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Hidrelétrica no rio Arinos, no norte do Mato Grosso, pode significar a destruição de uma cultura única, do povo Rikbatksa

Uma imensidão verde no imaginário do mundo inteiro. Uma massa viva e densa, rica e única. A Amazônia se agiganta por quase metade do Brasil. E só se mantem de pé regada por suas águas. Sustentada por sua gente.

No mosaico de terras e águas, nas entranhas do norte do Mato Grosso, está o Rio Arinos, o berço da vida para o povo indígena Rikbaktsa.

Não são moradores da floresta. São parte dela. Filhos de sua força, herdeiros do poder de resistir. Os Rikbaktsa são guerreiros das águas, gente moldada com os pés nas corredeiras do rio Arinos.

O avanço dos não-indígenas pelo seu território gerou no passado a perda de mais de 70% de sua população. Mas tal qual madeira nobre, perseveram. Recuperados, cultivam persistência na defesa de seus direitos, de suas terras, de um modo de vida único.

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Há séculos, esse povo divide espaço com e história com o tutãra, um molusco bivalve, filho da água doce.

A casca de nácar perolado guarda um arco-íris inteiro gestado dentro do rio. Sobrevive no leito do Arinos, em condição de vulnerabilidade. São joias raras do precioso colar que adorna as noivas, que celebra o feminino nos rituais.

Para coletar o tutãra, de tempos em tempos, os Rikbaktsa navegam em silêncio. Homens e mulheres seguem em seus barcos buscando dos céus penas do mutum-carijó e do gavião-real.

Da água, a concha do tutãra. Por causa dela o Arinos, tem para a etnia central singularidade. Nas praias, recolhem outro presente do rio: pequenos caramujinhos waribubutsa .

De volta à aldeia o preparo é honra feminina. Altera a atmosfera da comunidade: são elas, as mulheres, juntas, no milenar ofício da quebração, furação e lixação de cocos para fazer contas de colares. Uma a uma as conchas tutãra são lapidadas com esmero até tomar a forma de peixes

Depois o algodão é torcido. Nascem das mãos experientes os cordéis-base do tutãra, nome dado também a uma espécie de véu das noivas da etnia.

É ele quem amarra a madrepérola colhida no rio, esculpida por mulheres, num ritual coletivo.

É a união de uma comunidade inteira no fazer do adorno. Aos fios e conchas, cocos e caramujos, se unem plumárias, sementes, técnica e talento.

Quando está pronto é mais que enfeite. É a síntese do casamento. Uma construção cuidadosa de toda a população, feita no tempo certo, com a técnica que os antepassados deixaram e os presentes que a floresta dá.

Tão complexo, tão belo, tão ameaçado. A possibilidade de construção da Usina Hidrelétrica Castanheira no leito do Arinos deve destruir não só o curso d’água.

Pode extinguir o molusco tutãra. Pode assassinar a tradição. O saber ancestral dos Rikbatksa, oral, puro, singular, pode ser engolido pelas obras da hidrelétrica.

Não há outro povo indígena capaz de produzi-lo. Ele é fruto dos Rikbaktsa, e os Rikbaktsa são frutos do rio.

O que para alguns é progresso, às margens do rio pode significar destruição.

A seguir, assista ao documentário produzido por Adriano Gambarini (autor da foto) e narrado por Laís Duarte, sobre o povo Rikbaktsa e a produção do colar de conchas encontradas apenas no Rio Arinos

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