
Em uma decisão que pode ser um importante passo para combater o desmatamento e as queimadas no Brasil, o Supremo Tribunal Federal (STF) deu o aval na segunda-feira (28/04) para que o governo federal desaproprie terras que tenham sido alvo de incêndios ou de desmate ilegal. Para tal, os crimes precisarão ser comprovados, assim como a responsabilidade do proprietário rural na devastação do meio ambiente.
Segundo a decisão do ministro Flávio Dino, a União e os estados terão ainda que “adotar meios para impedir a regularização de terras em que tenham ocorrido crimes ambientais. Também deverão ajuizar ações de indenização contra proprietários que sejam responsáveis por incêndios ou desmatamento ilegais.”
“Não é razoável que, ano após ano, bilhões de reais de dinheiro público sejam gastos combatendo incêndios dolosos e desmatamentos claramente ilegais. Com este ciclo perpétuo, pune-se duplamente a sociedade”, afirmou Dino.
Dino concordou que os estados continuem a usar sistemas próprios para emitir autorizações para retirada de vegetação (as chamadas Autorizações de Supressão de Vegetação), “desde que as informações estejam integradas ao Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor).”
“Decisões como esta evidenciam o olhar da Suprema Corte para a urgência de atuação dos órgãos ambientais frente às irregularidades frequentemente flagradas, mas historicamente negligenciadas no Brasil. Ao reconhecer a violação da função socioambiental da propriedade em casos de desmatamento ilegal e incêndios criminosos, o STF fortalece a responsabilização e exige respostas concretas do poder público“, afirma Danilo Farias, analista de Políticas Públicas do WWF-Brasil.
“Essa decisão do Flávio Dino pode gerar, inclusive, uma série de ações de desapropriações porque já existem várias condenações por desmatamento ilegal”, diz Paulo Busse, advogado do Observatório do Clima.
Prestação de contas sobre combate ao desmatamento
A decisão divulgada ontem pelo STF também mostra a preocupação com o papel dos estados em combater o desmatamento. Flávio Dino deu dez dias úteis para que os governos do Acre, Amapá, Rondônia, Maranhão, Tocantins e Pará detalhem as medidas já tomadas em 2025 para prevenir e evitar queimadas e criem “salas de situação” para monitorar e acompanhar focos de incêndio.
Outra ordem do ministro determinou, tanto que os estados como a União, reestruturem e implementem medidas para colocar em prática a política de prevenção e combate aos incêndios no Pantanal e na Amazônia.
Busse ressalta, entretanto, que embora a notícia seja muito importante para reforçar a atuação do Estado no combate a incêndios criminosos e no desmatamento ilegal na Amazônia, é preciso ir mais longe . “Ainda faltam decisões nessa ação, a ADPF 743, no sentido de reforçar também a prevenção a incêndios não criminosos, como os decorrentes das mudanças climáticas e estiagens nessas regiões, Amazônia e Pantanal, com a contratação, por exemplo, de mais brigadistas e equipamentos necessários para combater o fogo
De acordo com o mais recente levantamento divulgado pelo Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), em março de 2025 foram detectados 167 km2 de desmatamento na Amazônia, um aumento de 35% em relação ao mesmo mês de 2024. Os estados onde foram registrados os maiores índices de devastação florestal foram Mato Grosso (39%), Amazonas (23%), Pará (17%) e Roraima (15%).
Ainda segundo a análise do Imazon, feita a partir de imagens de satélite, no mês passado a maioria (79%) do desmatamento ocorreu em áreas privadas ou sob diversos estágios de posse.
Dados divulgados pela plataforma Monitor do Fogo, do MapBiomas, em janeiro de 2025, revelaram que a área queimada no Brasil em 2024 foi quase 80% maior do que no ano anterior. Quase 31 milhões de hectares foram destruídos pelo fogo, uma área maior que todo o território da Itália – um salto de 79% em relação a 2023. Três em cada quatro hectares queimados (73%) foram de vegetação nativa, principalmente em formações florestais.
A Amazônia foi o bioma mais afetado, representando mais da metade (58%) da área afetada por queimadas no país. Já o Pantanal teve 1,9 milhão de hectares impactados pelo fogo, um crescimento de 64% em relação à média dos últimos seis anos.
*Texto atualizado às 18h40 para incluir a entrevista com Paulo Busse, advogado do Observatório do Clima
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Foto de abertura: Marizilda Cruppe/Greenpace