Um dia após a Advocacia-Geral da União (AGU) divulgar parecer jurídico favorável à concessão de licenciamento ambiental para exploração de petróleo na Bacia da Foz do Rio Amazonas, em 23/8, Marina Silva, ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), participou de audiência pública na Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado.
Questionada sobre o assunto, na ocasião ela declarou que “não existe conciliação para questão técnica. Não se pode fazer acordos com análises técnicas”. E exemplificou:
“Alguém vai ficar teimando com a Anvisa, dizendo ‘não esse remédio aqui é tóxico’. Aí alguém resolve mandar pra uma decisão política, se o remédio é tóxico ou não é tôxico? Existem órgãos da administração política que dão parecer técnico. A mesma coisa são os processos técnicos de licenciamentos do Ibama. E, em um governo republicano, a gente olha para o que a ciência está dizendo”.
A fala da ministra diz respeito ao que anunciou a AGU, em nota: além do parecer, a instituição também contou que pediu a abertura de um processo de conciliação entre os órgãos envolvidos – Ibama, MMA e MME -, além da Petrobras.
“Digo isso por entender que [a região da Foz do Amazonas] é uma área altamente sensível, e que não temos o conhecimento das correntes na região. Já tivemos, inclusive, um acidente, quando um dos equipamentos [de perfuração] ficou fora de controle”. E concluiu: Eu sempre digo: o Ibama não dá licenças políticas, o Ibama dá licenças técnicas, ele não facilita e nem dificulta”, finalizou Marina.
A ministra ainda lembrou a negativa que o Ibama deu, em 2018, para perfuração na mesma área, quando o bloco ainda pertencia a uma outra empresa petrolífera, a francesa Total.
Com tranquilidade, ela foi categórica, o que é perfeitamente coerente com sua trajetória e com o compromisso assumido pelo presidente Lula – inclusive em seus pronunciamentos fora do país – no combate à crise climática (apesar de sua última declaração sobre o assunto, veja a seguir).
Entenda o caso
O documento da AGU foi elaborado a pedido do Ministério de Minas e Energia (MME) para checar a viabilidade jurídica para que a Petrobras possa iniciar os testes técnicos de exploração no bloco FZA-M-59, localizado a 175 quilômetros da referida foz.
Mas o parecer jurídico da AGU contraria o parecer técnico do Ibama, divulgado em maio, que negou pedido da Petrobras para realizar perfurações marítimas no local. O órgão alegou “inconsistências técnicas” para garantir uma operação segura nessa nova área exploratória, entre elas a ausência de Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS). E é justamente esse o ponto de “conflito” (leia a nota do MMA sobre parecer da AGU que trata dessa avaliação).
A Advocacia Geral da União destaca que a AAAS não é obrigatória para se obter o licenciamento e, por isso, não pode ser impedimento para que empreendimentos de exploração de petróleo e gás natural obtenham o licenciamento ambiental.
Vale lembrar que, logo após a negativa do Ibama, em maio, Jean Paul Prates, presidente da Petrobras, declarou aos conselheiros da companhia que a autorização sairia “em seis meses”. E que, no início deste mês, em entrevista coletiva à imprensa, Lula se pronunciou a favor da exploração de petróleo na Amazônia: “Vocês podem continuar sonhando”, disse.
Não faz o menor sentido insistir na exploração de petróleo diante do cenário apocalíptico que algumas regiões do planeta – como Mauí, no Havaí, e as florestas do Canadá, por exemplo – têm protagonizado devido ao aquecimento global.
É preciso garantir não só a proteção da riqueza biodiversa da Bacia da Foz do Rio Amazonas (parte ainda desconhecida certamente), mas também a vida dos povos indigenas e ribeirinhos, que seriam barbaramente afetados por mais esta exploração insana e desnecessária. Marina e o Ibama estão fazendo sua parte, mas prossegue a queda de braço perpetuada pela ganância.
Outros temas abordados na audiência
A participação de Marina Silva na audiência no Senado – na companhia do secretário-executivo do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, da secretária Nacional de Mudança do Clima, Ana Toni e do presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho -, não foi tomada apenas por temas espinhosos como esse.
Na ocasião, ela destacou avanços efetuados por seu ministério rumo à transição ecológica do país, tais como a bioeconomia, o reforço ao Ibama para fiscalização e a volta do Bolsa Verde, como também o auxílio financeiro para comunidades indígenas e tradicionais.
A ministra também citou os primeiros resultados do novo PPCDAM – Plano Nacional Contra o Desmatamento na Amazônia (“Em menos de 4 meses já conseguimos uma redução do desmatamento de 42%) e anunciou que lançará o PPCerrado, novo plano contra o desmatamento no bioma que tem tido recordes de destruição nos últimos meses. Ele será aberto à consulta pública no mês de setembro.
Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado
Parabéns