A Amazônia guarda muitos ativos que podem ser portas para o desenvolvimento de medicamentos que potencialmente aliviam doenças e males.
O desmatamento que tem crescido nos últimos anos, além de afetar o clima, também leva consigo essa biodiversidade ainda tão pouco conhecida, e que é tão única desse bioma.
Em 2020, conheci Ana Paula Nascimento, presidente da COEX Carajás, uma cooperativa de extrativismo que atua na Floresta Nacional de Carajás ou Flona de Carajás, localizada no sudeste do estado do Pará.
A cooperativa está sediada no município de Parauapebas, região onde se encontra uma das maiores reservas minerais do mundo, a Serra dos Carajás, que vem sendo explorada desde a década de 1960.
Ao contrário da atividade minerária presente na região, a COEX Carajás tem, nos braços de seus cooperados, o trabalho sustentável de extrair folhas de jaborandi e sementes de espécies nativas do bioma na Flona de Carajás.
Criada em 2006 com o nome de Cooperativa Yaborandi, mudou de nome em 2011, e hoje é a única cooperativa de extrativismo pautada pela conservação ambiental, na região, com quase 40 cooperados.
Tratamentos da floresta e cuidado
O jaborandi, essa planta que muita gente conhece como ativo de produtos de tratamento para cabelos, traz em si um ativo importante que é base de medicamentos para glaucoma e câncer. Quem me explica isso é Ana Paula Nascimento, presidente da COEX Carajás.
A pilocarpina, presente nas folhas do jaborandi, é um ativo que possui ação contra o ressecamento de olhos, boca e pele, sendo, por isso, utilizada em medicamentos para tratamento de glaucoma, contra o ressecamento da boca causado pela quimioterapia e pela radioterapia, e em outras condições de baixa salivação.
A coleta das folhas do jaborandi é sazonal, e a espécie se distribui espalhadamente pela área da Flona de Carajás. Coletar as folhas exige permanecer na floresta por 30 a 40 dias, além de longas caminhadas. Por essa razão, as mulheres não se aproximaram dessa atividade.
“Meu papel é contribuir da melhor maneira possível para o pleno desenvolvimento e reconhecimento da atividade e valorização dos produtos fornecidos pela cooperativa”, diz Ana Paula, que é a única mulher na COEX Carajás.
A presidente da cooperativa lembra de quando a prática do extrativismo na floresta era uma atividade proibida, ainda na década de 1980. Hoje, com o entendimento da importância do uso sustentável para a sua conservação e ao mesmo tempo geração de renda e trabalho, o extrativismo realizado na Flona mostra que, além de cuidar da floresta, contribui para a saúde e bem-estar de muitas pessoas com o uso da pilocarpina em medicamentos.
E é também a partir da floresta que os cooperados da COEX Carajás coletam sementes nativas, que são utilizadas em ações de reflorestamento e compensação ambiental. Segundo a cooperativa, essa atividade já ajudou na recuperação de mais de mil hectares de floresta.
“Hoje o trabalho que a cooperativa desenvolve começa aqui na Flona de Carajás e atinge o mundo. Isso se dá a partir do momento em que o seu Tampinha, seu João, seu Francisco, entram dentro da mata para coletar o jaborandi, que contém essa substância que vai ser beneficiada, transportada para o Piauí, e de lá segue para uso exterior, para fabricar essas medicações que tantas pessoas usam”, diz Ana Paula.
“A cura está na cooperação. Naquela folhinha que a gente colheu aqui. Por isso é importante a valorização e o reconhecimento dos povos da floresta e também dos recursos naturais. Nós temos que entender, de uma forma simples e clara, que somos e precisamos do meio ambiente, e temos que viver em harmonia com ele”.
Aceleração e investimento
A COEX Carajás passou por um processo de aceleração em 2020, promovido pelo Programa de Aceleração e Investimento de Impacto da PPA, que ganhou outro nome: AMAZ Aceleradora de Impacto.
Ana Paula, que teve conhecimento sobre a Chamada Pública para aceleração por um parceiro do ICMBio, destaca a importância dos parceiros e da rede de apoiadores nos momentos de crise.
Na época, a cooperativa passava por dificuldades e precisava de uma caminhonete para transportar folhas e sementes da Flona de Carajás até sua sede.
“A gente conseguiu muito mais do que a caminhonete com esse processo. Estamos colhendo os frutos. O ano de 2021 está sendo bem próspero, diferente de 2020. A aceleração nos trouxe conhecimento, aprendizado e também muita autonomia financeira. Hoje, a cooperativa sabe tomar decisões na hora de investir”.
Edição: Mônica Nunes
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Foto (destaque): Henrique Saunier/Idesam