
A área de alertas de desmatamento em 2024 na Amazônia Legal foi a menor já medida pelo sistema Deter-B, do Inpe: 4.315 km2, uma queda de 46% em relação ao ano passado.
O número é medido nos 12 meses de agosto do ano passado a julho deste ano. E é um forte indicativo de que a taxa oficial de desmate, a ser anunciada em novembro, verá a segunda queda consecutiva no governo Lula 3.
Caso uma queda da mesma magnitude se confirme no dado final, informado pelo Sistema Prodes, o Brasil estará muito perto de cumprir sua meta para 2025 no Acordo de Paris – um bom sinal de liderança pelo exemplo para um país que sediará no ano que vem a conferência da ONU que marca os dez anos do tratado do clima.
Mas convém não beber muito champanhe na comemoração, por quatro motivos:
Primeiro
O Cerrado, bioma mais rapidamente devastado do Brasil, sofre realidade inversa à da Amazônia: ali, os alertas de desmatamento foram os maiores da série iniciada em 2018, com 7.015 km2, uma alta de 9% em relação ao ano passado – que já era o recorde das medições do Deter-B.
Esse quadro sugere que a destruição para a produção de carne e soja pode estar “vazando” da floresta para a savana, onde há menos controle do governo federal porque as terras são quase todas privadas, o limite legal de desmatamento é maior e as licenças para corte de vegetação são dadas a rodo pelos estados.
Segundo
A redução na Amazônia é obra não de uma ação transversal do governo Lula, como prometido, mas do voluntarismo quase solitário de órgãos como o Ministério do Meio Ambiente e a Polícia Federal. Parte do Executivo, o Congresso e, agora até mesmo o Judiciário, jogam contra o PPCDAm, o plano de controle do desmatamento instituído por Marina Silva e, em tese, chefiado por Ruy Costa, ministro da Casa Civil.
Costa e toda a articulação política do governo seguem rifando a agenda ambiental no Congresso, onde a bancada ruralista tenta passar pelo menos 25 projetos de lei e três emendas constitucionais do Pacote da Destruição. Se aprovados, esses projetos tornarão impossível o controle do desmatamento, relegando as quedas de 2023 e 2024 a um voo de galinha e comprometendo a liderança climática de Lula às portas da COP30.
A omissão dos negociadores do governo fortalece ainda mais o agro, setor que tentou impedir a eleição de Lula e que ora se cacifa para eleger mais um representante da extrema-direita em 2026.
Auxiliares e aliados do presidente também parecem dispostos a sabotar permanentemente o controle do desmate ao forçarem a pavimentação da BR-319 (Manaus-Porto Velho) sem condicionantes ambientais críveis e com base em uma licença prévia dada pelo governo Bolsonaro (e suspensa pela Justiça no mês passado).
A BR-319 corta a região mais preservada da floresta e seu asfaltamento tem potencial de causar a emissão de 8 bilhões de toneladas de CO2 por desmatamento nas próximas décadas, quatro vezes mais do que o Brasil inteiro emite por ano.
“Muita gente em Brasília está olhando o dado do Inpe com a motosserra na mão”, afirma Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima. “Além da bancada ruralista, alguns ministros de Lula vêm se empenhando para arrasar o maior patrimônio dos brasileiros, aumentar o risco climático para toda a humanidade e, de quebra, “queimar o filme” do chefe com a comunidade internacional, que espera liderança do anfitrião da COP30. A essa turma se juntou parte do STF, propondo rasgar os direitos dos povos indígenas assegurados pela Constituição em nome de uma ‘conciliação’ com quem quer saquear suas terras”.
Terceiro
Sem resolver a greve do Ibama, que tem limitado sua atuação em campo desde o começo do ano, o governo também encara um viés de alta no desmatamento que pode se reverter em problemas no restante da estação seca deste ano: no mês de julho houve um crescimento de 33% (de 500 km2 para 666 km2) nos alertas de corte de floresta, o que pode ser consequência da retirada da fiscalização.
Quarto
Por fim, a crise do clima tende a prejudicar os bons resultados no combate ao desmatamento. O número de queimadas na Amazônia até 6 de agosto já era quase duas vezes maior que no mesmo período do ano passado.
Após a pior estiagem da história da região em 2023, turbinada por um El Niño, os rios voltam a secar e florestas em pé voltam a pegar fogo, mesmo na ausência do fenômeno natural.
Portanto, é dia de celebrar um resultado, mas com moderação: a ressaca pode ser pesada.
* Este texto foi publicado pela Agência Brasil em 7/8/2024
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Foto (destaque): Marizilda Cruppe/Greenpeace Brasil