Em fevereiro de 2003, Valdelice Veron presenciou o assassinato do pai, o cacique Guarani-Kaiowá Marcos Veron, por seguranças contratados para desocupar a Fazenda Brasília do Sul, em Juti, no Mato Grosso do Sul. E já tinha visto muito mais: parentes espancados e algemados, mulheres violentadas e crianças abandonadas no meio da estrada.
Diante de realidade tão cruel, ela deixou o medo de lado, se ‘muniu’ de coragem e determinação e se transformou numa das lideranças mais atuantes e combativas do país, que luta pela demarcação dos territórios indígenas, pelos direitos humanos e, em especial, pelas mulheres. E foi estudar.
É graduada em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), mestra em sustentabilidade dos povos e terras tradicionais pela Universidade de Brasília (UnB) e doutoranda em Antropologia Social pela mesma instituição.
Agora, Veron está entre as homenageadas do 21º Prêmio Anual de Liderança Global (21st Annual Global Leadership Awards), concedido pela Vital Voices Global Paternship, organização fundada por Hillary Clinton, ex-primeira-dama dos Estados Unidos e secretária de Estado, e Alyse Nelson, atual presidente e CEO.
Os nomes foram anunciados em 16 de setembro, em encontro na sede da organização, no centro de Washington, “que também serve como uma embaixada global para mulheres líderes”.
De acordo com a organização, o prêmio reconhece “mulheres líderes que desafiam o status quo, desafiam as normas e perturbam os sistemas. Mulheres que não esperaram permissão para agir e, em vez disso, puxaram seus próprios assentos para a mesa ou criaram seus próprios”.
Valdelice foi escolhida “por liderar sem medo uma luta com risco de vida para defender sua terra natal e seu povo contra o desmatamento e o desenvolvimento”.
Além da cacique Guarani-Kaiowá, na cerimônia de entrega do prêmio, em 9 de novembro, em Washington, serão agraciadas:
– Cinco ONGs ucranianas lideradas por mulheres, reconhecidas por “se levantarem como um coletivo para impedir a invasão russa”;
– Phumzile Van Damme, da África do Sul, “por arriscar tudo para lutar contra o establishment e os gigantes da mídia social para lutar contra a desinformação”; e
– Monica Simpson, dos EUA, “por defender os direitos de justiça reprodutiva para todas as mulheres como líder e ativista da justiça social”.
“Quando pensamos sobre o que o mundo precisa agora, é de uma abordagem ousada para liderar mudanças – não podemos mais aceitar o status quo. Precisamos de líderes com a convicção para criar mudanças e uma liderança corajosa que promova a justiça, proteja a paz e fale a verdade ao poder”, declarou Alyse Nelson, durante o encontro.
Na cerimônia de entrega dos prêmios, no John F. Kennedy Center for the Performing Arts, em Washington (a última foi em 2019, devido a pandemia), além de Hillary Clinton, estarão presentes Diane von Furstenberg, designer e empresária da moda e ativista feminista, e Bozoma Saint John, uma das executivas de marketing mais celebradas do mundo – atuou em grandes empresas como Uber, Apple, PepsiCo e Netflix – que luta pela diversidade nas corporações.
Fotos: arquivo pessoal