Ambos são canídeos, mas talvez um olhar mais atento e certamente, de um biólogo ou veterinário, teria evitado a confusão. Há cerca de quatro meses um morador de Monte Santo de Minas (MG) encontrou um filhote de cão abandonado na rua e, com a melhor das boas intenções, decidiu levar o bichinho para casa e adotá-lo.
Todavia, com o passar das semanas, o tutor começou a notar que o cãozinho estava crescendo e ficando um pouco diferente. As orelhas eram mais longas, as patas e as partes mais baixas das pernas escuras e um corpo pra lá de alongado.
Pois não é que o cão, na verdade, era um lobo-guará?
“Ele teve uma mudança na cor da pelagem, alongamento das pernas e orelhas, características físicas predominantes do lobo-guará”, explica Cássio de Sousa Borges, analista ambiental do Instituto Estadual de Florestas (IEF).
Autoridades ambientais informadas, o animal foi levado para um zoológico de Pomerode, em Santa Catarina, referência no acolhimento em espécies em risco de extinção ou retiradas de situação de risco.
“Por ele não ter convivido com a mãe, nunca aprendeu a buscar alimento, abrigo e a se defender. Sendo assim, ele não conseguiria sobreviver sozinho, pois se tornaria uma presa fácil ou não encontraria a própria comida”, afirma a bióloga educadora Jenifer Kroth, do Bioparque Zoo Pomerode.
O filhote de lobo-guará foi colocado num recinto junto com uma fêmea, da mesma espécie, mas já adulta, que o ajudará a desenvolver alguns de seus instintos naturais. O ambiente tenta reproduzir alguns elementos que esses bichos encontram na vida selvagem, como lago, tocas, arbustos e árvores frutíferas.
Os especialistas também esclarecem que seria perigoso manter o lobo-guará como animal doméstico. “Além do motivo legal, existe a motivação ecológica. Ele mantém seus instintos de vida silvestre e pode, ainda que sem intenção, causar algum tipo de reação. É válido ressaltar que não há histórico de domesticação da espécie guará da maneira que houve com o cão doméstico”, diz Borges.
O lobo-guará é classificado como espécie “vulnerável à extinção”
pelo Ministério do Meio Ambiente
(Foto: Clodomiro Esteves Junior – Own work, CC BY-SA 4.0)
Espécie típica do Cerrado brasileiro, o Chrysocyon brachyurus é o maior canídeo selvagem da América do Sul. Infelizmente, ele está em risco de extinção, devido principalmente à destruição de seu habitat pelo desmatamento.
O nome guará vem da língua indígena e significa “vermelho”. Com aproximadamente 90 cm de altura, pesa, em média, 23 kg. De hábitos solitários, macho e fêmea se encontram somente para reproduzir e cuidar dos filhotes.
O lobo-guará é um animal de atividade noturna, que tem o olfato extremamente sensível e orelhas longas, que conferem a ele uma excelente capacidade auditiva também. Pode detectar suas presas a uma grande distância. Suas pernas longas facilitam a locomoção.
Assim como outras espécies, usa sua urina e fezes para demarcar território. Apesar de carnívoro, o lobo-guará gosta muito de frutas. Uma inclusive, leva seu nome: a fruta-do-lobo.
*Texto atualizado em 23/03/23 para corrigir a informação do local onde o lobo-guará foi encontrado e também de que ele foi adotado por um morador e não uma família
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Foto de abertura: divulgação Bioparque Zoo Pomerode