Pouco mais de um mês do assassinato do líder Paulo Paulino Guajajara, na Terra Indígena Arariboia, vítima de uma emboscada, um grupo da etnia Guajajara foi atacado às margens da rodovia BR-226, entre as aldeias Boa Vista e El Betel, a 506 quilômetros de São Luís, no município de Jenipapo dos Vieira, no Maranhão. Os tiros partiram de um carro e mataram caciques Raimundo Benício Guajajara, 38 anos, e Firmino Praxede Guajajara, 45 anos, deixando outros dois indígenas feridos: Nelci Olímpio Guajajara e Nico Alfredo Guajajara, este último, gravemente.
O crime ocorreu por volta das 12h30, quando eles voltavam de uma reunião com representantes da Funai e diretores da Eletronorte, na aldeia Coquinho.
Ferido na perna e à espera de atendimento médico, Nelci contou – em vídeo que circula pelas redes sociais – que o carro de onde saíram os tiros tinha cinco ocupantes. “Eles passaram atirando e atingiram nosso parente. É muito preconceito, muita intolerância”. Seu relato foi confirmado pelo cacique Magno Guajajara, que também integrava o grupo.
O governo do Maranhão mobilizou as polícias civil e militar e a Secretaria de Estado dos Direitos Humanos e Participação Popular (Sedihpop) para acompanhar o caso. E é bom lembrar que por causa da escalada de violência contra indígenas no Maranhão, em novembro, foi criada uma Força Tarefa de Proteção à Vida Indígena (FT-VIDA), a partir de decreto do governador, Flávio Dino (PCdoB). Na ocasião, ele explicou que o objetivo era “auxiliar os órgãos federais em dificuldades e para atender emergências em terras indígenas”.
Pelo Twitter, o ministro da Justiça, Sergio Moro, lamentou o episódio. “Assim que soube dos tiros, a Funai foi até a aldeia tomar providências, junto com as autoridades do governo do Maranhão. A Polícia Federal já enviou uma equipe ao local e irá investigar o crime e a sua motivação. Vamos avaliar a viabilidade do envio de equipe da Força Nacional à região. Nossa solidariedade às vítimas e aos seus familiares”.
Não adianta lamentar o que o próprio governo ajudou a causar. Com os órgãos de proteção desestruturados e trabalhando contra os indígenas, os crimes contra estes têm se intensificado. Lembremos do cacique Wajãpi assassinado quando uma das aldeias dessa etnia foi invadida por garimpeiros, no Amapá. O crime continua sem solução – o laudo médico indicou que o cacique se afogou e foi refutado por Comissão de Direitos Humanos da Câmara e Associação dos Povos Indígenas, e os assassinos soltos. Assim como o caso de Paulino Guajajara também não foi esclarecido.
Em vídeo publicado no Instagram (assista abaixo), Sonia Guajajara, coordenadora da Associação dos Povos Indígenas Brasileiros (Apib), se manifestou nas redes sociais, indignada, com mais este crime, acusando Bolsonaro. Em seu Twitter, escreveu: “Mais dois parentes Guajajaras foram assassinados hoje no Maranhão. Basta de vítimas, não queremos mártires, queremos vozes vivas! Toda solidariedade aos parentes da terra indígena Cana Brava”.
Ela está participando da conferência do clima da ONU, em Madri, e aproveitou para divulgar o caso no evento e para a imprensa.
Crime planejado?
À reportagem do site Amazônia Real, Magno Guajajara contou que o ataque se deu logo após o encontro dos indígenas com os diretores da Eletronorte Energia, do qual participaram 60 caciques e lideranças Guajajara.
Eles debateram sobre compensações dos impactos ambientais provocados por obras de linhas de transmissão instaladas no território Guajajara. “Estávamos tratando do assunto da Eletronorte. Ao finalizar a reunião, os indígenas voltaram para casa de moto. Numa descida na ladeira, os parentes foram abordados e alvejados. Simplesmente atiraram nos parentes. No trajeto, baixaram o vidro e olharam para identificar se eram indígenas. Aceleraram e atiraram. Foi um tiro fatal. Ninguém sabe por que ocorreram esses disparos, essa violência, essa manifestação de ódio”, contou Magno.
O coordenador da Funai local, Guaraci Mendes, disse que, assim que soube do crime por Magno, enviou equipes para o local e comunicou o caso à Polícia Federal no Maranhão. Ele destacou que “apenas as principais lideranças Guajajara estavam reunidas para tratar dos recursos da compensação com a Eletronorte” e que este fato lhe chamou atenção. “Era toda a cúpula, caciques e lideranças, da Terra Indígena Cana Brava. Parece que foi ação planejada”, desconfia.
Antes do enterro, os corpos dos caciques passarão por perícia no Instituto Médico Legal (IML).
Foto: Mídia Ninja