Há cem anos apresentando a rivalidade entre os bois Caprichoso e Garantido (boi-bumbá) e simbolismos regionais que representam os povos indígenas e ribeirinhos do Norte do país, o Festival Folclórico de Parintins ganhou relevância nacional ao longo dos anos, tornando-se importante atração turística da cidade de Parintins, no interior do Amazonas. Em 2018, conquistou o reconhecimento do Iphan – Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional como Patrimônio Cultural do Brasil.
A grandeza e a beleza de seus espetáculos são incontestáveis e, este ano, o evento – que começou em 30/6 e termina em 2/7 – contou com o apoio do governo federal, por intermédio do Ministério do Turismo, e com as presenças de três ministras e do presidente da Embratur: Sonia Guajajara (Povos Indígenas), Margareth Menezes (Cultura), Daniela Carneiro (Turismo) e Marcelo Freixo.
Lideranças indígenas no bumbódromo
Representantes importantes do movimento indígena no país, o cacique Raoni Metukthire, líder do povo Kayapó (Mebengokre) e Alessandra Korap, do povo Munduruku (ganhadora do prêmio Nobel do ambientalismo este ano) foram convidados pelos grupos adversários para serem destaque em suas apresentações. Ele, na do Boi Garantido (representado pela cor vermelha), que abriu a primeira noite; ela, na do Boi Caprichoso (cor azul).
O cacique participou do ritual do pajé Adriano Paquetá no espetáculo ‘A Vida depende da Vida’, que destacou a urgência da preservação da natureza e do cuidado com a vida humana, e celebrou lideranças contemporâneas na defesa do meio ambiente, dos povos indígenas e dos direitos humanos.
No espetáculo ‘O Brado do Povo Guerreiro’, o apresentador do Boi Caprichoso começou exaltando a ancestralidade. Mais adiante, Alessandra apareceu segurando uma bandeira na qual se lia ‘Amazônia de pé’ e bradou: “Lute pela água da Amazônia! Salve a Amazônia! Não ao marco temporal! Amazônia em pé!”.
Nem índio, nem tribo
Após 55 edições, este ano o festival se comprometeu a eliminar de seu vocabulário (estatuto e apresentações orais) os termos índio e tribo, ambos restritos e pejorativos para os povos indígenas.
A mudança segue a conquista no âmbito da Camara dos Deputados, em julho do ano passado, onde o Projeto de Lei de autoria da então deputada Joenia Wapichana (hoje, presidente da Funai), que altera a nomenclatura do Dia do Índio, em 19 de abril, para Dia dos Povos Indígenas, foi aprovado (depois do veto de Bolsonaro).
E, este ano também, com a alteração do nome da Funai de Fundação Nacional do Índio para Fundação Nacional dos Povos Indígenas, e a criação do Ministério dos Povos Indígenas que, a princípio, seria dos Povos Originários.
Sendo assim, o anúncio do corpo de dança que faz a representação coreográfica desses povos também não usará o termo, como de costume.
Mas os participantes do festival famoso fizeram mais um gesto para mostrar que sua tradição centenária combina muito bem com a realidade do século em que vivemos: no Dia do Orgulho LGBTQIAP+, hasteou bandeiras da diversidade nos ‘currais’ dos bois Caprichoso e Garantido.
Fotos (destaque): Aguilar Abecassis (Raoni) e Amazon Best/divulgação (Alessandra)