Ao contrário do Dia dos Finados no Brasil, uma data muito solene e triste em que católicos lembram aqueles que se foram e levam flores aos cemitérios, os mexicanos comemoram com muita alegria o “El Día de los Muertos“. A celebração que tem origem em rituais indígenas de civilizações muito antigas é marcada por festas. A crença é que neste dia as portas do céu são abertas e as almas conseguem visitar por um breve momento, apenas uma noite, seus entes queridos. Por isso são recebidas com muita comida e bebidas.
Pois este ano, o Día de los Muertos no México também teve outro motivo para ser comemorado: a volta à natureza de um pequeno peixinho, o tiro dorado (Skiffia francesae), às águas do rio Teuchitlán, na região de Jalisco, único local onde era encontrado até o fim da década de 90.
O desaparecimento do tiro dorado foi provocado pela construção de barragens, poluição e introdução de espécies invasoras em seu habitat. Em 2018, ele foi declarado oficialmente extinto na natureza pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês).
Mas no último dia 4 de novembro, mais de 1,2 mil desses peixes foram reintroduzidos novamente no Teuchitlán. Eles vieram de programas de conservação, em que foram reproduzidos em cativeiro. Antes disso, entretanto, houve um longo e cuidadoso trabalho de restauração do ecossistema de Teuchitlán, que incluiu, entre outras coisas, a remoção de espécies invasivas.
E antes da soltura final, os peixes foram primeiro colocados em pequenas lagoas para que que se adaptem às condições de semi-cativeiro. Além disso, foram desparasitados e marcados, depois levados para gaiolas flutuantes no rio conhecidas como mesocosmos, onde são mantidos por pelo menos um mês, para que pudessem se habituar às condições naturais antes da reintrodução.
“Soltar o tiro dorado nesta época é uma metáfora de como a espécie voltou dos mortos para retornar ao seu lar, não por uma noite, mas para sempre”, diz Omar Domínguez-Domínguez, professor e pesquisador da Universidade de Michoacan e coordenador do projeto de reintrodução.
As gaiolas onde os peixes ficaram antes da soltura final
A soltura dos peixes é resultado do trabalho e da parceria de diversas entidades e organizações não-governamentais, entre elas, o Chester Zoo, Goodeid Working Group, Re:wild, SHOAL e a própria Universidade de Michoacan.
A expectativa agora é que esses mais de 1 mi indivíduos consigam se reproduzir e repovoar seu antigo habitat. A espécie tem um importante papel nesse ecossistema, pois se alimenta de larvas de mosquitos e algas e assim ajuda a controlar a propagação de ambos.
Pelos próximos cinco anos, essa população de tiros dorados será monitorada.
“Com milhares de espécies de água doce ameaçadas de extinção, a história do tiro dorado retornando à natureza é uma evidência inspiradora das muitas oportunidades de impacto de conservação que juntas podem reverter a crise da biodiversidade de água doce”, diz Harmony Patricio, gerente do programa de conservação da SHOAL e da Re :wild.
O projeto de reintrodução do tiro dorado faz parte do Fish Ark Mexico, um programa de conservação na região central México com foco em 41 espécies de peixes de água doce altamente ameaçadas.
O pequeno tiro dorado
*Com informações da Re:wild
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Fotos: Manfred Meiners/Re:wild