Já são mais de dez anos de discussões. Em 2011 foi aprovado pela Câmara dos Deputados um projeto de lei que, entre outras coisas, garante salários iguais para homens e mulheres. O texto determina multa para empregadores que “considerarem o sexo, a idade, a cor ou situação familiar como variável determinante para fins de remuneração”. No último dia 30 de março, a proposta também recebeu o aval positivo no Senado e seguiu para sanção presidencial.
Ontem, segunda (26/04), era o prazo final para o presidente Jair Bolsonaro sancionar o PL e torná-lo lei, mas ele enviou o projeto de volta para a Câmara. A devolução teria sido feita a pedido do presidente da casa, Arthur Lira, que alegou que o texto teria sofrido alteração no Senado e por esta razão deveria ser revisto novamente pelos deputados.
Todavia, sabe-se que Bolsonaro é contra o projeto de lei. Em uma de suas “lives” pela internet, ele já deixou clara sua opinião.
“Pode ser que o pessoal não contrate, ou contrate menos mulheres, vai ter mais dificuldade ainda”, afirmou na transmissão.
A proposta prevê o pagamento de indenização à empregada prejudicada, no valor de até cinco vezes a diferença de remuneração em relação ao homem que ocupa a mesma função.
Vale lembrar que o PL é importantíssimo não apenas para sanar um problema de desigualdade entre homens e mulheres, mas também, com outros setores da sociedade.
Segundo dados do Banco Mundial e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua de 2012 a 2019, divulgada no final do ano passado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), o Brasil é 9o país mais desigual do mundo: pessoas brancas ganham quase 70% mais do que pretos e pardos.
Em outro ranking internacional, o The Global Gender Gap Index 2020, do Fórum Econômico Mundial, que analisou os benefícios recebidos por homens e mulheres, que ocupavam o mesmo cargo, em 154 países, o Brasil aparece na 92a posição (no topo estão nações escandinavas: Islândia, Noruega, Finlândia e Suécia).
Na live, Bolsonaro disse também que se o texto virar lei ele pode “quebrar” muitas empresas. “Se eu veto o projeto, imagina como é que vai ser a campanha das mulheres contra mim. ‘Ah machista, eu sabia, ele é contra a mulher, quer que mulher ganhe menos’, etecetera, etecetera, etecetera… Se eu sanciono, os empresários vão falar o seguinte: Poxa, pode o que eu estou pagando aqui ser questionado judicialmente, na justiça trabalhista dificilmente o patrão ganha, quase sempre o empregado ou a empregada, no caso, ganha, então… Eu acho que é função diferente, a justiça do trabalho achou que não, é igual. Posso ter uma multa de R$ 200 (mil), R$ 300 (mil), R$ 400 (mil), R$ 1 milhão. Vai quebrar a empresa”.
O presidente falou ainda que irá fazer uma enquete entre seus seguidores para decidir o assunto.
“É um absurdo o presidente dizer que vai fazer uma enquete sobre este tema. Além de um desrespeito ao Congresso, que se debruçou e votou o tema, desmerece as mulheres, já que não existe razão para salários diferentes”, criticou a senadora Daniela Ribeiro.
Em novembro do ano passado, a Espanha aprovou uma lei semelhante, que determina multas a empresas que pagarem salários diferentes para homens e mulheres.
“A nova legislação é histórica e traz à tona as desigualdades de trabalho e dá aos trabalhadores as ferramentas para eliminá-las”, comemorou na época Yolanda Díaz, ministra do Trabalho da Espanha. “A disparidade salarial é uma aberração democrática que exclui, diferencia e viola os direitos das mulheres”.
No Brasil, se depender de Bolsonaro, parece que a aberração continuará ainda por muito tempo.
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