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Ministério Público Federal pede afastamento de Ricardo Salles por improbidade administrativa

Uma ação do Ministério Público Federalque tramita na 8ª Vara de Justiça federal, sob o número 1037665-52.2020.4.01.3400 -, assinada por 12 procuradores, acusa o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, de destruir a estrutura que garantia a proteção ambiental no país, e pede seu afastamento do cargo em caráter urgente e sua condenação de acordo com as penas previstas pela lei de improbidade administrativa. De acordo com notícia publicada no site do MPF, as penas são estas: perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa e proibição de contratar com o poder público e de receber benefícios e incentivos fiscais ou creditícios.

Os procuradores acusam Ricardo Salles de promover a desestruturação das políticas ambientais e o esvaziamento de preceitos legais com o objetivo de favorecer interesses alheios à pasta ocupada por ele. Para tanto, ele lançou mão de atos, omissões e discursos, numa clara conduta dolosa – ou seja, intencional – com o objetivo de fragilizar e impedir a atuação do Estado na proteção ao meio ambiente. Finalmente!!

Leia: A destruição do meio ambiente pelo governo, em três atos

Exoneração de fiscais

“É possível identificar, nas medidas adotadas, o alinhamento a um conjunto de atos que atendem, sem qualquer justificativa, a uma lógica totalmente contrária ao dever estatal de implementação dos direitos ambientais, o que se faz bastante explícito, por exemplo, na exoneração de servidores logo após uma fiscalização ambiental bem sucedida em um dos pontos críticos do desmatamento na Amazônia Legal”, diz a ação judicial. 

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Sim, no final de abril deste ano, logo após operações de fiscalização e desmonte de garimpos ilegais nas terras indígenas Ituna Itatá, Apyterewa, Trincheira-Bacajá e cachoeira seca, na região de Altamira, Salles exonerou, primeiro, o diretor do Ibama, Olivaldi Azevedo, e, em seguida, os coordenadores da fiscalização ambiental Ibama, Renê Oliveira e Hugo Loss, como noticiamos aqui.

Após as operações, o desmatamento nas duas áreas foi reduzido drasticamente. Em 2019, o aumento da devastação chegou a 754%. Os fiscais destruíram cerca de 100 máquinas e equipamentos utilizados por quadrilhas para cometer crimes ambientais, número superior ao de todo o ano passado.

E aqui vale destacar que o presidente Bolsonaro declarou publicamente, diversas vezes, sua insatisfação com a prática dos fiscais de queimarem equipamentos flagrados em atividades ilegais. Mas ele esquece ou ignora que essa ação está prevista na lei, por decreto de 2011.

Em vez do reconhecimento pela eficácia do trabalho, perderam os cargos, no que o MPF considera uma evidente retaliação. A saída de Renê e Loss é avaliada por fiscais do Ibama como uma “guinada definitiva rumo ao controle, ambicionado pelo governo, das atividades de campo do órgão ambiental”, como definiu o jornalista Rubens Valente, em sua coluna no UOL, na época.

Com tal medida, o Ibama ficou ainda mais enfraquecido e foi tomado por militares da confiança de Salles, tornando ainda mais fácil prosseguir com o plano de destruição do meio ambiente, abrindo caminho e protegendo criminosos e penalizando quem defende a floresta. 

Leia: Censura, perseguição e exonerações: as táticas do governo para enfraquecer e destruir órgãos de proteção ambiental

Desmatamento e queimadas

Os episódios acima corroboram com os atos, medidas, omissões e declarações de Salles indicados na ação judicial do MPF e que tornaram inviável a proteção ambiental, contribuindo para a alta do desmatamento, como também das queimadas e dos incêndios, sobretudo na região amazônica.

Em 2019, com as queimadas, as florestas brasileiras perderam 318 mil quilômetros quadrados: um recorde histórico! Desde que assumiu o ministério, em 2 de janeiro, o desmatamento vem batendo recordes sucessivos. Sozinho, o Brasil foi responsável por 1/3 da degradação de florestas nativas no mundo!

De forma inacreditável, ao mesmo tempo que o desmatamento registrou os maiores índices, o período teve a menor quantidade de multas por crimes ambientais em 20 anos.

Também é importante ressaltar, em seu currículo, a redução de 25% no orçamento do meio ambiente, além da paralisação do Fundo Amazônia: os projetos de desenvolvimento sustentável com ações de preservação da floresta que eram apoiados pelo fundo mantido por Noruega e Alemanha deixaram de receber investimentos. Com um detalhe: parte desse dinheiro era aplicado em ações contra incêndios.

Leia:
Mourão tira Ricardo Salles do Fundo Amazônia após conversa com embaixadores da Alemanha e da Noruega, principais doadores
Para agradar ruralistas, Ricardo Salles muda regras de anistia a multas por desmatamento ilegal na Mata Atlântica

Gastou mais, com menos eficiência

Em agosto e setembro do ano passado, sem fiscalização ambiental, nem Fundo Amazônia, o Brasil e o mundo viram os incêndios florestais avançarem de maneira alarmante. Com a pressão internacional, o governo brasileiro resolveu decretar uma tal de Garantia de Lei e Ordem (GLO), incumbindo as Forças Armadas de combater crimes ambientais e controlar queimadas e desmatamento.

