. E David, por ser brasileiro e, como destaca a reportagem da revista americana em seu site, uma das vozes que “que enfrentam a extrema-direita no Brasil”. Por isso, escolhi suas fotos para ilustrar este post e conto um pouco mais sobre eles a seguir.

Peripécias pelo clima

Em agosto do ano passado, Greta Thunberg se postou em frente ao Parlamento, em Estocolmo, com um cartaz que dizia Greve Escolar pelo Clima e distribuiu panfletos desabafando: “Estou fazendo isso porque os adultos estão “cagando” para meu futuro”. E, assim, chamou a atenção do mundo e dos colegas. 

Jovem ativista sueca consegue garantia da União Europeia de investimento de US$ 1 trilhão no clima

Não demorou muito para que a adolescente engajada criasse o movimento Fridays For Future, que só cresce e incentiva os estudantes a realizar greves semanais pelo clima, como ela. Os estudantes belgas levaram tão a sério a proposta da adolescente que, por causa de suas manifestações e cobranças a ministra do meio ambiente renunciou, veja só.

E, desde que se tornou conhecida, Greta não para de participar de eventos relacionados ao clima. Em dezembro do ano passado, foi à 24ª. Conferência sobre Mudanças Climáticas da ONU, na Polônia (foto abaixo). Em palestra, disse duas frases contundentes: “Já que nossos líderes se comportam como crianças, teremos que assumir a responsabilidade que eles deveriam ter assumido há muito tempo” e “Políticos não ganham eleições se falarem a verdade sobre as mudanças climáticas”. 

Em fevereiro, a União Europeia se comprometeu com Greta a investir um trilhão de dólares em projetos pelo clima. Um mês depois, ela foi indicada ao Prêmio Nobel da Paz. Em março também, inspirou jovens do mundo todo a ir para as ruas protestar em uma greve mundial pelo climaForam mais de 1,4 milhão de estudantes de120 países, em cerca de 2.500 cidades. O Brasil aderiu pela primeira vez, com a participação de mais de 20 cidades (foto abaixo). 

Certamente, foi o maior movimento pelo clima que já aconteceu até agora. Nem as Marchas pelo Clima registraram tanta gente: segundo a ONG 350.org, em 2015, reuniram 750 mil pessoas, em 2016, cerca de 600 mil.

Em abril, Greta concorreu a um prêmio de R$ 100 mil na França, e venceu pela votação popular. Doou o montante para quatro ONGs: Greenpeace Internacional, Care, Adaptation Fund e 350.ong. 

A garota atribui sua determinação ao diagnóstico de Asperger, que é uma forma leve de transtorno do espectro doautismo. “Isso me faz ver o mundo de forma diferente. Eu vejo através de mentiras mais facilmente”, disse ela à Time. “Não gosto de falta de compromisso. Pra mim, você é ou você não é sustentável, não pode ser um pouco sustentável”. 

Greta fala muito à vontade tanto sobre a síndrome quanto sobre suas experiências com depressão, ansiedade e distúrbios alimentarese explica: “Ser diferente não é uma fraqueza. É uma força em muitos aspectos, porque você se destaca da multidão”. E completa: “Antes, eu quase não falava, agora, falo com o mundo inteiro”. Muito inspiradora.

Agora, veja (abaixo) como ficou linda a capa da edição de 27/5 da Time, com Greta. A imagem foi feita pela fotógrafa holandesa Hellen van Meene, próximo do Parlamento sueco em Estocolmo, durante uma das greves semanais pelo clima, no final de abril. Greta não viaja de avião por causa das altas emissões de carbono. Hellen também não viajou de avião em respeito à garota. A ida de Heiloo, sua cidade natal, ao norte da Irlanda, para a capital sueca, levou dois dias de trem.

A política como destino e propósito 

David Miranda tem 34 anos, nasceu e cresceu na favela do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, é negro, gay, foi vereador junto com Marielle Francoos dois foram os primeiros vereadores LGBT da cidade -, se tornou suplente do deputado federal Jean Willys e o substituiu no cargo quando, em janeiro, este decidiu deixar o país por causa de ameaças de morte. 

