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Lula veta parcialmente o PL 2903, projeto de lei do marco temporal: para a ministra Sonia Guajajara, foi “uma grande vitória”

Lula veta parcialmente o PL 2903, projeto de lei do marco temporal: para a ministra Sonia Guajajara, foi "uma grande vitória"

Atualizado em 21/10/2023 com posicionamento da APIB e do Observatório do Clima, além de nota da Frente Parlamentarista da Agropecuária
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A decisão presidencial mais aguardada da semana foi tomada na tarde desta sexta-feira, 20/10 (último dia do prazo): Lula vetou diversos artigos do Projeto de Lei 2903/2023, referente ao marco temporal para a demarcação de terras indígenas no Brasil, aprovado pelo Senado em 27 de setembro em contraponto à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

Em seu Instagram, o presidente celebrou: 

“Vetei hoje vários artigos do Projeto de Lei 2903/2023, ao lado da ministra Sonia Guajajara e dos ministros Alexandre Padilha e Jorge Messias, de acordo com a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o tema. Vamos dialogar e seguir trabalhando para que tenhamos, como temos hoje, segurança jurídica e, também, para termos respeito aos direitos dos povos originários”.

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O fato de não atender aos apelos do movimento indígena para vetar o texto na íntegra (#vetatudoLula), é um sinal claro de que o presidente quer evitar conflitos com a bancada ruralista e também se desgastar no Legislativo.

veto presidencial deve ser publicado ainda hoje no Diário Oficial da União.

Na coletiva de imprensa realizada no Palácio da Alvorada, logo após a reunião com Lula (assista no final do post), Padilha, de Relações Institucionais, foi o primeiro a falar: 

“O presidente Lula decidiu vetar o marco temporal, respeitando integralmente a Constituição brasileira, inclusive as decisões recentes do STF sobre a constitucionalidade desse tema”. 

Em relação aos artigos sancionados, destacou: “Sobram artigos que têm coerência com a tradição da política indigenista brasileira – desde a Constituição de 1988 – e têm a constitucionalidade confirmada. Esses são artigos importantes, contribuições do Congresso Nacional que reforçam a transparência em todo o processo de estudo, de declaração, de demarcação, e a participação efetiva dos estados e municípios”.   

Para a ministra dos Povos Indígenas, os vetos apresentados pelo presidente podem ser considerados “uma grande vitória, pois reafirmam a decisão do Supremo Tribunal Federal, garantem a coerência do governo com a agenda indígena, com a agenda ambiental, com a agenda internacional, vetando o marco temporal”. 

“A decisão que o presidente Lula tomou hoje foi por garantia à separação e à independência entre os poderes. A decisão de vetar todos os temas que colidiam com o entendimento exarado pelo Supremo Tribunal Federal no último mês, foi nesse sentido”, finalizou Messias, ministro da AGU (Advocacia Geral da União).

O que foi vetado e o que fica

Além de todas as menções ao ‘marco temporal (que reconhece apenas os territórios ocupados em 5 de outubro de 1988, data da promulgação a Constituição), Lula cortou trechos que previam a possibilidade de cultivo de transgênicos e de atividades garimpeiras em terras indígenas, além de obras de infraestrutura como rodovias.

A seguir, alguns dos pontos do PL 2903 mantidos por Lula, que prevêem:

  • processo de demarcação deve ser público e com atos “amplamente divulgados”, também para consulta online;
  • qualquer cidadão brasileiro poderá acessar informações relativas a demarcações de terras indígenas, inclusive estudos, laudos, conclusões e argumentações;
  • informações orais, citadas no processo de demarcação, serão consideradas como provas quando apresentadas em audiências públicas ou registradas em áudio e vídeo, com a devida transcrição; e
  • o direito das partes interessadas no processo de receber tradução oral ou escrita da língua indígena para o português e vice e versa, por tradutor nomeado pela Funai.

Perigo

Para a APIB – Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, além das ameaças do Congresso Nacional (que pode rejeitar os vetos de Lula, veja abaixo), há dois artigos do PL 2903 que não foram integralmente vetados pelo presidente e que podem facilitar violações aos direitos indígenas:

  • Artigo 26, que trata sobre cooperação entre indígenas e não indígenas para exploração de atividades econômicas, que pode ampliar o assédio e a cooptação de lideranças nos territórios para flexibilizar o usufruto exclusivo e admitir atividades como agronegócio e mineração.

“O trecho mantém o espírito do PL 490, a base do 2.903, e de outro PL, o 191, de autoria do governo Bolsonaro e retirado pelo Executivo, que visavam abrir as terras indígenas para atividades econômicas.

  • e o Artigo 20, que afirma que o usufruto exclusivo não se sobrepõe ao interesse da política de defesa e soberania nacional”.

A organização destaca que este artigo “é perigoso, pois abriria margem para mitigar o usufruto exclusivo, diante do conceito genérico de ‘interesse de política de defesa’ justificando intervenções militares nos territórios“.

E acrescenta: “É um aceno aos militares, que nunca engoliram, por exemplo, terras indígenas em faixa de fronteira. No limite, se isso estivesse em vigor em 1992, a TI Yanomami não teria sido homologada. Mas, mesmo com essa ameaça, reforçamos que os Povos indígenas são resguardados pelo Artigo 231, §6º, da Constituição, que prevê que o relevante interesse da União deverá ser disposto por Lei Complementar e não por Lei Ordinária como é o caso do PL 2903″.

Em sua newsletter, divulgada hoje (21/10), o Observatório do Clima declarou que, “quem prestou atenção ao discurso dos senadores em 27/9, dia da aprovação do PL 2.903 no plenário, viu que suas excelências já contavam com o veto presidencial a crimes como o marco temporal”, o que ficou evidente na fala do senador Alessandro Vieira (MDB?SE): “Isto é um teatro”, que foi um dos 21a votar contra a proposta. 

“O que estava em jogo, porém, era uma prova de princípio, mais do que o marco temporal: era a capacidade do Congresso de atuar sem amarras e em guerra aberta contra os outros poderes. Sob esse aspecto”, destaca o OC, “mesmo o veto de Lula aos principais problemas do PL 2.903 foi uma vitória para os ruralistas. Embora o presidente tenha mantido seu compromisso com os povos indígenas, quem avançou mais casas no tabuleiro foi a bancada do agro“.

Congresso pode rejeitar vetos de Lula

A decisão do presidente sobre o PL 2903/2023 ainda será analisada em sessão conjunta do Senado e Câmara dos Deputados (o PL aprovado pelos deputados foi o 490/2007, rebatizado de 2903 pelos senadores), o que deve acontecer na próxima semana, em 24/10.

Os parlamentares podem rejeitar o veto presidencial, mas, para isso, precisam obter maioria absoluta dos votos (298), ou seja, o apoio de 41 senadores e 257 deputados. Mas também podem rejeitar um ou outro veto de Lula.

Em nota, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), mais conhecida como bancada ruralista, anunciou que defende o marco temporal e articulará a derrubada dos vetos de Lula.

As organizações indígenas, ambientalistas e de direitos humanos por sua vez, se mantêm mobilizadas para refutar os ataques às terras indígenas. Na noite de ontem (20/10), a APIB pediu na a mobilização da sociedade para impedir que os vetos sejam derrubados no Congresso.

“É necessário seguirmos mobilizados, pois a luta ainda não acabou. A ala ruralista do Congresso Nacional ainda pode derrubar todos esses vetos e aprovar essa lei que legitima crimes contra os povos indígenas”.

A seguir, assista aos pronunciamentos da ministra Sonia Guajajara e dos ministros Alexandre Padilha e José Messias durante coletiva de imprensa, logo após reunião com Lula:

 

 
 
 
 
 
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Uma publicação compartilhada por Alexandre Padilha (@padilhando)

Leia também:
Ministério dos Povos Indígenas celebra veto do presidente Lula ao PL do Marco Temporal
(outubro 2023)

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Foto: Ricardo Stuckert/PR

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