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A rede que balança conta histórias de magias

aldeia à noite quando os índios dormem em suas redes

Feita da fibra de buriti ou de tucum, e com o mais puro algodão das terras xinguanas, a rede é um utensílio doméstico de origem indígena, comum a todas as casas dentro do parque. Ela é pessoal, pois adquire as formas de seu dono. Envolve o corpo como o útero materno. É comum o balançar no frescor do interior das ocas. Lá fora, o sol escaldante das 11 horas da manhã castiga o pátio da aldeia. No interior das grandes ocas, o balanço refresca os corpos. Homens e mulheres, jovens e velhos. Todos envolvidos em suas redes.

Hoje ao me levantar às 6 horas da manhã, depois de um longo café com beiju, saí a visitar as famílias da aldeia. Casa por casa, mais beiju, peixe, mutape, mais beiju. Melhor parar as visitas por hoje, pois não aguento mais comer.

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Os Waurá são assim, adoram comer e sorrir. Trabalham com afinco para que sobre tempo para viver sorrindo… No geral, as populações indígenas não têm como objetivo o acúmulo de riquezas. Trabalhar não é uma obrigação. Viver bem, sim, é o maior objetivo. E as maiores obrigações são os rituais. Eles fortalecem os laços com os ancestrais e deixam felizes os espíritos “Mamaés” que envolvem o cotidiano das aldeias.

Os pajés pertencem a um mundo à parte. São eles o elo com o mundo espiritual. As doenças nem sempre são causadas por bactérias ou algum vírus combatido por comprimidos ou injeções da alopatia. Certos males são causados pelos Mamaés e têm no pajé a chave de sua cura.

No ano de 2012 assisti a uma pajelança – trabalho de cura realizado com vários pajés – na aldeia Kuikuro. Um pajé e cinco assistentes iniciaram o trabalho de cura por volta de umas 10 horas da manhã. Atrás da casa, um homem tinha cortado um imenso jatobá a pedido de sua mulher. O Mamaé do jatobá, bravo, colocou a mulher doente, deitada em sua rede.

O pajé assistente, um homem baixinho e sorridente, com as folhas do jatobá e outras fibras, fez um pequeno boneco e colocou este no tronco enraizado que ainda restava do jatobá. O pajé começou a fumar e os outros assistentes o ajudavam, quando, de repente, entrou em transe, ficando com o corpo endurecido e reto. Os assistentes o seguravam como se este fosse o tronco do próprio jatobá. Em seguida, este ficou em pé e começou a conversar com o Mamaé.

Depois de uma longa conversa com o Mamaé do Jatobá, o pajé, ainda em transe, olhou para mim e explicou ao Mamaé quem eu era e este mandou eu fumar junto com os assistentes…

Algumas coisas jamais se explicam, pois devem ser vividas sem as barreiras dos preconceitos. Hoje entendo o quão é importante o mundo dos pajés, pois estes vão curar os males da alma, e assim fortalecer os laços com a natureza.

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Redes para embalar sonhos (Aldeia Kuikuro Afukuri)

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No interior da oca em construção, a mulher prepara o beiju. No jirau, o peixe vai assando
e no panelão mingau de mandioca (Aldeia Kuikuro Afukuri) 

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A mulher prepara o beiju enquanto os homens, ao fundo, pegam as castanhas do pequi
para o inicio da festa do Quarup (Aldeia Waurá Pyulaga)

 Edição: Mônica Nunes / Fotos: Renato Soares

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Márcia Cristina de Souza Pugas
Márcia Cristina de Souza Pugas
2 anos atrás

Olá, Renato! Conheci tua página pesquisando material para elaborar uma proposta didática para alunos da rede pública federal aqui no Rio de Janeiro. Gostaria de usar nessa atividade a 1ª foto desta publicação, com céu à noite. Gostaria de fazer referência correta dela. Entendo que seja tua, mas não está claro pra mim de onde é. Poderia conversar comigo a respeito. Gostei muito da postagem.
Grata
Márcia

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