Parece brincadeira, mas é sério. É óbvio que, para uma ação de fiscalização eficaz – em qualquer setor – o sigilo é imprescindível, certo? E sempre foi assim que o Ibama – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais agiu, para não atrapalha os resultados das ações. Até 24 de maio. Em nota publicada em seu site sobre o desmatamento na Amazônia, o órgão anunciou onde serão realizadas suas próximas fiscalizações. “Estão planejadas operações de fiscalização contra desmatamento e garimpo em Terras Indígenas e Unidades de Conservação no sudoeste do Pará, região que abriga a Floresta Nacional do Jamanxim”, avisou.
No mesmo texto, o órgão ainda afirma que o Ministério do Meio Ambiente (MMA) está trabalhando “em uma nova metodologia de alertas de desmatamento e busca, desde o início da atual gestão, uma ferramenta tecnológica que permita a detecção diária de desmatamentos de até 1 hectare”. E acrescenta que “o sistema atual detecta desmatamentos superiores a 6,25 hectares e emite alertas com lapso temporal que não favorece ações de caráter preventivo”.
A questão é que, na semana passada, dados do Deter (Sistema de Detecção do Desmatamento na Amazônia Legal em Tempo Real), que é uma ferramenta do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), órgão do governo federal, apontaram o pior índice de desmatamento na Amazônia em uma década: 19 hectares por hora ou cerca de 6.880 hectares na primeira quinzena de maio – 7 mil campos de futebol! -, o dobro do que foi registrado no mesmo período no ano passado. Com um detalhe: esse volume está muito próximo dos registros dos últimos nove meses somados: 8.200 hectares de agosto de 2018 a abril deste ano. Falamos disso, aqui, no site.
E, sim, a Flona de Jamanxim – onde as próximas fiscalizações do governo serão feitas e já foram anunciadas – é uma das UCs mais castigadas do país. Nos registros do Inpe, ela perdeu 3.100 hectares. O governo Temer tentou reduzir sua extensão e legalizar grileiros na região, como publicamos aqui, no Conexão Planeta. Ela está localizada em importante área de escoamento de soja do Mato Grosso, próxima da BR-163. Começar por Jamanxim pode também ser mais um recado cínico de Salles aos ambientalistas. A foto que ilustra este post, dos arquivos do Ibama, mostra tronco derrubado por desmatadores na Floresta Nacional do Jamanxim em Novo Progresso, Pará, Amazônia.
A nota – publicada em português e inglês – é mais uma ação do governo Bolsonaro e do ministério gerido pelo condenado Ricardo Salles que proteje madeireiros, grileiros, mineradores e quaisquer outros desmatadores. Mais uma ação do governo contra o meio ambiente, a favor de crimes ambientais. O mais incrível: o texto reconhece que se trata de região vulnerável do bioma amazônico, situada em terras indigenas e unidades de conservação (UC), os principais alvos de desmatadores e do governo.
Sim, a Flona de Jamanxim é uma das UCs mais castigadas do país. O governo Temer tentou reduzir sua extensão e legalizar grileiros na região, como publicamos aqui, no Conexão Planeta. Ela está localizada em importante área de escoamento de soja do Mato Grosso, próxima da BR-163. Começar por Jamanxim pode também ser mais um recado cínico de Salles aos brasileiros.
Lembremos de alguns episódios marcantes deste governo na área ambiental…
Desde março, oficialmente, o Ibama e o ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade estão proibidos de falar com a imprensa, como noticiamos aqui. Agora, é tudo com o Ministério do Meio Ambiente (MMA), que também não retorna ligações, nem e-mails ou responde de forma evasiva.
Além disso, dados do governo revelam redução nas autuações do Ibama na Amazônia entre janeiro e maio deste ano. As multas por desmatamento na região caíram 34% em comparação ao mesmo período do ano passado (no governo Temer, bom lembrar). Pior: a quantidade de multas deste ano é a mais baixa em onze anos. E, em abril, o ICMBio não realizou nenhuma operação. Tais dados, como revelou o Observatório do Clima (OC), “refletem o apagão da gestão ambiental no governo de Jair Bolsonaro, que teve um pedido de investigação feito ao Tribunal de Contas da União”.
Em abril, foram apagados do site do Ministério do Meio Ambiente os mapas das áreas de conservação ambiental no país e o ministro ainda acatou o pedido de uma deputada paraense para anular criação do Parque Nacional de Campos Gerais, e o encaminhou para analise do ICMBio, dominado por militares – que ele acabara de promover a postos nesse ministério, no ICMBio e no Ibama – sem nenhuma experiência na área.
No inicio de maio, o senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, se uniu ao também senador Marcio Bittar para nos brindar com promover Projeto de Lei (PL) que pode acabar com o que consideram um “entrave” à expansão ruralista no Brasil: a obrigatoriedade das reservas legais de vegetação nativa em propriedades rurais. Ou seja, eles propõem eliminar o capítulo do Código Florestal, que trata desse assunto – Da Área de Reserva Legal.
Neste mês também, Salles avisou que acionou seu ministério para que faça uma revisão geral das 334 Unidades de Conservação existentes no país, administradas pelo ICMBio, porque “parte delas foi criada sem nenhum tipo de critério técnico”. O ministro julga necessário fazer “um trabalho de revisão preciso na lei, que nunca foi feito”. Ah, claro. Na verdade, sua intenção – desde que assumiu o ministério -, é explorar cada centímetro de área natural com a parceria da iniciativa privada.
Pra arrematar a lista de ações contrárias à preservação e à justiça perpetradas por este governo, vale lembrar que, no Dia do Índio, 19 de abril, em suas redes sociais o ministério parabenizou o Exército – que comemora a Batalha dos Guararapes nesse dia – e ignorou a celebração dos povos originários. Sintomático.
Fontes: Ibama, Observatório do Clima, Estadão, Folha de São Paulo
Foto: Vinicius Mendonça/Ibama
*Flona: abreviatura de floresta nacional