Mimada. Manipulada. Riquinha. Marionete da esquerda. Financiada pela Open Society de George Soros. Essas são algumas das acusações feitas contra Greta Thunberg nas mídias sociais. A última delas – vergonhosa e mentirosa -, foi postada no Twitter, ontem (26/09), por Eduardo Bolsonaro, com uma montagem de imagens muito mal feita e grotesca.
A verdade é que a jovem ativista sueca, de apenas 16 anos, anda incomodando muito gente, gerando a reação e comentários maldosos de haters nas redes e a elaboração das mais diversas teorias conspiratórias para explicar porque ela se tornou um mito.
Escrevi pela primeira vez sobre Greta Thunberg em dezembro de 2018. Na ocasião, ela fez um discurso durante a Conferência das Nações Unidas para o Clima, a COP24, na Polônia (leia mais aqui).
Ela foi convidada a falar no evento porque cinco meses antes tinha começado uma greve solitária em frente ao parlamento da Suécia. Protestava contra a inação de seu governo em tomar medidas mais drásticas contra as mudanças climáticas. Os suecos tinham passado há pouco tempo uma onda de calor como nunca antes havia acontecido no país escandinavo, enfrentando inclusive, incêndios florestais.
Greta, em seu protesto solitário em Estocolmo
Para ilustrar aquela minha primeira reportagem sobre a adolescente, fiz diversas pesquisas sobre ela. E tive dificuldade em achar uma fotografia em que ela aparecesse sorrindo. Em um texto do The New York Times, descobri a razão. Greta tem a síndrome de Asperger, uma forma leve de autismo. O sintoma mais comum apresentado pelos portadores é dificuldade de socialização, ou seja, interagir com outras pessoas. Entretanto, os psicólogos são categóricos em afirmar que o Asperger não possui nenhum problema cognitivo. Pelo contrário.
É fácil encontrar citações a pessoas famosas que também foram diagnosticadas com a síndrome, entre elas, o físico Albert Einstein, os escritores Hans Christian Andersen e Lewis Carroll, a poeta Emily Dickinson, o diretor de cinema Stanley Kubrick, o matemático e astrônomo Isaac Newton e o artista plástico Andy Warhol. Em comum, todos eles deixaram sua marca na história, seja por sua genialidade, inteligência ou talento.
Coincidentemente, alguns meses antes de escrever a matéria sobre Greta na Polônia, eu tinha assistido a um programa sobre o britânico David Packham, um dos maiores especialistas de aves do mundo, e também, portador de Asperger. Ele contava como teve que aprender a “conviver” com outras pessoas para poder trabalhar e disseminar seu estrondoso conhecimento sobre aquilo que mais gostava: os pássaros. Packham tem diversos programas na televisão da Inglaterra.
A inspiração para a greve
Assim como o apresentador teve sempre seu interesse focado nas aves, por volta dos 9 anos, Greta descobriu as ameaças das mudanças climáticas. A partir daquele momento, ela só conseguia pensar nesse problema.
Em um post no Facebook em fevereiro de 2019, a jovem ativista contou como surgiu a ideia para a greve, em frente ao parlamento, em Estocolmo.
“Em maio de 2018, fui uma dos vencedoras de um concurso de redação sobre o meio ambiente, realizado pelo jornal sueco Svenska Dagbladet. Publiquei meu artigo e algumas pessoas entraram em contato comigo, entre elas, Bo Thorén, da Fossil Free Dalsland. Ele tinha algum tipo de grupo com pessoas, especialmente jovens, que queriam fazer algo sobre a crise climática…
Tive algumas reuniões por telefone com outros ativistas. O objetivo era apresentar ideias de novos projetos que chamariam a atenção para a crise do clima. Bo tinha algumas idéias de coisas que poderíamos fazer. Tudo, de marchas a uma ideia vaga de algum tipo de greve escolar, inspirada pelos estudantes de Parkland, que se recusaram a ir à escola após os tiroteios na escola (massacre que resultou a morte de jovens nos Estados Unidos).
Gostei da ideia de uma greve escolar. Tentei fazer com que os outros jovens se juntassem a mim, mas ninguém estava realmente interessado…Então, continuei planejando a greve sozinha e depois disso não participei de mais nenhuma reunião…
No dia 20 de agosto, sentei-me diante do parlamento sueco. Entreguei folhetos com uma longa lista de fatos sobre a crise climática e explicações sobre porquê eu estava em greve. A primeira coisa que fiz foi postar no Twitter e Instagram e logo se tornou viral. Então começaram a aparecer jornalistas e jornais. Um empresário sueco envolvido no movimento climático, Ingmar Rentzhog, foi um dos primeiros a chegar. Ele falou comigo e tirou fotos que postou no Facebook. Essa foi a primeira vez que eu o conheci ou falei com ele. Eu nunca tinha me comunicado ou encontrado com ele antes…
Muitas pessoas gostam de espalhar boatos dizendo que tenho pessoas “atrás de mim” ou que estou sendo “paga” ou “usada” para fazer o que estou fazendo. Mas não há ninguém “atrás” de mim, exceto eu. Meus pais estavam o mais longe possível dos ativistas climáticos antes que eu os conscientizasse da situação”.
