*Por Welyton Manoel
Por muito tempo, acreditou-se que fauna, flora e recursos hídricos fossem infinitos. Este pensamento fez com que o homem explorasse a natureza sem oferecer nada em troca. Pior que isso. O desmatamento, a poluição e a caça foram fatores que contribuíram para que nosso país perdesse grande parte de sua riqueza natural.
Mas, felizmente, ainda existem pessoas tentando consertar todo esse estrago. No Brasil, os exemplos vêm de três locais que tem a vida animal como atração principal: o Zooparque Itatiba, em São Paulo, e o Refúgio Biológico Bela Vista e o Parque das Aves, ambos em Foz do Iguaçu (PR), que desenvolvem programas de reprodução com espécies ameaçadas de extinção. O trabalho árduo já rendeu algumas conquistas.
Parque das Aves – Beleza e vida
Embora seja vizinho das Cataratas do Iguaçu, o Parque das Aves não fica muito atrás no quesito beleza e visitação, com suas 1.300 aves de 143 espécies. Mas o que ainda é desconhecido pelos quase 800 mil turistas que visitam o local todos os anos, é que cerca de 43% das aves que estão lá são advindas do programa de reprodução desenvolvido pelo parque.
O médico-veterinário Mathias Dislich, chefe do departamento de pesquisa, conta como tudo começou.
“O parque, desde a sua fundação, tem trabalhado com algumas espécies ameaçadas, e ao longo dos anos, a gente buscou a reprodução das mesmas. Mais recentemente, nos últimos quatro ou cinco anos, iniciamos uma segunda fase, que foi participar dos programas de cativeiro coordenados pelo ICMBio e pelo IBAMA. É o caso, por exemplo, do mutum-de-alagoas e do cardeal amarelo.”
Mathias Dislich alimentando um urutau, pássaro raro e ameaçado de extinção
O veterinário conta ainda que as evoluções do programa ao longo dos anos o credenciou para fazer a reprodução de mais espécies. A relação com o ICMBio se tornou mútua – um buscava o outro para garantir a sobrevivência das aves. Dislich comenta com orgulho um dos principais resultados obtidos. “Um dos melhores casos foi com o mutum-de-alagoas, que em um ano, conseguimos mais de 20 filhotes. E inclusive, aprimorarmos algumas técnicas de reprodução e protocolos.”
Proteção da vida no Parque das Aves
Refúgio Biológico Bela Vista – A proteção do oeste paranaense
A energia que impulsiona o Refúgio Biológico Bela Vista é a mesma gerada pela sua mantenedora: a Itaipu Binacional. Há 32 anos, o local foi criado em Foz do Iguaçu (PR) com o objetivo de resgatar e proteger a fauna e a flora da região. Com o tempo, ele também se tornou mais um ponto de visitação na fronteira. São trilhas em meio à natureza e animais em recintos confortáveis, que proporcionam uma experiência única para os visitantes.
Mas saindo do percurso turístico, encontramos a unidade de proteção ambiental, que também desenvolve diversos programas para a conservação da biodiversidade. A equipe composta por mais de 30 pessoas tem à disposição uma grande estrutura que conta com laboratórios médicos e de pesquisa, farmácia, incubadoras, cozinha e recintos específicos para espécies no programa de reprodução. Das quase 50, cerca de oito estão nele.
Quem conta a história do programa é Marcos José de Oliveira, biólogo do Refúgio. “Temos este grande objetivo que é a conservação de espécies ameaçadas da região. Trabalhamos com a fauna regional, e depois ampliamos mais as atividades, como por exemplo a instalação do hospital veterinário aqui do refúgio, que atende os animais feridos da região, que os órgãos encaminham para cá. Fazemos a reabilitação de algumas espécies e mantemos no zoológico a exposição de animais e algumas espécies são reproduzidas.”
O biólogo também comemora os resultados do trabalho, principalmente, com as harpias. O local foi um dos pioneiros na América Latina a conseguir a reprodução em cativeiro da espécie, ameaçada de extinção. Já nasceram 26 filhotes desde 2009.
A bem sucedida reprodução de harpias
“Já faz dois anos que a alcançamos um número de mais de mil animais reproduzidos em cativeiro. E das espécies trabalhadas, sempre foram destaques as espécies mais ameaçadas da região. Inicialmente, trabalhávamos com os felinos, em parceria com outros órgãos de estudos”, revela Oliveira. “Utimamente, temos focado bastante na reprodução no projeto das águias harpias e das onças-pintadas.”
Zooparque Itatiba – Um zoológico diferente
Na década de 90, surgiu no interior de São Paulo um zoológico com uma proposta inovadora. A ideia do Zooparque Itatiba era reproduzir da forma mais real possível o habitat natural de diversas espécies de animais.
Os anos passaram, mas os ideais permaneceram. Tanto que o local também passou a realizar programas de reprodução com espécies ameaçadas de extinção. E o reconhecimento foi tão grande que um zoológico da Áustria enviou um casal de girafas em risco de extinção para o Zooparque. O objetivo era nobre: resgatar a espécie.
O veterinário responsável, Alexandre Resende, dá mais detalhes desse trabalho: “O Zooparque faz parte de vários programas de conservação de espécies ameaçadas de extinção. Tanto espécies de animais silvestre nativos, como exóticos. No caso das girafas vindas da Áustria, o intuito deles é repassar para entidades que eles confiam, para que consigamos reproduzir também e manter esse backup genético. Aqui no Brasil, ela vai ter um conforto térmico muito melhor do que ela tinha na Áustria. Embora tenha nascido em cativeiro e já tivesse acostumada com o clima de lá, onde há uma variação térmica e uma amplitude muito maior. Na África, o animal pega temperaturas muito mais altas e muito mais baixas também. Então, quanto ao clima, aqui é excelente para a girafa.”
Alexandre Resende, alimentando uma das girafas, da espécie Rothschild,
também conhecida como girafa do norte
Além das girafas, o zoo também atua na reprodução de outros animais. Cerca de 70% das 320 espécies, fazem parte do programa. Lêmure-catta, lemurê branco e preto e pato-mergulhão são exemplos de sucesso do projeto. Segundo Resende, o objetivo é estabelecer uma população de segurança para esses animais, e então, soltá-los na natureza.
O pato-mergulhão está na lista das dez aves aquáticas mais ameaçadas de extinção no mundo
“Tem várias espécies que reproduzimos em cativeiro para dominar a técnica e usar em algumas outras espécies que estão ameaçadas de extinção. No caso do pato-mergulhão, fomos indicados porque já trabalhamos há um bom tempo com espécies aquáticas de reprodução, espécies raras. Hoje temos um trabalho de coletar ovos deste pato na natureza, trazendo para o zoológico, sob a orientação do Instituto Chico Mendes, que cuida das espécies ameaçadas de extinção. E acabamos de incubar e criar os filhotes. Hoje possuimos cinco casais, dez animais.”
Satisfação
Três locais, três equipes, três projetos e um só objetivo: tentar devolver para a natureza a vida que ela nos dá. Satisfação, orgulho, responsabilidade, proteção e respeito são palavras que eles utilizam, mas que talvez não definam totalmente a dimensão e a importância do trabalho que fazem.
Mas para quem vê de fora, uma define: gratidão!
*Texto publicado originalmente em 21/06/2017 no site da Web Radio Água (*com a supervisão dos jornalistas Vacy Álvaro e Poliana Côrrea)
Fotos: divulgação