Hoje é dia de mobilização nacional contra a votação do PL 490/2007, indígenas da etnia Guarani Mbya da Terra Indígena Jaraguá, no Pico do Jaraguá, em São Paulo, bloquearam a Rodovia dos Bandeirantes no km 20, no sentido capital, desde as 6hs.
A urgência sobre a votação do PL 490 foi aprovada no dia 24 deste mês, na Câmara dos Deputados (como contamos aqui), o que acelerou a tramitação do projeto de lei, o que pode acontecer hoje. Se aprovado, o texto segue para o Senado.
O tema também é objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que deve decidir, em 7 de junho, se a tese ruralista do marco temporal (explico mais adiante) é válida ou não.
Bombas de gás lacrimogêneo e jatos de água
A manifestação causou congestionamento de cerca de cinco quilômetros e foi dispersa e neutralizada por volta das 9h pela Polícia Militar (PM), que atirou bombas de gás lacrimogêneo e jatos de água contra os indígenas, incluindo idosos e crianças. Mas a violência foi além.
Uma das lideranças da terra indígena Jaraguá, Thiago Karai Djekupe, contou que as bombas de gás atingiram não apenas os manifestantes na rodovia, mas também a aldeia, que fica próxima ao local.
“Nós não somos inimigos. Nós não somos posseiros dessas terras, nós somos essas terras. E é isso que o não indígena precisa compreender, nós não estamos aqui para cometer violência. O que o Estado fez hoje é inconstitucional, não tinha nenhum órgão federal”. E ele acrescentou:
“Eles [os policiais] negociaram conosco e disseram que nós poderíamos ceder uma das faixas e poder fazer a nossa passeata do nosso ato tranquilo. Quando começamos a andar, eles começaram a atirar [bombas] em nossas crianças dentro da aldeia, não só em quem estava na rua [rodovia]”.
Ontem (29), os Guarani Mbya de São Paulo fizeram atos no Largo São Francisco, na região central da cidade, e, no final da tarde, uma grande vigília na Terra Indígena Jaraguá foi realizada.
A versão do governo paulista
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública informou que o comando da Polícia Militar Rodoviária negociou desde as 6h com lideranças dos Guarani Mbya para a desobstrução da via.
“Depois de uma hora e quarenta minutos de negociação, houve um princípio de desobstrução de uma faixa, mas logo depois os manifestantes voltaram a ocupá-la. Foram feitas novas tentativas de liberar a via de forma pacífica, mas sem sucesso. Após três horas de negociação, a Tropa de Choque precisou agir com técnicas de dispersão de multidões. Ninguém foi preso e não houve relato de feridos”, diz o comunicado.
O PL 490 e o marco temporal
Ontem, 29/5, os Guarani Mbya fizeram atos no Largo São Francisco, na região central da cidade de São Paulo, e, no final da tarde, uma grande vigília na Terra Indígena Jaraguá.
O PL 490 estabelece a tese ruralista do marco temporal para as demarcações, que serão consideradas terras indígenas os lugares ocupados por povos tradicionais até 5 de outubro de 1988 – quando foi promulgada a Constituição Federal -, ignorando que muitos foram expulsos e que alguns eram tutelados pelo Estado.
A Carta Magna não prevê esse marco como critério, já que indígenas são povos originários que estão presentes no país muito antes da colonização europeia.
O PL 490 ainda transfere para o Legislativo a decisão sobre os processos de demarcação. A MP 1154 – sobre a estrutura do governo – que foi “remendada” por um relatório aprovado no mesmo dia 24 por uma comissão mista (como contamos aqui) -, tira a demarcação do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e devolve para o Ministério da Justiça, mas, essa decisão será anulada com a aprovacão do PL 490.
Como diz a deputada federal Célia Xakriabá, trata-se de um “genocídio legislado“. O advogado Marco Terena, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), acrescenta: “é um litígio climático“.
Para a APIB, o projeto de lei representa retrocesso para os direitos dos povos indígenas e para a preservação dos biomas brasileiros, junto à Medida Provisória 1154, que retira a competência da demarcação de terras indígenas do MPI.
“O que vimos no dia 24 é uma vergonha para a política nacional. Com o PL 490 e a Medida Provisória, o Congresso quer inviabilizar as demarcações de terras indígenas. Isso é um grande retrocesso para os direitos dos povos originários e para a preservação do meio ambiente, visto que somos nós os verdadeiros guardiões dos biomas brasileiros”, declarou, em nota, Dinamam Tuxá, coordenador executivo da APIB.
ONU
O escritório da Organização das Nações Unidas (ONU) para Direitos Humanos na América do Sul manifestou, na segunda-feira, 29/5, preocupação com projetos do Congresso Nacional que podem afetar as causas indígenas. E cobrou as autoridades brasileiras sobre “medidas urgentes em prol dessas populações, conforme as normas internacionais de direitos humanos”.
Segundo a ONU, as iniciativas legislativas do Congresso Nacional “arriscam enfraquecer a proteção dos povos indígenas no Brasil”.
___________________
Com informações (e trechos de textos) da Agência Brasil: PM atira bombas de gás contra protesto indígena e libera rodovia em SP e Povo guarani bloqueia rodovia em São Paulo contra marco temporal
Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil