O cacique Raoni Metukthire, líder do povo indígena Kayapó, tem cerca de 94 anos (não se sabe ao certo) e já concorreu ao prêmio Nobel da Paz duas vezes.
A primeira foi em 2019, quando a ativista sueca Greta Thunberg estava entre os nomes mais cotados e o vencedor foi o primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed Ali. A segunda, em 2020, quando o Programa Mundial Alimentar da ONU venceu.
Na verdade, a candidatura de Raoni para o prêmio foi feita pela Instituto Darcy Ribeiro em 2019 para 2020, mas o comitê de avaliação resolveu incluir o nome do líder indígena naquele ano. Por isso, ele acabou concorrendo dois anos seguidos.
E, na semana passada, a indicação de seu nome para o concorrido prêmio foi ressuscitada pelo presidente Lula, logo após a condecoração de Raoni com a Legião de Honra, a mais alta honraria francesa, por Emmanuele Macron, presidente da França, na Ilha do Condu, em Belém, no Pará (contamos aqui).
“Não tem ninguém no planeta Terra que mereça ganhar o Prêmio Nobel da Paz mais do que você [cacique Raoni], pelo que você tem feito na sua passagem pelo planeta Terra”, declarou Lula.
E continuou: “Se depender de mim – e espero que se depender do Macron – [teremos] uma conversa com o pessoal da Noruega, com o pessoal da Suíça, conversar com uma rainha aqui, outra rainha ali, para que a gente consiga fazer com que, pela primeira vez, um indígena, com mais de 90 anos de idade, representando o povo indígena brasileiro, receba o Prêmio Nobel da Paz”.
“Você merece e os indígenas brasileiros merecem,” finalizou o presidente.
Em seu discurso, Lula ainda citou o cardeal Dom Evaristo Arns como uma personalidade que poderia ter sido laureada em 1980, mas acabou como Raoni, não reconhecido.
E você? Concorda com Lula? Raoni é um bom candidato? Está à altura do Prêmio Nobel ou o prêmio à altura dele?
Por que o Brasil nunca ganhou um Nobel?
Em 123 anos de Nobel da Paz e 17 indicados, nenhum brasileiro trouxe o diploma, a medalha de ouro de 18 quilates e o prêmio em dinheiro (11 milhões de coroas suecas, o equivalente a mais de 5 milhões de reais) para casa.
Até indicados de pequenos países como as Ilhas Faró, Luxemburgo, Santa Lúcia, Lituânia e Mianmar estão na lista de ganhadores! E o Brasil, nada! Por que será?
No ano passado, em entrevista à Folha de SP, a biomédica Helena Nader, primeira mulher eleita para presidir a Academia Brasileira de Ciências (2022), declarou que “o comitê de seleção do Nobel tem um viés machista e centrado no Hemisfério Norte. Isso não dá para negar”.
No programa Roda Viva de 2019, Ozires Silva, presidente e cofundador da Embraer, contou que, num jantar em Estocolmo, certa vez perguntou a um dos membros do comitê do Nobel porque o Brasil nunca ganhava o prêmio. Algum tempo depois, ele respondeu para Ozires, mais ou menos assim:
“Vocês brasileiros são destruidores de heróis! Todos os candidatos brasileiros que apareceram, contrariamente aos dos outros países, especialmente dos Estados Unidos, os brasileiros ‘jogam pedra’. Não existe apoio da população, parece que um brasileiro desconfia do outro, tem ciúmes (assista ao vídeo no final deste post).
Brasileiros indicados ao Nobel da Paz
O fato é que, ao longo da história do Prêmio Nobel da Paz, o Brasil já foi muito bem representado. Veja alguns nomes da lista oficial:
- Barão do Rio Branco, advogado, diplomata e historiador, José Maria da Silva Paranhos Júnior, participou de diversas negociações envolvendo as fronteiras brasileiras. Em 1911, um ano antes de falecer, foi indicado ao Nobel da Paz;
- Afrânio de Melo Franco, diplomata e político mineiro, foi o brasileiro que mais recebeu indicações ao Nobel da Paz: 46 em três anos diferentes, 1935, 1937 e 1938;
- Osvaldo Aranha, diplomata, político e advogado, foi presidente da Assembleia Geral da ONU em 1947, quando atuou para a criação do Estado de Israel (hoje, não seria uma boa indicação). Consta que seus esforços para mediar a situação entre judeus e palestinos levou não só à sua indicação para o Nobel da Paz em 1948, como também é o motivo pelo qual o Brasil, até hoje, é o primeiro país a discursar na Assembleia Geral. Indicado em 1948;
- Marechal Rondon, militar que lutou pelos direitos indígenas e esteve à frente do Serviço de Proteção ao Índio (SPI) e o Conselho Nacional de Proteção ao Índio (CNPI), além de ter sido um dos principais defensores da demarcação da terra indígena no Parque Nacional do Xingu. Indicado em 1953 e 1957;
- Josué de Castro, médico, professor, geógrafo, cientista social e político, ganhou notoriedade internacional por suas contribuições no combate à fome no mundo a partir de seus estudos sobre o Nordeste brasileiro. Indicado em 1953, 1963, 1964, 1965 e 1970;
- Dom Helder Câmara, foi bispo católico, arcebispo emérito de Olinda e Recife e um dos fundadores da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Defensor dos direitos humanos, foi indicado ao Nobel da Paz em 1970 e 1971;
- Irmãos Villas-Bôas (Orlando e Claudio), indigenistas e sertanistas, junto com o irmão Leonardo (falecido nos anos da indicação ao Nobel: 1971 e 1975), defenderam os povos indígenas, tendo reconhecimento pelo resgate das aldeias do Xingu.
- Chico Xavier, líder espírita indicado em 1981 e 1982, autor de mais de 450 livros e uma das personalidades mais admiradas no país, conhecido pelo seu altruísmo;
- Irmã Dulce, também liderança religiosa, foi canonizada em 2019 pelo Papa Francisco, o que a tornou a primeira santa da Igreja Católica nascida no Brasil. Indicada em 1988 pelo então presidente José Sarney;
- Dom Paulo Evaristo Arns foi ordenado padre em 1945 e durante dez anos exerceu o ministério dando assistência à população carente de Petrópolis (RJ). Criou a Comissão Brasileira Justiça e Paz, da Diocese de São Paulo, para denunciar os abusos do regime militar, e a Pastoral da Infância, com a irmã Zilda Arns. Foi um dos principais nomes na luta contra a ditadura e ficou conhecido como o “Cardeal da Esperança”. Indicado ao Nobel da Paz em 1989.
- Herbert de Souza, o Betinho, sociólogo e ativista dos direitos humanos, foi indicado em 1994 após campanha que contou com o apoio de mais de 20 mil brasileiros e diversos deputados.
- Zilda Arns, médica e irmã de Dom Paulo Evaristo Arns, foi indicada ao prêmio em 2006 por seu trabalho como fundadora da Pastoral da Criança e da Pastoral da Pessoa Idosa, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB);
- Maria da Penha, farmacêutica que inspirou a criação da lei Lei nº 11.340/ 2006, que tipificou o crime de violência contra a mulher no Brasil. Indicada em 2017 por sua atuação em prol dos direitos das mulheres no país;
- Raoni, líder do povo Kayapó, indicado pelo Instituto Darcy Ribeiro em 2019 e 2020.
Seria um reconhecimento e tanto que Raoni ganhasse o Nobel da Paz este ano. A campanha do Lula (e do Macron) já começou. Você apoia?
A seguir, assista ao depoimento de Ozires Silva no programa Roda Viva:
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Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil