As experiências do cooperativismo solidário Brasil afora são várias, muito diversas e ricas.
Incluem associações de agricultores e agricultoras, grupos produtivos vinculados às estratégias de inclusão da rede de saúde mental, empresas recuperadas que trabalham na área automotiva e de peças em geral, coletivos de alimentação e cultura, costura, artesanato, catadores de materiais recicláveis, entre muitas outras.
O cooperativismo e a economia solidária há muito já se mostram instrumento de transformação social. Acolhem pessoas em situação de vulnerabilidade, que encontram modos de inclusão pelo trabalho por meio de associações autogestionárias, pautadas no coletivo.
Também se relacionam à Agenda 2030 – lançada pela ONU, em 2016, para nortear a erradicação da pobreza –, contribuindo para atingir vários dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). E mais, contribuem para a conquista de autonomia para mulheres.
“Muitas mulheres conquistaram autonomia com o trabalho em cooperativa e tiveram suas vidas transformadas,” diz Maria Senhora Carvalho da Silva, agricultora familiar e diretora-financeira da Cooaf-Bico (Cooperativa de Produção e Comercialização), localizada na região do Bico do Papagaio, no Tocantins.
A fala traduz a realidade de milhares de mulheres brasileiras que, por meio do cooperativismo solidário, encontraram alternativa para a geração de trabalho, renda e vida digna.
Ações que transformam
Para demonstrar o potencial de transformação social de cooperativas e empreendimentos solidários, a Unicopas (União Nacional das Associações Cooperativistas Solidárias) lança, na semana de 15 de março, a campanha Por um Brasil Cooperativo e Solidário: ações que transformam para destacar experiências que contribuem para o desenvolvimento local sustentável e geram transformações de vidas.
A campanha faz parte das atividades desenvolvidas pelo projeto Fortalecimento da Rede Unicopas, co-financiado pela União Europeia.
A cada semana, nos canais digitais da Unicopas, uma nova história mostrará caminhos para a conquista da autonomia, trajetórias de luta, desafios e conquistas desses grupos pelo Brasil, destacando, em especial, o protagonismo feminino.
“É a primeira vez que as quatro principais centrais do cooperativismo solidário do Brasil – Unicafes Nacional, Unisol Brasil, Concrab e Unicatadores – se unem na execução de um projeto conjunto. Com o apoio da União Europeia, traçamos ações conjuntas de fortalecimento e promoção do cooperativismo e da economia solidária no país”, avalia Claudete Costa, vice-presidente da organização e catadora de materiais recicláveis.
“Enquanto Unicopas, nós acreditamos que o cooperativismo solidário é uma estratégia fundamental para que o Brasil tenha um desenvolvimento com mais sustentabilidade e justiça social“.
Outro ponto destacado por ela é como as ações cooperativas e solidárias trazem transversalidade para mulheres e jovens, que, no atual contexto da pandemia, são os mais afetados.
“O cooperativismo solidário é solução para trabalhadores e trabalhadoras sem emprego retomarem suas atividades,” diz ela.
A Unicopas trabalha também para mobilizar a sociedade para o tema e incidir para dentro do Congresso Nacional em prol de programas efetivos que fomentem, de fato, a economia solidária no país.
“Acreditamos em um novo modelo de desenvolvimento que não seja excludente e predatório. E nós acreditamos que a construção desta nova sociedade passa, necessariamente, pela promoção do cooperativismo solidário”.
Histórias que inspiram e mobilizam
Histórias incríveis estão por trás do cooperativismo e da economia solidária. Uma delas é a da cooperativa Cooaf-Bico, formada por agricultoras e agricultores familiares, agroextrativistas e pescadores artesanais em Esperantina e municípios do entorno de Araguatins e São Sebastião do Tocantins.
Foi constituída a partir de uma discussão feita pelo STTR (Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais), sob a perspectiva de formação de grupos produtivos para trabalhar as cadeias produtivas do mel, frutas, farinha, peixe e leite.
Após esse momento inicial, foi criada a Colônia de Pescadores de Esperantina Z-21, que passou a organizar e trabalhar a cadeia produtiva do peixe, e no final de 2007 foi criada a Cooaf-Bico, que conta atualmente com 32 cooperados, dos quais 20 são mulheres.
A produção de polpas de frutas como acerola, goiaba, caju, maracujá, açaí, cupuaçu, cajá e bacuri representa uma atividade importante na região, contribuindo na geração de renda para os cooperados e toda a comunidade local.
É fornecedora, por exemplo, do murici usado na composição da cerveja Saison Murici, lançada em 2016 pela Experimento Beer, que trabalha sob os princípios de comércio justo e sustentabilidade.
A cooperativa, entretanto, ainda possui pouca capacidade de produção e de fornecimento para atender a demanda da região. O projeto com a União Europeia traz oportunidade de melhorar o trabalho do grupo, de modo a aumentar sua produção, gerar mais renda para os cooperados e atender o mercado regional.
A diretora financeira da Cooaf-Bico, Maria Senhora Carvalho da Silva, tem 71 anos. É agricultora familiar e tem sua história entrelaçada às lutas pelos direitos sociais e conquista do espaço das mulheres.
“Fui criada na roça, trabalhando muito, sendo expulsa da terra em que trabalhávamos. Foram tantos conflitos por terra, que precisava lutar pela liberdade dos trabalhadores rurais, lutar pelos pobres, por todos os direitos negados”, diz Maria.
“Sempre estive envolvida em meio aos homens, e para nós nada é de graça. Ser mulher por si só já é mais difícil, mas a cada dia melhoramos um pouco o nosso meio e podemos falar com convicção de que tudo tem valido a pena. É isso que nos mantém em pé, trabalhando com esperança”, salienta.
Edição: Mônica Nunes
Foto (destaque): Juliana Adriano – MST/Divulgação