Após a denúncia feita na semana passada pela Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres (Renctas) de que 30 araras brasileiras foram vendidas para o Green Zoological, Rescue and Rehabilitation Kingdom, zoológico que está sendo construído na Índia, através de uma nota enviada pela assessoria de comunicação ao Conexão Planeta, o Ministério do Meio Ambiente afirmou que “O Ibama, como autoridade administrativa do Brasil para a Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (CITES), e o ICMBio, autoridade científica da CITES e responsável pelos Planos de Ação Nacional de Conservação das Espécies Ameaçadas de Extinção, não foram consultados sobre a transferência de ararinhas-azuis e araras-azul-de-lear para a Índia no primeiro semestre de 2023, conforme reportado pelo relatório CITES SC77-33-08, que trata da transferência dos animais pela Association for the Conservation of Threatened Parrots“.
A nota diz ainda que, “diferentemente do que foi afirmado no relatório, a transferência não ocorreu no contexto dos programas de conservação das espécies. Nenhuma instituição na Índia participa de programas de conservação de espécies brasileiras, incluindo o Programa de Manejo Populacional da Ararinha-Azul”.
A Association for the Conservation of Threatened Parrots (ACTP) é um criadouro particular de aves com sede em Berlim, na Alemanha, parceiro do governo brasileiro no programa de reprodução em cativeiro da ararinha-azul e responsável pela construção, financiamento e manutenção do Refúgio Silvestre de Curaçá, na Bahia, onde é realizado o projeto de reintrodução da espécie, que conta com a participação do ICMBio (leia mais aqui).
A “transferência” das araras brasileiras para o zoológico da Índia, que envolveu valores não divulgados, só foi revelada porque é mencionada na pauta da reunião da Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies Silvestres Ameaçadas de Extinção (CITES), que acontecerá na semana que vem, em Genebra, na Suíça, e em que será discutida uma recomendação para o estímulo à comercialização da ararinha-azul e da arara-azul-de-lear, como “forma de financiar o trabalho de conservação e garantir populações de reserva”.
Vale ressaltar que tanto a ararinha-azul (Cyanopsitta spixii) como a arara-azul-de-lear (Anodorhynchus leari) são endêmicas do Brasil, ou seja, não existem na natureza em nenhum outro lugar do mundo. Apesar do programa em andamento de reintrodução da ararinha e do nascimento dos primeiros filhotes em Curaçá, a espécie ainda continua considerada extinta na vida selvagem. Já a de-lear está na categoria “em perigo de extinção”, segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
O Conexão Planeta também questionou o Ministério do Meio Ambiente sobre sua posição diante da proposta que será discutida na Suíça para a comercialização das aves. O Brasil é um dos signatários da CITES.
Segue a resposta que nos foi encaminhada:
“Ibama e ICMBio são terminantemente contrários ao comércio de ararinhas-azuis e araras-azul-de-lear, mesmo sob argumento de custear ações para programas de conservação, e não aprovam sua venda sob qualquer justificativa. Danos em potencial são de difícil reversão para a conservação das espécies.
Não há excedente na população em cativeiro de ararinhas-azuis que justifique movimentações para atividades que não sejam de conservação. Trata-se de uma espécie extremamente rara, de baixo sucesso reprodutivo e alta endogamia, que depende de considerável variabilidade genética para vencer as adversidades de seu ambiente natural. Por um longo período, será totalmente dependente das ações de conservação conduzidas pelas instituições brasileiras e seus parceiros. Toda ararinha-azul é essencial para o programa de conservação.
O posicionamento do Ibama e do ICMBio foi encaminhado ao Ministério das Relações Exteriores para subsidiar a atuação da diplomacia brasileira na próxima reunião da Convenção Cites, neste mês”.
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Foto de abertura: João Quental, CC BY 2.0 via Wikimedia Commons