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“Peixe é inteligente, quando vê mancha de óleo, foge”, diz secretário da Pesca, para tranquilizar população

"Peixe é inteligente, quando vê uma mancha de óleo, foge", diz secretário da Pesca, para tranquilizar população

Enquanto diversos especialistas alertam sobre a contaminação, já comprovada através de análises, de animais marinhos, pela mancha de óleo que contaminou quase 300 localidades (praias) do litoral nordestino, ontem (31/10), em um transmissão ao vivo, pela internet, ao lado do presidente Jair Bolsonaro, Jorge Seif Júnior, secretário de Aquicultura e Pesca, tentou tranquilizar a população sobre a ingestão desses alimentos.

Perguntado por Bolsonaro se a pesca teria sido proibida no Nordeste, ele deu a seguinte resposta. “Pessoal, nós já fizemos inúmeros testes e não há nenhum peixe contaminado, nenhuma notificação do Ministério da Saúde por contaminação do óleo…”, e ele continuou. “Podem consumir pescado, está 100% avaliado… Lembrando ainda, pessoal, peixe é inteligente e quando vê a mancha de óleo ali, ele tem medo, ele foge”, afirmou.

Pra completar, Seif Júnior, que é formado em Administração de Empresas e Marketing, disse ainda que as pessoas “podem consumir seu peixinho, lagosta ou camarão, sem problema nenhum”.

Bem, não é isso o que atestaram os pesquisadores do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia na semana passada. Eles encontraram óleo nos aparelhos digestivos e respiratórios de 100% dos peixes, moluscos e crustáceos analisados. As amostras foram coletadas em Praia do Forte, Itacimirim e Guarajuba.

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“Pela cadeia alimentar, essas substâncias são transferidas para nós (seres humanos), o que é algo extremamente perigoso”, alertou Francisco Kelmo, professor responsável pela pesquisa e diretor do instituto, em entrevista ao jornal Estadão.

Imagem de peixe com resíduos de petróleo,
analisado pelos pesquisadores baianos

No dia 25 de outubro, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, através de uma instrução normativa, publicada no Diário Oficial da União, tinha prolongado o período do defeso do camarão e da lagosta, em que a pesca é proibida, até 31 de dezembro, nas áreas atingidas pelo petróleo. Todavia, poucos dias depois, voltou atrás e cancelou a medida. Apesar dos resultados apontados pelas análises feitas na Bahia.

Impacto da contaminação do óleo nos peixes

Hoje pela manhã, o Conexão Planeta entrevistou José Sabino. Biólogo, doutor em Ecologia pela Unicamp e mestre em Zoologia pela Unesp. É professor e pesquisador da Universidade Anhanguera-Uniderp, onde coordena o Projeto Peixes de Bonito (Mato Grosso do Sul). Trabalha com comportamento animal e biodiversidade.

Nosso objetivo é ouvir a opinião de um especialista, que realmente entende do assunto, sobre o possível impacto da contaminação do petróleo na vida marinha, e assim, dar uma informação confiável para nossos leitores.

“Peixes têm cérebro e dentro de seu padrão comportamental, podem identificar perigo, notadamente seus inimigos naturais, com os quais convivem há milhões de anos nos ambientes aquáticos. Um predador geralmente provoca a reação de fuga… E se não der para fugir, a reação é a de luta”, explica.

“Todavia, muito diferente é uma contaminação ambiental… no caso do petróleo no Nordeste, um derrame de proporções catastróficas. Nesse caso, não dá para generalizar como as espécies de peixes reagem”.

O biólogo descreve, detalhadamente, como a substância pode contaminar quatro grandes grupos de peixes:

  • Peixes oceânicos, de água aberta (atuns, albacoras, dourado-do-mar, peixe-agulha e de porte pequeno: sardinhas, manjubas) – Esses poderiam, em tese, sair de forma menos impactada… Como há muita área aberta, podem nadar para regiões mais limpas. Ainda assim, depende muito do grau de contaminação/intoxicação. Peixes respiram pelas brânquias (guelras), suas estruturas mais sensíveis, que absorvem oxigênio dissolvido na água e liberam CO2.
  • Peixes de áreas mais próximas da costa, que nadam próximos ao leito arenoso (tainhas, trilhas, linguados) – Como se alimentam no fundo, podem ser fortemente impactados, tanto diretamente, como pelas respectivas cadeias alimentares.
  • Peixes recifais (garoupas, badejos, bodiões, peixe-anjo, amborés, peixes-borboleta, salema, olho-de-cão, jaguriçá, salema) – Um grupo muito numeroso e extremamente sensível por estarem associados às formações de corais ou rochas. Vivem em grande contato com uma miríade de organismos, como corais, esponjas, moluscos, crustáceos, estrelas-do-mar, além de numerosas espécies de algas… Esse talvez seja o grupo de peixes que mais sofrerá com os impactos, notadamente a longo prazo.
  • Peixes que vivem em manguezais e estuários (tainhas, robalos e muitas formas juvenis de diversas espécies marinhas) – Há relatos que o petróleo está entrando nesses ambientes que são muito mais sensíveis que o oceano aberto… Os manguezais são ambientes de alta produtividade e que processam e liberam nutrientes para as áreas costeiras… São também berçários naturais para muitas espécies marinhas.

Sabino ressalta ainda que nos manguezais há uma riqueza incrível, que inclui aves aquáticas (guarás, garças, socós), répteis (jacarés, serpentes) e mamíferos (lontras, guaxinim, gambás), que podem ser afetados pelos resíduos de petróleo.

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Fotos: reprodução internet (abertura) e divulgação Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia

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Sandra
Sandra
5 anos atrás

Pena não sejam suficientemente inteligentes para fugir dos que matam eles.

Alberto
Alberto
5 anos atrás

Nunca vi coral fugindo de uma mancha de óleo. Tampouco vi qualquer projeto do tipo “Meu mangue, minha vida”.

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