Em 2017, contamos aqui no Conexão Planeta a história de Cacau. A filhote de onça-pintada nasceu após vários anos de tentativas de reprodução de indivíduos em cativeiro no Refúgio Biológico Bela Vista, em Foz do Iguaçu, no Paraná. A fêmea era filha de Nena e Valente, animais que precisaram ser resgatados da vida selvagem e levados para lá.
Assim como sua mãe, Cacau é um linda onça-melânica, também chamada popularmente, de onça-preta. Sua pelagem é escura porque ela possui uma mutação genética que aumenta a produção da melanina e com isso, altera a cor de seu pelo, tornando-o negro. Esses indivíduos são bastante raros na natureza.
Atualmente com 7 anos, na semana passada Cacau – à esquerda na foto acima – fez uma longa viagem, com duração de mais de 15 horas. Acompanhada de um médico veterinário e de um biólogo, ela percorreu mais de 1.500 km, entre os estados do Paraná e de Goiás. Seu destino era o Instituto NEX No Extinction, instituição que recebe e cuida de felinos resgatados e também, trabalha com a reprodução em cativeiro para possíveis reintroduções na vida livre.
A finalidade da viagem de Cacau é que ela conheça Oxóssi – na direita, na imagem em destaque. O macho, melânico como ela, tem 3 anos e nasceu no NEX.
“Ele é fruto de um cruzamento planejado, exatamente com o objetivo de ajudar a reproduzir onças-pintadas da Mata Atlântica e do Cerrado”, explica Daniela Gianni, coordenadora de projetos e atividades do NEX.
O possível acasalamento entre Cacau e Oxóssi faz parte do Programa Nacional de Manejo Ex Situ da Onça-Pintada, coordenado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão do Ministério do Meio Ambiente, e pela Associação de Zoológicos e Aquários do Brasil, em parceria com o NEX e o Refúgio Ecológico de Itaipu.
“A onça-pintada poderá, em breve, estar extinta na Mata Atlântica. Em contagem recente, foram estimados 250 indivíduos no bioma.É uma corrida contra o tempo”, diz Daniela. “O plano de ação prevê a reprodução da espécie com animais que hoje vivem em cativeiro. Essa é uma das importâncias de se manter espécimes vulneráveis ou ameaçados em cativeiro. A garantia de que existirão no futuro. No entanto, infelizmente, não existem mais machos da Mata Atlântica em cativeiro para reprodução e, capturar um animal deste, em um bioma onde eles quase não existem mais, é extremamente difícil”.
Daí a escolha de Oxóssi. Apesar de ele ainda ser jovem e ter atingido a maturidade sexual há pouco tempo e nunca ter acasalado antes, há esperança de que ele possa gerar um filhote com Cacau. Outra questão é que o macho é um espécie do Cerrado, mas os dois biomas têm características similares.
“A Cacau carrega a genética da Mata Atlântica. Como não tem uma onça semelhante para a reprodução, a mais indicada é a do Cerrado, que tem uma genética mais parecida com a dela. A mãe da Cacau também é do Cerrado”, revela Pedro Henrique Ferreira Telles, médico veterinário de Itaipu.
Embora a viagem tenha sido longa, Cacau chegou bem em Goiás. Logo que saiu da caixa, reconheceu o território e se alimentou. Em um primeiro momento, ficará separada de Oxóssi por uma grade, até que a equipe decida que é hora dos dois compartilharem o mesmo recinto.
Na natureza, macho e fêmea de onças-pintadas só ficam juntos durante o período da reprodução. Após esse momento, eles se separam. A mãe cuida dos filhotes sozinhos.
“É uma ação que envolve muito planejamento e comprometimento de quem realmente trabalha em prol da conservação da espécie no Brasil. Hoje, essa ação é a única chance que a onça-pintada da Mata Atlântica tem de continuar existindo num futuro breve”, reforça a a coordenadora do NEX. “A tentativa de salvar a espécie da Mata Atlântica começa com o cruzamento deste casal”.
A ideia inicial era transportar Cacau por avião, mas como não havia tamanho adequado de caixa para ela, optou-se pela viagem terrestre. Todavia, houve uma pausa para ela dormir durante a noite e
paradas a cada duas horas
(Imagem: divulgação Itaipu Binacional)
De acordo com o Refúgio Biológico Itaipu, depois da temporada no NEX, Cacau seguirá para seu destino final, o Zoológico Municipal de Curitiba, onde está sendo construído um recinto especial para recebê-la até o final do ano.
*Existe apenas uma espécie de onça-pintada no mundo, a Phantera onca. Todavia, no Brasil, biólogos sabem que, dependendo do seu habitat, elas possuem um biotipo diferente. No Pantanal, uma planície onde não se exige tanto esforço físico para a sobrevivência, as onças são maiores. Enquanto isso, na Amazônia ou na Mata Atlântica, com áreas de mata mais fechada e serras, onde as presas conseguem se esconder melhor, as onças são mais esguias e leves.
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Foto de abertura: Instituto NEX No Extinction