O glifosato é o principal ingrediente ativo de diversos agrotóxicos, entre eles, o Roundup, fabricado pela multinacional Monsanto/Bayer, que nos últimos anos respondeu nos tribunais americanos a uma série de processos de pacientes com câncer, que afirmam terem desenvolvido a doença devido ao uso do produto. Além disso, no ano passado, um estudo associou a substância a convulsões em animais.
Registrado em 130 países, o glifosato tem sua utilização aprovada para mais de 100 cultivos diferentes. É o agrotóxico mais vendido no Brasil e em 2019, sob o governo de Jair Bolsonaro, deixou de ser considerado “extremamente tóxico” após uma mudança feita na Anvisa.
Além disso, em nosso país, o resíduo autorizado desse herbicida na água potável é cinco mil vezes maior do que na União Europeia.
Nos anos recentes, houve uma explosão no Brasil de novos registros e permissões para o emprego de herbicidas, pesticidas ou defensivos agrícolas, um nome mais moderno e menos chamativo que vem sendo usado pelo setor agrícola. Só em 2019, foram liberados 353 agrotóxicos no país (leia mais aqui).
Isso fez com que na última década, entre 2010 e 2021, o uso desses produtos dobrasse nas lavouras brasileiras. O dado é do livro “Agrotóxicos e Colonialismo Químico”, escrito por Larissa Bombardi, pesquisadora e professora do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP) e do IRD Institut de Recherche pour le Développement, da França.
Larissa é uma das maiores especialistas nesse tema. Já produziu inúmeros estudos e pesquisas sobre agrotóxicos, todos com dados alarmantes.
Na obra recém-lançada pela Editora Elefante, ela mostra que em 2021, os 26 países da União Europeia exportaram para todo o planeta um volume de quase 2 milhões de toneladas de agrotóxicos, somando 14,42 bilhões de euros. Para o Mercosul seguiram mais de 6,84 mil toneladas desse total, proibidos em território europeu. No Brasil, os campeões em vendas – mancozebe, atrazina, acefato, clorotalonil e clorpirifós – também são banidos na Europa.
“Temos observado o avanço das commodities e com ela o uso indiscriminado dos agrotóxicos com a justificação da importância da balança comercial ou da segurança alimentar. No entanto, os danos são imensuráveis, para o meio ambiente e especialmente para as pessoas. É preciso questionar quem lucra com esse sistema e quem o defende”, denuncia Larissa.
Ela destaca que este é um setor que não para de crescer, junto com o aumento das liberações no Brasil. Foram 2.182 agroquímicos liberados entre 2019 e 2022 e até julho deste ano, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento aprovou o registro de mais 231.
No livro, a pesquisadora faz um panorama detalhado do problema no Brasil. Aponta, por exemplo, quais são os estados campeões no uso de agrotóxicos: Mato Grosso, Rondônia, Goiás e São Paulo são os que apresentam a maior taxa de uso por hectare, seguidos por Mato Grosso do Sul, Paraná e Rio Grande do Sul.
“Muito além da questão de saúde, o uso crescente de agrotóxicos traz a exploração típica do capitalismo. Os processos de violência continuam ocorrendo, agora de forma sistêmica e ampla, onde os episódios de desmatamentos, incêndios, despejos, expulsões, assassinatos, dizimação de povos indígenas se sobrepõem a uma limpeza química do campo, uma varredura que afeta a natureza e favorece empresas do norte global”, critica a autora.
Em “Agrotóxicos e Colonialismo Químico”, Larissa Bombardi revela ainda como funciona o mercado global do setor, que movimenta US 60 bilhões por ano. Juntas, seis empresas dominam 80% das vendas internacionais: Syngenta, Bayer, Basf, Corteva, Upl e FMC.
O livro está disponível no site da Editora Elefante e, em breve, nas principais livrarias do país.
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