*Atualizado em 03/01/2018
Nas últimas semanas, o Conexão Planeta tem publicado uma série de reportagens sobre o projeto brasileiro Ararinha na Natureza, um desdobramento do Plano de Ação Nacional a Conservação da Ararinha-azul (PAN Ararinha-azul), coordenado pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres (Cemave/Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade – ICMBio), órgão do ministério do Meio Ambiente (MMA).
A série de posts começou a partir de uma denúncia internacional, feita pelo respeitado jornal britânico The Guardian, que levantou diversas – e gravíssimas suspeitas -, sobre o principal parceiro do programa brasileiro: Martin Guth, um criador alemão, que atualmente, tem em suas mãos 90% da população global de ararinhas-azuis (Cyanopsitta spixii). Elas estão na Association for the Conservation of Threatened Parrots (ACTP), localizada na pequena cidade de Tasdorf, a mais de 300 km da capital Berlim, a Associação para a Conservação dos Papagaios Ameaçados, tem uma licença para atuar como zoológico, mas – misteriosamente -, não funciona como um, pois não é aberta ao público.
Um criador de aves brasileiro entrou em contato com o Conexão Planeta. Com medo de represálias, pediu para que seu nome fosse mantido no anonimato. Ele reforçou as acusações a Guth (um ex-gerente de boate, que já foi preso e possui uma longa ficha criminal), conforme mostramos nesta outra matéria.
Ao longo dos últimos dias, conversamos com outros especialistas brasileiros em reprodução de aves. Todos têm medo de falar. A maioria deles afirma que o criador alemão é perigoso e sempre houve rumores que ele estaria ligado com o “mercado negro”, o tráfico internacional de aves, exatamente como a reportagem do The Guardian indica.
Martin Guth, no canto esquerdo da foto,
junto com o ex-ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, ao centro
Agora, surge um novo fato surpreendente.
Apesar de todas estas suspeitas – e uma petição internacional, já com quase 45 mil assinaturas, que pede a investigação do governo alemão ao criatório de Martin Guth -, o estrangeiro faz parte do consórcio de instituições parceiras que será responsável pela construção e administração, incluindo a transferência e cuidado das aves, do Centro de Reprodução e Reintrodução, no município de Curaçá, Bahia, que receberá, agora em 2019, 50 ararinhas-azuis. No futuro, os filhotes dessas aves serão soltos na natureza para repovoar a região, de onde a espécie é nativa.
Ou seja, o alemão, com ficha criminal, acusado de envolvimento com o tráfico de aves silvestres e temido por muitos criadores e biólogos brasileiros, estará em solo brasileiro cuidando das ararinhas-azuis que voltarão ao país.
Segundo a assessoria de imprensa do ministério do Meio Ambiente, “… o centro encontra-se em fase de autorização pelo ICMBio, gestor do Refúgio de Vida Silvestre… e o consórcio de instituições parceiras do projeto são: ACTP, Eco-conservation, Pairi Daiza e Jurong Bird Park”.
A Pairi Daiza é uma fundação na Bélgica que atua como um zoológico, assim como o Jurong Bird Park, em Singapura. Já a Eco-conservation não havia sido citada, até agora, em nenhuma matéria divulgada pelo ICMBio, em relação ao programa Ararinha na Natureza (o Conexão Planeta aguarda retorno do MMA sobre a origem da entidade).
São informações desencontradas, já que em um post de setembro de 2018, em sua página no Facebook, a ACTP afirma que, “juntamente com a Parrots International (PI) e AWWP (do Catar), com total apoio do governo brasileiro, compraram terras na Bahia – as fazendas Gangorra e Concórdia para o centro de reintrodução da espécie… A construção está em andamento, com a ACTP e seus parceiros financiando este investimento considerável”.
De acordo com matéria do jornal O Estado de S. Paulo, de 2016, o custo estimado do centro era de US$ 1,5 milhão.
“É uma temeridade ter esse alemão no Brasil. Ele só tem bichos raríssimos na Alemanha, que custam uma fortuna no mercado negro. Ninguém quer falar sobre o Guth porque todo mundo tem medo dele”, disse ao Conexão Planeta outro brasileiro, que esteve envolvido diretamente com o programa Ararinha na Natureza, mas preferiu deixar o projeto depois que percebeu que todas as decisões privilegiavam o envio das ararinhas-azuis ao criador alemão.
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*O Conexão Planeta entrou em contato com a ACTP, por e-mail, solicitando uma posição de Martin Guth sobre as acusações recebidas e as denúncias de que ele estaria envolvido com a venda de aves exóticas. Recebemos a resposta abaixo do diretor científico e zoológico da instituição, Dr. Cromwell Purchase:
“A história de nosso proprietário tem mais de 20 anos, e em nenhum momento, ele esteve envolvido no tráfico ilegal de aves …
Há muitas pessoas invejosas por aí (Brasil), todo mundo quer um pedaço do programa da ararinha-azul, agora que nós, parceiros do projeto, conseguimos chegar a esse ponto com tanto sucesso. Muitos parceiros foram removidos ao longo do caminho devido à política e à interrupção do programa, e tenho certeza de que muitos estão envolvidos nas acusações de que você fala … um artigo sem fatos, apenas boatos.
Você pergunta por que as empresas estrangeiras estão avançando com sucesso no programa da ararinha-azul. Porque nenhum criador brasileiro estava disposto a investir dinheiro para salvar essa espécie. Os custos para executar este projeto são enormes, especialmente se o fizermos com sucesso e o projeto exige um compromisso de longo prazo. Você preferiria que simplesmente deixássemos a espécie extinta, pois de repente parece que todas as organizações que não fazem parte dela e que os membros anteriores estão tentando fazer, já que não conseguiram fazer sua parte com sucesso quando estiveram envolvidos?
O sucesso dos últimos sete anos no programa da ararinha-azul são incríveis, algo que ninguém pensou ser possível relembrando a história da ave em cativeiro. Transformamos o projeto de, virtualmente sem esperança, em um sucesso retumbante e parceiros antigos são extremamente ciumentos que isso não poderia acontecer quando eles estavam envolvidos … Incrível como o sucesso traz inveja, e é incrível ver como esse pecado mortal é realmente maligno (não é de admirar é um dos 7 pecados mortais)”.
O Conexão Planeta se colocou à disposição para publicar uma entrevista exclusiva com Martin Guth, em que ele possa responder questões que ainda não ficaram claras, como por exemplo, a origem do dinheiro – do enorme investimento -, citado acima, já que a ACTP é uma organização sem fins lucrativos.
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Novamente, o Conexão Planeta quer deixar claro que está na torcida para que as ararinhas-azuis voltem a colorir dos céus da Caatinga baiana. Mas diante de tantas denúncias que temos recebido, nosso papel jornalístico é divulgar os fatos que ouvimos, buscar respostas junto ao ministério do Meio Ambiente e questionar, por que, até agora, os órgãos ambientais do governo não vieram a público dar uma declaração sobre sua confiança na ACTP e em Martin Guth.
Fotos: reprodução Facebook Association for the Conservation of Threatened Parrots (ACTP)
Meu Deus,estou aterrorizado,é como por a raposa dentro do galinheiro. Que Deus salve as ararinhas azuis mais uma vez.
Só sei que cada dia que passa nos que moramos aqui ficamos no meio dessa confusão sem saber quem é o vilão da estória