Se alguém tem dúvida de que pode transformar sua realidade, qualquer que seja, precisa conhecer os jovens que desenvolveram os cinco projetos premiados pelo movimento Criativos da Escola, parceria entre o Instituto Alana e o movimento Design for Change – idealizado por Kiran Bir Sethi, fundadora da Riverside School India.
Na cerimônia de entrega dos prêmios, em dezembro de 2015, em São Paulo, foi impossível não se emocionar, tanto na plateia como no palco (vale assistir o vídeo da transmissão ao vivo, sem cortes). Os projetos são lindos, geniais, incríveis! Fizeram e estão fazendo a diferença nas escolas e em suas comunidades. No coração de cada participante. E reverberam no meu, até agora.
Os jovens que os levaram adiante – muito bem acompanhados pelos professores que os apoiaram o tempo todo e, nessa manhã, deram depoimentos comoventes -, são protagonistas como pede o movimento do Alana, mas muito mais do que isso: são guerreiros. E – ao lado dos meninos e meninas que protagonizaram a ocupação das escolas estaduais em São Paulo – representam a geração de jovens que está transformando o ambiente escolar no que deveria ser sempre: um lugar de participação, de colaboração, de crescimento, de criatividade, de troca, no qual todos são imprescindíveis.
“O projeto Criativos da Escola é um movimento global que valoriza o protagonismo dos jovens e das crianças e propõe que eles transformem suas realidades, mas não no papel e, sim, botando a mão na massa”, explicou Carolina Pasquali, diretora de comunicação do Instituto Alana, ao dar início ao encontro. “Recebemos 419 projetos de todos os estados brasileiros e do DF. Esta é a prova de que tem muita gente fazendo na prática aquilo que a gente diz: que é preciso mudar a educação. Mas ela já está mudando! Já tem muita coisa acontecendo. E não tem mais volta!”. E mais: “Hoje, recebemos aqui 25 meninos e meninas, além de 10 educadores que descobriram que ensinar é aprender. Que essa troca dá muito certo”.
Os cinco projetos foram escolhidos pelos especialistas André Popovic, Ana Temido, Bárbara Soalheiro, Estela Renner, Helena Singer, Luciana Mendonça, Marcio Ricardo e Priscila Cruz devido ao impacto causado não só nos alunos e nas escolas, como também nas comunidades, e pelo nível de criatividade, empatia, colaboração e, principalmente, de protagonismo dos autores.
#EuSouCriativo: uma plataforma para quem acredita que uma ideia pode sair do papel
Os jovens e professores que vieram para São Paulo direto da Bahia, do Rio Grande do Norte, Ceará, do Distrito Federal e de Rondônia, não chegaram aqui só para receber seus prêmios. Antes, participaram de uma vivência criativa em Parelheiros, em meio à natureza no sul da capital paulista.
Lá ficaram dois dias para conviver e compartilhar experiências, sob orientação da equipe do projeto Mesa & Cadeira, e para cumprirem uma missão: criar uma plataforma que reunisse todos os projetos finalistas (foram 17) e inspirar outros jovens a participar dos próximos desafios, mas, independente disso, a transformar suas realidades.
Foi assim que surgiu o movimento e o site Eu Sou Criativo, idealizados para crianças e jovens de todo o país. No vídeo abaixo, os jovens participantes explicam bem a proposta. Além dos projetos finalistas, com destaque para os premiados – Mudei Minha Escola -, a plataforma indica 12 passos que devem ser seguidos por todos que quiserem realizar um projeto transformador, com base nas experiências de quem venceu o primeiro desafio: Quero Mudar Minha Escola.
E mais: quem publicar fotos no Instagram com a hashtag #EuSouCriativo tem sua foto incluída no site.
Os projetos finalistas e os cinco premiados
A diversidade marcou os projetos inscritos, não só pelas regiões do Brasil que representaram, como também pelos temas apresentados, que envolvem questões ambientais, sociais, econômicas e culturais.
Entre os finalistas há projetos como:
– o do bosque abandonado pela comunidade que foi adotado pela escola;
– o capacete salva vidas criado a partir do acidente de um amigo, que alia inovação e tecnologia;
– o grupo de teatro que criou uma linguagem única para incluir colegas com deficiência;
– os saraus inesperados, realizados durante visitas-surpresa a idosos, que despertaram o interesse dos alunos por literatura e música;
– o dicionário de gírias antigas que reconectaram gerações diversas;
– uma rádio mantida por crianças para melhorar as relações na escola;
– um projeto de descarte responsável de materiais tecnológicos por crianças de Santa Catarina;
– o projeto Nordestiando, com o qual crianças de São Paulo resgatam e celebram as raízes nordestinas de suas famílias, no palco e na tela e
– a criação do game The Last Drop para conscientizar as pessoas sobre a importância do consumo consciente de água.
Agora, eis os projetos premiados:
GAC – GRUPO DE APOIO E CONSELHOS
Alunos do 8º ano do Ensino Fundamental e 1º. do Ensino Médio do Colégio Estadual Professor Hermes Miranda do Val, na cidade de Simões Filho/BA.
Por meio do diálogo e da mediação de conflitos, jovens baianos conseguiram diminuir furtos e a violência na escola.
