Comecei meu mergulho no mundo da conservação trabalhando com pesquisas em cavernas. A espeleologia, além de abrir as primeiras portas para que essa paixão virasse profissão, também me obrigou a estudar fotografia seriamente. Afinal, para “escrever com luz” em um ambiente sem luz alguma, a gente precisa entender do ofício com um pouco mais de profundidade. E foram as cavernas que me levaram, pela primeira vez, a Presidente Figueiredo, no Amazonas.
No ano de 2003, fui convidado para participar da equipe que desenvolveria os planos de manejo da Caverna do Maruaga e da Gruta do Batismo. A oportunidade me deixou com uma alegria de múltiplas origens: conheceria a famosa caverna arenítica que tem uma cachoeira na entrada, veria pinturas rupestres amazônicas e teria a chance de contemplar o famoso galo-da-serra.
Mas nem tudo foram flores nessa história. Por conta de outros compromissos, viajei de madrugada para encontrar a equipe que já havia partido no dia anterior. Durante o voo, precisei trabalhar na conclusão de um relatório de outro projeto que precisava ser enviado até a manhã seguinte. Tive ainda algumas horas, em um hotel de Manaus, antes de seguir para Presidente Figueiredo. Mas, ao invés de dormir, resolvi me render ao meu perfeccionismo e gastei o possível tempo de sono revisando e corrigindo o relatório até o último minuto.
O transporte para a famosa cidade amazônica era um taxi-lotação, muito comum por essas bandas. Ou seja, compartilhei um carro com mais três pessoas que, não bastasse o aperto, também tinha um motorista péssimo. E claro que não preguei o olho por um minuto sequer durante todo o percurso.
Não é necessário dizer que, quando cheguei, estava absolutamente exausto. Meus olhos ardiam, o corpo pesava e o cérebro não conseguia nem somar dois mais dois. Desembarquei e, no hotel, dei de cara com todos da equipe já se preparando para sair para a caverna. Apesar da vontade de pedir que me deixassem dormir por três dias, joguei toda minha bagagem no porta malas do carro e segui junto com eles, antes mesmo de conhecer meu quarto.
Começaríamos o trabalho percorrendo a trilha do circuito de visitação à caverna. Todos pegaram seus equipamentos, apanhei minha mochila e partimos para a caminhada. Depois de uns 15 minutos, demos de cara com dois galos-da-serra pousados em galhos muito próximos ao caminho. Instantaneamente, recobrei os sentidos adormecidos e, num rápido movimento, tirei a mochila para pegar minha câmera e fazer uma foto. Só então percebi que, em vez da mochila com o equipamento fotográfico e de caverna, havia trazido outra, com meu computador.
Quem levou o material correto fez belas fotos dos bichos. E, eu, por culpa do sono, tive que esperar doze anos até ter outra oportunidade de registrar a beleza exuberante do galo-da-serra. O reencontro aconteceu há poucas horas, na Aldeia Mari-Mari, também em Presidente Figueiredo. Confesso que, enquanto escrevo este texto (hoje é dia 3 de dezembro), em Manaus, ainda estou processando a emoção.
Nessa aldeia, é possível ver os famosos leques, onde os machos se exibem para as fêmeas, na tentativa de acasalar. Em dado momento, no meu campo de visão contei dez machos e três fêmeas (que são marrons e com uma crista menor, bem diferentes dos machos). E, desta vez, eu estava com a mochila certa.
Legal Marcos, planejamento e atenção é tudo, já perdi belas fotos por pequenas distrações como cartão cheio, bateria, lente errada…..
Pois é, Hugo! Isso também já aconteceu comigo. Com o tempo a gente vai aprendendo e cada vez erra menos. Mas essa história do galo-da-serra já me rendeu tanta risada até hoje, que acho que até valeu a pena ter perdido aquela foto.
Caramba, 12 anos de espera?? Seu texto me serviu de alerta, para manter a atenção SEMPRE… Blog maneiro, parabéns a todos!
Se estiver com muito sono, redobre a atenção, Marcelo! hehehe
Valeu pelo elogio, abração!