Assim como muitos outros pais, o biólogo Pedro Peloso sempre lia livros ou contava histórias para os dois filhos na hora de dormir. Aos cinco anos, Lia, a mais velha, já era muito curiosa, especialmente sobre as expedições do pai, um especialista em anfíbios, sobretudo, de espécies da Amazônia.
“Eu comecei a contar para a Lia sobre o meu trabalho com o DOTs – Documentando Espécies Ameaçadas, mas em forma de história, que eu fui inventando… Ela era uma salamandra e viajava comigo. Daí eu ia contando sobre as espécies e as viagens”, relembra Pedro. “Como muitas crianças, ela queria que eu contasse exatamente a mesma história vários dias. Mas às vezes eu não lembrava dos detalhes e acabava mudando uma coisinha ou outra. A Lia reclamava das mudanças, então eu comecei a anotar ou gravar a história. Com o tempo, acabei chegando num enredo consistente e pensei, por que não transformar num livro?”.
Lançado no final de 2023, “Lia, a salamandra viajante” não é um presente apenas para a filha, hoje com 7 anos, mas todas as crianças brasileiras. O livro, que conta com as lindas ilustrações de Fran Matsumoto, começa revelando a tristeza da personagem principal ao se deparar com seu lar, a Floresta Amazônica, desmatado.
Lia encontra então uma andorinha-azul, Davi – inspirado no filho caçula, de 5 anos -, e é com ele que a salamandra viajará pelos biomas brasileiros e conhecerá muitos de seus parentes, ou melhor, outras espécies de anfíbios existentes em nosso país.
Com uma linguagem didática e fácil, Pedro explica, por exemplo, a diferença entre sapos, rãs e pererecas (anuros), salamandras e cecílias ou cobras-cegas. Ou ainda, com lagartos e serpentes, que são répteis.
“Cada um dos sapos que a Lia e o Davi visitam é uma espécie que visitamos durante o Projeto DOTs. Além disso, os nomes e personalidade dos personagens são baseados em pesquisadores reais que trabalham na conservação das espécies. São homenagens que fiz a colegas de trabalho e amigos. Por exemplo, o João Sapão é o Melanophryniscus setiba, espécie criticamente em perigo de extinção, e que eu mesmo descobri alguns anos atrás. O nome é uma homenagem ao biólogo João Luiz Gasparini, que trabalhou comigo na descrição da espécie e me ajudou muito ao longo da minha carreira”, ressalta.
A conversa de Lia e Davi com Xuxu, uma rã-de-cachoeira,
encontrada no Rio Grande do Sul
(Foto: divulgação)
Assim como os pais – Pedro é casado com a também bióloga Silvia Pavan -, Lia e Davi adoram animais.
“Eles sempre me acompanham em idas na floresta e ficam alertas para os bichos que aparecem no quintal. Lia e Davi já participaram comigo de uma expedição de um mês na Amazônia”, conta.
Durante todo o processo de produção da obra, os irmãos sabiam que o pai tinha escrito um livro e eles fariam parte, de alguma maneira, da história contada ali. Mesmo assim, quando viram o projeto pronto foi emocionante.
“Lia especialmente, por ser mais velha, entende melhor a importância de virar personagem de livro. Ela o levou para ler para os amiguinhos da escola”.
Pedro, no centro embaixo, e ao lado, a filha Lia. Logo atrás, a mãe Silvia, com Davi no colo,
durante expedição na Amazônia
(Foto: arquivo pessoal)
Carreira dedicada (e premiada) ao estudo dos anfíbios
Em 2021, Pedro Peloso foi um dos vencedores do prêmio internacional “Field Biology Award”, da Fundação Maxwell/Hanrahan (leia mais aqui). Antes disso, entre 2014 e 2015, a defesa de sua tese foi considerada a melhor daquele ano pela Sociedade Brasileira de Zoologia e, em 2019, ganhou o título de “Future Leader in Amphibian Conservation” (Futuro Líder na Conservação de Anfíbios), da Amphibian Survival Alliance, umas das maiores organizações globais voltadas à conservação de anfíbios.
Formado pela Universidade Federal do Espírito Santo, ele possui mestrado em Zoologia pela Universidade Federal do Pará (UFPA)/Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) e doutorado em Biologia Comparada pelo American Museum of Natural History, de Nova York.
Fotógrafo de natureza autodidata, o biólogo brasileiro possui dezenas de artigos científicos publicados e descreveu diversas novas espécies de animais, incluindo anfíbios, lagartos e aves, a grande maioria delas da Amazônia. Atualmente ele é professor da Cal Poly Humboldt, Universidade Politécnica na Califórnia, e Diretor de Planejamento Estratégico do Instituto Boitatá.
“Lia, a salamandra viajante” pode ser comprado online pelo site da livraria Torre de Papel ou através do Projeto DoTS. Basta enviar um e-mail para projetodots@institutoboitata.org ou entrar em contato pelo Whatsapp (91) 992625130
A salamandra voando com a andorinha-azul, na capa do livro
(Foto: divulgação)
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Foto de abertura: arquivo pessoal