Desde a publicação do texto acima, sete meses atrás, Greta Thunberg já foi indicada ao Prêmio Nobel da Paz, apareceu na capa da revista Time, foi eleita “Mulher do Ano” pelo jornal sueco Expressen e Embaixadora da Consciência da Anistia Internacional. Sua greve inspirou outros milhões de estudantes a seguirem seu exemplo e tomarem as ruas das principais cidades do mundo para exigir de seus governos mais ação perante a crise climática.
No último dia 20 de setembro, o movimento criado por ela, o #fridaysforfuture, conseguiu mobilizar cerca de 4 milhões de crianças, jovens e adultos, em uma sexta-feira histórica.
A ativista junto a outros estudantes, em passeata na Europa
Propagação de mentiras nas redes sociais
E cada vez que Greta ganha maior evidência, sua presença causa mais desconforto entre algumas pessoas. De Eduardo Bolsonaro, com seus comentários desprezíveis e debochados no Twitter, passando por Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, que nega o aquecimento global e o que diz a ciência, até gente comum, que fica espalhando notícias inverídicas sobre a jovem ativista.
Será que as pessoas não se dão conta que se houvesse algum “financiador secreto” por trás da ativista, a mídia internacional já não teria descoberto? Sério mesmo?! Será que os jornais mais respeitados do mundo, como The Guardian, The New York Times e Washington Post colocariam sua reputação em cheque ao respaldar o movimento iniciado pela jovem?
Para aqueles que alegam que a adolescente tem um “problema”, Greta já afirmou diversas vezes, que considera a síndrome como um “super poder”.
Estive presente durante a manifestação realizada próximo à Casa Branca, em Washington D.C., que contou com a presença da menina sueca. Pessoalmente, é possível ver seu claro desconforto em estar no meio de tanta gente. Significa que ela se esforça para se sentir à vontade diante de multidões por um bem maior: sua luta para que possamos reverter os prejuízos que já causamos ao planeta.
Outras dizem que Greta Thunberg não está falando novidade nenhuma. Não, realmente não está. E isso faz a situação ficar ainda mais triste.
Ela mesma lembra, constantemente, que se líderes mundiais tivessem ouvido os cientistas décadas atrás, ela não precisaria ter começado a greve.
E por que ela está sendo mais ouvida do que outros escritores e cientistas? Porque ela foi para as ruas, enfrentou políticos nos parlamentos europeu e britânico, foi ao congresso americano e nunca se mostrou intimidada. Greta não tem ‘meias palavras’. Seu discurso é direto. Franco. Honesto. Ela quer o comprometimento de governos em reduzir suas emissões de gases de efeito estufa. Não no futuro, mas agora. Porque se esperarmos mais tempo, será tarde demais. Os efeitos das mudanças climáticas já podem ser sentidos em todos os continentes: enchentes e secas históricas, incêndios florestais, extinção em massa de espécies.
A jovem sempre usa em seus discursos estudos e dados científicos
Uma adolescente que fala verdades inconvenientes
Greta também incomoda muita gente porque tem a ‘audácia’ de ser uma jovem dizendo verdades para adultos. “Quem ela pensa que é”, dizem seus detratores. Na nossa sociedade, devemos respeito aos mais velhos e a seu conhecimento. Muito justo e verdadeiro. Todavia, isso não significa que os mais jovens, em alguns momentos, possam ter uma visão mais clara da realidade. E nem que são obrigados a se manter calados.
Há dois dias, a ativista usou novamente suas redes sociais para comentar a nova onda de difamação contra ela.
“Aqui vamos nós de novo … Como vocês devem ter notado, os haters estão mais ativos do que nunca – indo atrás de mim, minha aparência, minhas roupas, meu comportamento e minhas diferenças.
Eles apresentam todas as mentiras imagináveis e teorias da conspiração. Parece que cruzarão todas as linhas possíveis para desviar o foco, pois estão desesperados para não falar sobre o clima e a crise ecológica.
Ser diferente não é uma doença e a melhor ciência atual disponível não é opinião – são fatos.
Sinceramente, não entendo por que os adultos escolhem passar o tempo zombando e ameaçando adolescentes e crianças por promoverem a ciência, quando poderiam fazer algo de bom. Eu acho que eles devem simplesmente se sentir ameaçados por nós.
Mas o mundo está acordando. Vejo você nas ruas nesta sexta-feira!”.
Ela disse tudo. Não preciso continuar.
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Grupo de jovens, entre eles, Greta Thunberg e ativista brasileira, denunciam Brasil e outros países na ONU
Fotos: reprodução internet e arquivo pessoal
Engraçado é ela não falar nada do assassinato do líder Paulo Sergio que denunciava a nórdica Hydro…vocês são mal informados ou cínicos. Que vergonha. Greta incomoda porque ela não atua de forma plena, mas sob determinados comandos.. https://jornalistaslivres.org/assassinado-lider-que-denunciava-poluicao-da-hydro-no-para/