São muitas as espécies de animais na vida selvagem que usam a urina seja para demarcar território ou fazer a seleção de parceiros. Sabe-se que esse comportamento, um tipo de comunicação química, ocorre entre mamíferos terrestres, contudo, nunca antes havia sido feito o registro dele em mamíferos aquáticos. Mas pesquisadores brasileiros documentaram pela primeira vez botos (Inia geoffrensis) utilizando essa estratégia.
“Observamos 36 eventos ao longo de 219 horas de esforço amostral. As observações foram feitas no rio Tocantins, na Bacia Araguaia – Tocantins”, contou Claryana Araújo, pesquisadora do Botos do Cerrado Research Project/ CetAsia Research Group, ao Conexão Planeta.
Ela detalha que o comportamento documentado pela primeira vez entre os botos se inicia com um macho virando de barriga pra cima e expondo o pênis e logo pode-se observar o jato de urina. E quando isso acontece em grupo, outro macho se aproxima e levanta o rostro para fora da água buscando o jato de urina.
“Não existia nenhum estudo publicado descrevendo esse comportamento entre botos ou em outras espécies de cetáceos. Tomamos conhecimento recentemente de registros oportunísticos (não publicados) em botos em outras regiões, mas não com essa frequência que observamos e acredito que não com outro indivíduo buscando o jato de urina”, diz a pesquisadora.
O registro inédito e inusitado foi divulgado em um artigo científico divulgado este mês pela publicação internacional Behavioural Processes.
Segundo Claryana, a principal hipótese levantada é de que esse comportamento tenha uma função social, e com isso o macho possa demonstrar sua posição social ou as qualidades físicas.
Em relação à não participação de fêmeas nessas interações envolvendo a urina, a pesquisadora afirma que ainda são necessários novos estudos de campo. “Ainda não podemos descartar totalmente a possibilidade de que as fêmeas não realizem esse comportamento”, diz ela. “Porém, como os botos têm um sistema de acasalamento que envolve outros comportamentos predominantemente de machos, como agressão entre eles e carregamento de objetos (usado como uma forma de exibição sócio-sexual), e como os machos são maiores que as fêmeas, é possível que a urina aérea seja outro comportamento do repertório sócio-sexual dos machos.”
Foto: Dan Riskin, CC BY 4.0 via Wikimedia Commons
Também conhecida como boto-cor-de-rosa, a espécie Inia geoffrensis é um das três do mundo que vive em água doce. Diferente de outros membros da família dos golfinhos, ela tem um pescoço flexível, o que lhe permite mover a cabeça para a esquerda e para a direita. Possui focinho longo, cabeça arredondada e barbatana dorsal pequena, com comprimento total variando de 2 a 2,5 metros. O boto se alimenta de peixes e outros organismos aquáticos, como tartarugas e caranguejos.
*Usamos uma imagem conceitual nessa reportagem porque existe uma cobrança por parte dos pesquisadores para a reprodução dos registros (para financiamento de suas pesquisas) e, infelizmente, o Conexão Planeta é um site independente e não possui recursos para a compra de vídeos e fotografias
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Foto de abertura: Julien Renoult, CC BY 4.0 via Wikimedia Commons
