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Forte é o olhar de quem se tem

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Meia noite de uma segunda-feira qualquer. Na vã tentativa de organizar um arquivo digital que insiste em aumentar, a encontro. Uma cópia digital daquela que, um dia, foi uma cuidadosa ampliação fotográfica, revelada sob a luz vermelha de um laboratório manual. A nostalgia do químico, a mágica transformação da prata, o poder da espera, a satisfação do renascimento de uma cena.

Uma viagem pelas barrancas do Velho Chico, década e meia atrás. Tempos em que o tempo ainda era fiel guardador de nossos passos. Conheci esta senhora morando numa ilhota do Rio; sua existência se completava em cuidar da capela, da casa, da lavoura. Fortes traços, densas palavras. Uma feiticeira dos tempos modernos, uma anciã do sertão.

Foram inúmeras idas e vindas na pequena canoa para percorrer o pequeno trecho de água que a separava do mundo. Para me alimentar de sua sabedoria atemporal, aquietar minha alma em suas falas e vislumbrar seus olhos absortos no correr das águas.

Enfim, o pedido pela foto, a ousadia do rapaz querendo gravar, num pequeno rolo de filme, aquele forte olhar. Finalmente o sinal positivo.

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Entrou na casa, soltou os longos cabelos negros. Voltou com o vaso de flores de plástico e alguns objetos na mão. Moedas antigas, portuguesas. Um cachimbo quebrado de índio. Ousei sentir o cheiro do passado no barro cozido do cachimbo. Relíquias que afloravam na terra ressequida ao som silencioso de sua enxada.

Sentada frente à porta, fita além da lente. Observa além dos tempos. Mostra a integridade que alicerça sua vida. Olha forte, vê além de mim. Forte é o olhar daquele que tem, antes de tudo, a si mesmo.

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