Perdeu o pai com 5 anos. A mãe, quando tinha 13. Sua vida só ganhou novos contornos quando, em 2005, conheceu o americano Glenn Greenwald na praia. Glenn, 52 anos, é advogado e jornalista, criador do jornal The Intercept, que ganhou versão brasileira antes do impeachment da presidenta Dilma Roussef. Estão juntos desde então, têm dois filhos adotivos – de 9 e 11 anos – e 25 cachorros resgatados da rua. Ambos militam pela proteção dos animais.

David se envolveu com política em 2013 – antes de se formar em publicidade e marketing – quando, junto com Gleen, participou de uma investigação em parceria com o jornal britânico The Guardian e a National Security Agency. A experiência adquirida nessa empreitada tornou inevitável encontrar seu destino: a política no Brasil. “Tive que ir para a linha de frente”. 

Em 2015, fez um trabalho profundo com adolescentes para debater questões sobre racismo e direito das mulheres e, no ano seguinte, foi eleito vereador junto com Marielle Franco, ambos do PSOL – Partido do Socialismo e da Liberdade. Em 2018, ela foi brutalmente assassinada e, até hoje, os mandantes continuam impunes, apesar de seus executores terem sido presos, este ano. 

Marielle era mais do que uma colega de trabalho, era uma amiga de David, que não confia na polícia para solucionar o caso. Por isso, apelou para a OEA – Organização dos Estados Americanos e para a ONU, que já pressionaram o governo brasileiro. Foi uma atitude importante para que essa barbaridade fique registrada internacionalmente, mas, num cenário como o que estamos vivendo, a esperança de que os culpados paguem pelo que fizeram se esvai a cada dia.

Nesse ínterim, David tornou-se suplente do deputado federal Jean Wyllys. Mas, em janeiro deste ano, reeleito, Jean abriu mão de seu mandato devido à intensidade das ameaças de morte que ele e sua família sofriam. David, então, assumiu sua vaga. 

Para a reportagem da Time, contou que teve medo de falar ao microfone nas primeiras semanas de atuação no Congresso Nacional como deputado. Afinal, Bolsonaro assumia o governo e a onda de homofobia e racismo corria solta pelo país desde sua eleição. E ele já vinha sofrendo ameaças como Jean. “Eu tremia todos os dias. Esse lugar não é construído para pessoas como nós”.

Quando finalmente criou coragem para falar, convocou os colegas a não esquecerem dos mais pobres e a imprimirem uma batalha feroz contra a corrupção. Ele disse que quer “ser uma ferramenta para a democracia. Pessoas que não têm voz devem me usar para defendê-los”. Ele acredita que a vitória de Bolsonaro trouxe uma maior consciência para a importância da política na vida dos cidadãos. Nesse quesito, compara tal interesse com o aumento de candidatos progressistas nos Estados Unidos, como a jovem Alexandria Ocasio Cortez, que venceu as eleições intermediárias para o Senado, no final do ano passado, com 82% dos votos (leia texto do blog ‘Ideias que Movem’ sobre ela).

David disse à Time que sua missão é ajudar a transformar o desejo de mudança dos brasileiros – no qual se alicerçou e se alicerça Bolsonaro, de forma mentirosa – em ações que impactem, de forma positiva, os mais vulneráveis. Difícil tarefa! Mas coragem para cumpri-la parece que não lhe falta. Ser incluído na lista dos dez jovens mais influentes do mundo confirma isso.    

Fotos: Hellen Van Meene (Greta) e Gui Christ (David) / Divulgação Time

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Mônica Nunes

Jornalista com experiência em revistas e internet, escreveu sobre moda, luxo, saúde, educação financeira e sustentabilidade. Trabalhou durante 14 anos na Editora Abril. Foi editora na revista Claudia, no site feminino Paralela, e colaborou com Você S.A. e Capricho. Por oito anos, dirigiu o premiado site Planeta Sustentável, da mesma editora, considerado pela United Nations Foundation como o maior portal no tema. Integrou a Rede de Mulheres Líderes em Sustentabilidade e, em 2015, participou da conferência TEDxSãoPaulo.