A ação recebeu o nome de Operação Brasil Verde, que funcionou por apenas dois meses, a um custo exorbitante: mais de R$ 124 milhões. Esse montante representou um acréscimo de cerca de R$ 14 milhões em todo o orçamento anual previsto para ações de comando e controle, que deveriam ser realizados pelo Ibama. 

“Ressalte-se que tal operação se deu apenas quando a situação das queimadas na região amazônica tomou proporções desmedidas e o fogo ganhou repercussão negativa internacional. Como elas ocorrem no período de seca amazônica, que começa em julho e vai até novembro de todo ano, a desproporcionalidade das queimadas ocorridas em 2019 era consequência previsível e evitável por meio da efetivação escorreita da política ambiental, disciplinada em vários regramentos legais, inclusive em atos próprios e já tecnicamente balizados pelo Ministério do Meio Ambiente, como o PPCDAm – Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia”, diz o MPF.

Para o MPF, Ricardo Salles se recusou a aplicar o PPCDAm e, por isso, tem responsabilidade direta nas imensas perdas florestais, causando ainda danos aos cofres públicos no processo. 

Fica claro que, ao reduzir o orçamento da área ambiental, Salles não fez economia, muito ao contrário: provocou gastos muito maiores com a realização da operação das Forças Armadas na Amazônia que, apesar de ter debelado as queimadas no ano passado, não tem conseguido reduzir o desmatamento.

Mais: o MPF acusa que também é um ato de improbidade subordinar o Ibama – o órgão do Estado com capacidade técnica de fazer fiscalização ambiental – às Forças Armadas, que não domina tal conhecimento. Para tentar conter a subida constante do desmatamento, a GLO foi reeditada em maio deste ano, no entanto, o que se viu foi que, em todos os meses de 2020, até agora, os índices do desmatamento foram maiores do que nos mesmos meses de 2019. 

Em sua análise, os procuradores identificaram também que as Forças Armadas não conseguem reduzir o desmatamento como o fizeram os fiscais do Ibama no início do ano, antes da exoneração de seus coordenadores. E mais: o custo da ação das Forças Armadas é muito maior, quer ver? Enquanto o orçamento do Ibama para 2020 é de R$ 76,8 milhões, em apenas dois meses de funcionamento na Amazônia a GLO gastou R$ 60 milhões dos cofres públicos!!! Falamos disso, aqui, no Conexão Planeta.

“O que está em curso, para o caso, como consequência dos atos e omissões de Ricardo Salles, é a implementação de uma política pública custosa e pouco eficaz, causando severos prejuízos aos cofres públicos e em total desacordo com os princípios que regem a Administração Pública Brasileira”, diz a ação judicial. 

E os procuradores acrescentam: “Os efeitos da fragilização da estrutura administrativa, são imediatos, como mostram os dados sobre o aumento do desmatamento e o avanço de atividades econômicas ilegais sobre áreas de floresta nativa, incluindo áreas especialmente protegidas, como terras indígenas e unidades de conservação. A desregulamentação de medidas proibitivas, a desmobilização de servidores e o desmonte da fiscalização consistem em frentes permanentes de fragilização dos órgãos ambientais federais. Em muitos casos, os efeitos podem se tornar irreversíveis”. 

Desvio de finalidade

Não há dúvida que a imagem de Salles – que já não era boa – se deteriorou barbaramente após a divulgação do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril deste ano, na qual o ministro do meio ambiente fez declarações contundentes, revelando suas intenções para aproveitar este momento delicado da pandemia para dar cabo de seus projetos de destruição, incitando os demais ministros presentes a fazerem o mesmo em suas pastas.

Para o MPF, se havia dúvidas quanto ao caráter doloso – ou seja, intencional – que caracteriza os atos de improbidade administrativa de Ricardo Salles, elas deixaram de existir quando vieram a público suas declarações durante essa fatídica reunião. Ali, ressalta o MPF na ação: “o acusado escancarou os propósitos de sua gestão e o desvio de finalidade nos atos praticados”.

Quando teve a palavra, Salles declarou que considerava a pandemia decorrente do novo coronavírus uma “oportunidade” para modificar normas e adotar atos e sugeriu fazer uma “baciada” de alterações na legislação para “passar a boiada”.

“As declarações apenas expõem, de forma clara, o que diversos atos já confirmavam: existe um verdadeiro encadeamento premeditado de atuar contrário à proteção ambiental, caracterizando o dolo, elemento subjetivo dos atos de improbidade. Analisando os fatos concretos, desde o início de sua gestão à frente do MMA, o ministro tem adotado inúmeras iniciativas em flagrante violação ao dever de tutela do meio ambiente, como a desconsideração de normas, critérios científicos e técnicos, em desrespeito aos princípios ambientais da precaução, da prevenção e da vedação do retrocesso.”, finaliza o MPF.

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Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

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