Tudo começou com o roubo de material escolar. Um aluno imaginou que poderia resolver o problema e se propôs a conversar com todos. Ao contrário do que muitos pensaram, ele ficou animadíssimo com o resultado da conversa. Reuniu colegas interessados em participar e, em pouco tempo, foram um grupo para resolver qualquer questão: o GAC – Grupo de Apoio e Conselhos. Mas a ação não se restringia à escola; ia além, às casas dos alunos. Hoje, eles realizam rodas de diálogos semanais para buscar alternativas para as questões apresentadas e mediar conflitos e são um elo de confiança entre alunos e a direção da escola. Resultado: os roubos acabaram e o clima geral melhorou.
AR REFRIGERADO E ÁGUA: UMA COMBINAÇÃO QUE DÁ VIDA
Alunos de 6º. e 9º. ano do Ensino Fundamental e 1º. ano do Ensino Médio da
Escola de Ensino Fundamental e Médio Murilo Braga, em Porto Velho/RO.
Alunos criaram sistema de coleta de água do sistema de ar condicionado para regar a horta e o jardim da escola. E, assim, deixam de desperdiçar mais de 12 mil litros de água por mês para regar a horta e o jardim da escola (são mais ou menos 800 litros economizados por dia).
Todos os dias, os alunos sofriam com as goteiras provocadas pelo ar refrigerado da escola, que fica ligado o dia inteiro e tem 22 centrais. Criaram uma comissão – à qual deram o nome de ComVida ou Comissão de Meio Ambiente e Qualidade de Vida – para investigar o assunto. Chegaram à conclusão de que poderiam reaproveitar a água desperdiçada. A partir daí, envolveram a comunidade e conseguiram a doação de materiais recicláveis para desenvolver o sistema de coleta e transporte da água até as plantas.
GAIOLAS LITERÁRIAS
Alunos de 6º. e 7º. ano do Ensino Fundamental da Escola Estadual Professora Elena Araújo, em Parnamirim/RN.
Os alunos transformaram gaiolas em minibibliotecas e transformaram um problema ambiental grave, muito comum na cidade. Lá, jovens e crianças tinham o costume de capturar aves silvestres para manter em gaiolas ou vender. Muitos desses animais sofriam maus tratos e alguns morriam. Sem aceitar a situação, um grupo de alunos resolveu tentar conscientizar quem mantinha esse hábito horrível. Depois de muita conversa, os adeptos da prática decidiram não mais capturar aves.
Mas aí surgiu outra questão: o que fazer com tantas gaiolas vazias? Um dos alunos teve a ideia: transformar gaiolas que prendem pássaros em gaiolas que soltam livros, em minibibliotecas. Os alunos iniciaram campanha para arrecadar gaiolas e livros, e também promoveram aulas de artesanato para engajar a população.
Hoje, as gaiolas estão espalhadas pela cidade. Nelas, só moram livros e qualquer pessoa pode pegar um livro e deixar outro.
JOVEM EXPLORADOR E O ECOMUSEU
Alunos do 1º, 2º. e 3º. anos do Ensino Médio da Escola Menezes Pimentel, em Pacoti/CE.
A partir do convite de um professor de História e inspirados pela Imperial Expedição Científica de Exploração, enviada ao Ceará no século XIX, um grupo de alunos saiu em uma expedição para pesquisar a fauna, a flora e a cultura da região. E fizeram descobertas incríveis, inclusive que as pessoas da cidade desconheciam a riqueza da biodiversidade e da cultura locais.
Depois de tantos registros da memória cultural e ambiental da cidade e de descobrir espécies raras, eles queriam contar tudo para a população porque acreditam que, quanto mais se conhece a natureza e o lugar em que se vive, mais é possível amá-los, respeitá-los e protegê-los. Mas como fazer isso?
Começaram por realizar exposições abertas na escola – que continuam até hoje -, mas eles queriam mais. Foi então que tiveram a ideia de criar o Ecomuseu de Pacoti. Para tanto, envolveram e mobilizaram a população da cidade. Conseguiram um terreno para abrigar a obra e um projeto de reuso de plástico reciclável. Agora, estão se mobilizando para financiar coletivamente a montagem e a estrutura do museu.
HISTÓRIAS CONSTRUÍDAS POR BLOCOS
Alunos do 6º. e 7º. anos do Ensino Fundamental do Centro de Educação Nery Lacerda, em Sobradinho/DF.
Os alunos achavam que as aulas de História eram muito distantes da realidade deles, o que gerava tédio e aumentava a dispersão e o uso do celular em sala de aula. Só que, apreender o aparelho de um e de outro aluno, não era muito eficiente para colocar ordem na turma. E foi a criatividade que salvou alunos e o professor de um impasse.
Eles propuseram usar um jogo de computador – o Minecraft – para aprender História. A proposta: parte das aulas seria de teoria e a outra aprendida por meio de jogos. A princípio, o educador relutou e duvidou que pudesse dar certo, mas foi bem sincero: não conhecia o jogo. Aceitou aprender a trabalhar com ele, desde que os alunos o ajudassem, o que eles toparam na hora. Resultado: os alunos ficaram motivados e se tornaram muito interessados nas aulas e, finalmente, aprenderam História.
A ideia mobilizou a escola toda. “Demos um gameover na recuperação!”, disseram felizes.
Fotos: Reprodução