Com a pandemia, as viagens, ao menos pra mim, ficaram para trás. A melhor forma de conhecer outros mundos – ouvir histórias, sentir cheiros e sabores, se encantar com artesanias e se deixar permear pela alteridade – abreviou-se em lives, vídeos e leituras.
Isso traz consequências diretas, obviamente, para o setor do turismo. E ainda mais para o chamado turismo de base comunitária.
Por isso, hoje, quero apresentar um empreendimento amazônico de turismo indígena de base comunitária, o Serras Guerreiras de Tapuruquara, que funciona no município de Santa Isabel do Rio Negro, no noroeste do Amazonas.
O empreendimento conta com atuação, direta ou indireta, de 13 comunidades das Terras Indígenas Médio Rio Negro I e Médio Rio Negro II, e os roteiros das expedições oferecidas contemplam práticas culturais e experiências amazônicas guiadas pelos povos indígenas.
O objetivo é dar a conhecer a cultura e a diversidade do território, experimentando outros modos de vida e estabelecendo uma maior conexão com um território indígena e com a Amazônia.
O projeto foi pensado pela ACIR – Associação de Comunidades Indígenas e Ribeirinhas como estratégia para promover geração de trabalho e renda nas comunidades, especialmente para mulheres e jovens.
O foco do trabalho está na valorização dos conhecimentos tradicionais das roças e das práticas alimentares.
Rede de parceiros
A gestão do empreendimento é realizada pela ACIR em parceria com operadores de turismo de base comunitária.
A FOIRN – Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro e o ISA – Instituto Socioambiental são parceiros no aprimoramento da capacidade de gestão.
A Garupa, que assessora iniciativas de turismo de base comunitária (e já teve um blog, aqui, no Conexão Planeta), atua conjuntamente na formatação e monitoramento dos roteiros e do modelo de negócio.
Nos dois primeiros anos da iniciativa – 2017 e 2018 – foram realizadas oito expedições, que beneficiaram mais de 100 famílias das cinco comunidades envolvidas diretamente, quase 500 pessoas, de oito etnias.
As 13 comunidades associadas à ACIR também foram beneficiadas indiretamente com o fortalecimento da Associação e o monitoramento do território, realizado por meio das expedições.
Em 2019, foram realizadas cinco expedições, sendo uma delas voltada para potenciais parceiros e clientes, envolvendo operadoras de turismo de base comunitária, com o objetivo de formar rede de parceiros para inserir a iniciativa no mercado formal.
Em 2020, a pandemia do coronavírus forçou a interrupção das atividades, sendo a maior preocupação manter a segurança das comunidades.
Campanha ajuda a manter as comunidades seguras
Os povos indígenas da região do Médio Rio Negro enfrentam desafios como conflitos geracionais, adensamento da ocupação territorial, migrações para zonas urbanas, além das pressões e ameaças externas de pesca e caça ilegais e mineração.
As comunidades buscam soluções sustentáveis e autônomas para acesso à água e geração de energia.
O turismo indígena em modelo de base comunitária e associado à gestão territorial tem potencial para minimizar esses problemas, oferecendo oportunidades para o desenvolvimento sustentável do território por meio da geração de renda, melhora da autoestima e resgate cultural.
Camila Barra, consultora da Garupa, parceira na concepção e implementação das expedições, aponta que a pandemia da covid-19 é uma grande incógnita sobre o futuro do empreendimento.
“A vacinação já começou entre os indígenas, mas ainda assim o cuidado é importante até que ela chegue a todos. A incógnita é quando haverá ampla vacinação para que não só os indígenas, mas também os visitantes, estejam protegidos”, ressalta.
“A única ação estruturante e que ampliou a capacidade do sistema de saúde no Rio Negro foi coordenada pela FOIRN, em parceria com os órgãos locais de saúde, a Sesai, a Funai e com apoio dos Expedicionários da Saúde e dos Médicos sem Fronteiras”.
Por meio da campanha Rio Negro, nós cuidamos! lançada pela FOIRN em junho do ano passado, foram implementadas enfermarias de campanha no território, não apenas nas sedes municipais.
Com uma rede de apoiadores crescentes, entre eles os operadores de turismo, agências parceiras, visitantes das expedições e o Programa de Aceleração da Plataforma Parceiros pela Amazônia (PPA), foram investidos recursos também para apoiar ações de distribuição de alimentos e de orientação de segurança sanitária.
Camila relata que, em 2020, a covid-19 levou o senhor Jaime Rodrigues, do povo Baré, pessoa mais velha e líder da comunidade de Cartucho, sede da ACIR e das atividades do Serras Guerreiras de Tapuruquara, juntamente com seu irmão.
“Nas cidades, muita gente adota uma postura de que a pandemia acabou. É muito importante manter os cuidados, porque os mais velhos estão sensíveis e vulneráveis”, conta.
Como apoiar a campanha
A campanha Rio Negro, nós cuidamos! continua ativa, agora focada no enfrentamento à segunda onda da covid-19, buscando garantir promoção da saúde, direito à informação e segurança alimentar para 23 povos do Rio Negro, no Amazonas.
A iniciativa é coordenada pelas mulheres indígenas da FOIRN e trabalha em sinergia com equipes de saúde, Funai, Exército/FAB e outras instituições.
Conta também com parceira do ISA e colaboração do projeto Asas da Emergência, do Greenpeace, no transporte aéreo de materiais e insumos de Manaus para o Alto Rio Negro, que fica a mil quilômetros da capital amazonense.
Confira o vídeo da campanha, logo abaixo. O apelo é de Dadá, liderança do povo Baniwa.
Edição: Mônica Nunes
Foto: Marcelo Monzillo/Acervo ISA