
Em seus 55 anos de história, esta é a primeira vez que a Vogue italiana tem em sua capa – e em todas as suas páginas – apenas ilustrações e nenhuma foto. A edição especial de janeiro, que chegou às bancas da Itália esta semana, foi planejada cuidadosamente para levantar uma bandeira pública: a da sustentabilidade!
“As sete capas, bem como as imagens de todas as reportagens de nossa primeira edição de 2020, foram desenhadas por artistas, que vão de ícones conhecidos da arte e talentos emergentes a lendas dos quadrinhos, que criaram sem viajar, transportar figurinos ou gerar qualquer tipo de poluição. O desafio era provar que é possível mostrar roupas sem fotografá-las. Isso é pioneiro: Vogue Italia nunca teve uma capa ilustrada. E até onde sei, nunca antes uma publicação da revista já foi impressa sem que a fotografia fosse seu meio visual principal”, escreveu o editor Emanuele Farneti, no perfil do Instagram da Vogue.
No editorial da revista disponível na internet, Farneti admite que, em uma edição normal da publicação, é necessário o trabalho de 150 pessoas, aproximadamente 20 voos aéreos e 40 viagens de trens são realizados. Durante pelo menos dez horas, refletores de luz ficam ligados continuamente, alimentados por geradores a gasolina. Sempre sobram comidas de buffet, que acabam indo para o lixo, assim com o plástico que embala os figurinos. Há ainda a eletricidade para recarregar telefones, câmeras…
Ou seja, há um desperdício gigantesco para a produção de uma simples edição de uma revista de moda. Nesse caso, a mais famosa do planeta, criada nos Estados Unidos, em 1892. Mas não há desculpa. O mundo mudou, os tempos são outros.
Em dezembro do ano passado, em outro editorial, mas dessa vez global, representando as 69 redações da Vogue, atualmente sob o comando da editora Condé Nast, a publicação assumiu o compromisso e a missão de, a partir de 2020, disseminar valores como o respeito à diversidade e à preservação do planeta para as futuras gerações. Na declaração, a revista afirma que a maioria de seus leitores espera que o mercado da moda se torne mais sustentável.
“No debate internacional sobre sustentabilidade e nos valores que a Vogue prometeu promover na próxima década, há um aspecto que é particularmente especial para mim: honestidade intelectual. No nosso caso, isso significa admitir que há um impacto ambiental significativo associado à publicação de uma revista de moda”, diz Emanuele Farneti.
O editor italiano revela que as estatísticas citadas mais acima são apenas uma estimativa arredondada do que foi necessário para se produzir as oito matérias que compuseram a última edição de setembro.
“Mudar é difícil, mas como podemos pedir que outros mudem se não estamos preparados para nos questionar? Assim, este mês queríamos lançar uma mensagem: que a criatividade – que tem sido a pedra angular da Vogue há quase 130 anos – pode e deve nos levar a explorar diferentes caminhos”.

Desenho de Vanessa Beecroft
Nessa edição de janeiro, duas personalidades foram convidadas para responder dois questionamentos complicados: Pode a moda, com sua necessidade obsessiva por novidades e seu fetiche de posse, aspirar ser genuinamente sustentável? E a busca pela diversidade – que é muito necessária e nunca suficiente – é sobre sinceridade ou tática?
Quem responde a estes questionamentos são a economista e ambientalista, Naomi Klein, uma das maiores vozes contra as mudanças climáticas, e a modelo brasileira transgênero, Lea T.
Outras reportagens da edição especial falam sobre reciclagem de roupas e a redução de resíduos na processo de fabricação.

Uma das ilustrações de capas feitas por Milo Manara
O dinheiro economizado durante a produção da Vogue Italia de janeiro será doado para ajudar a restaurar a Fondazione Querini Stampalia, uma instituição cultural de Veneza, danificada pelas inundações catastróficas que ocorreram na cidade em novembro.
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Ilustrações: divulgação Vogue Italia