A líder indígena Sonia Guajajara, eleita deputada federal por São Paulo pelo PSOL, em outubro, foi a escolhida pelo presidente Lula para ser sua ministra à frente do novo Ministério dos Povos Indígenas (inicialmente Povos Originários). O anúncio oficial deve ser feito por ele nos próximos dias.
Lula e Sonia vinham conversando desde que a APIB – Articulação dos Povos Indígenas do Brasil enviou uma lista tríplice para o presidente, que, além de seu nome, indicava Joênia Wapichana, a primeira deputada federal indígena eleita por Rondônia pela REDE, em 2018 (junto com Bolsonaro), mas que não conseguiu se reeleger, e Weibe Tapeba, vereador de Caucaia, Ceará, pelo PT.
E, hoje, Sonia viajou à Brasília para encontrar o presidente e receber dele o convite, formalmente.
Estrutura do ministério
A decisão levou mais tempo do que o previsto inicialmente devido à indefinição sobre o formato do ministério, que não existe e está sendo criado neste governo.
Durante o trabalho do Gabinete de Transição, o presidente chegou a cogitar criar uma secretaria em vez de um ministério, mas a ideia foi rapidamente refutada por diversas lideranças indígenas – incluindo Sonia. Elas lembraram que não essa a promessa feita por ele.
Um dos principais impedimentos para a definição do organograma do ministério se referia à Funai (Fundação Nacional do Índio), que deve ser transferida do Ministério da Justiça para a nova pasta, e o orçamento do órgão deve ser utilizado no início das atividades.
Mas, para que a transferência ocorra, é preciso resolver questões burocráticas como, por exemplo, a demarcação de terras que só podem ser feitas pela Funai. No entanto, precisam passar pelo Ministério da Justiça para que seja feita a homologação.
Outro órgão importante para a política indígena é a Sesai – Secretaria de Saúde Indígena, que detém a maior verba, mas este continuará sendo gerido pelo Ministério da Saúde para que sua operação não seja afetada pelas mudanças neste momento.
Além disso, o movimento indígena entende que precisa estar presente em outros ministérios, não só no dos Povos Indígenas, e ainda reivindica a chefia de órgãos como a Funai, a Sesai e a Secretaria de Educação Indígena, do Ministério da Educação (MEC), ou, pelo menos, a indicação de pessoas para ocupá-los.
A escolha
Antes do surgimento da lista tríplice da APIB, os dois nomes cotados para assumir o ministério eram os de Sonia e de Joênia, como contamos aqui.
A liderança e a popularidade de Sonia são inquestionáveis. Ela entrou para a história ao ser eleita, neste ano, a primeira parlamentar indígena por São Paulo. Antes, nas eleições de 2018, foi candidata à vice-presidência da República pelo PSOL, na chapa com o deputado federal eleito Guilherme Boulos.
É ativista conhecida tanto no Brasil como no exterior. Participou de diversas conferências do clima da ONU e de encontros com governos e empresas na Europa para reivindicar medidas em relação à importação de produtos oriundos de desmatamento na Amazônia.
Foi eleita uma das 100 personalidades mais influentes do mundo, pela revista Time e foi indicada ao Prêmio Sakharov, o principal reconhecimento de direitos humanos da Europa (o vencedor foi o povo ucraniano).
Não há qualquer dúvida sobre seu talento e competência para assumir a missão. No entanto, ao tornar-se ministra, Sonia desfalca a Bancada do Cocar na Câmara dos Deputados, que compunha com a amiga e liderança indígena Célia Xakriabá, eleita deputada federal por Minas Gerais.
Este ano, há outros indígenas eleitos, mas não reconhecidos pelo movimento indígena, sendo dois são apoiadores de Bolsonaro: o ainda vice-presidente Hamilton Mourão, que se autodeclara indígena e assumirá uma vaga no Senado por Santa Catarina, e a bolsonarista Silvia Waiapi, eleita deputada federal por Roraima. O terceiro nome é Luciana Cardoso, paulista e afroindígena, do PT.
Joênia seria o nome ideal, não só pra que Sonia pudesse atuar no Congresso Nacional, como também por sua trajetória como deputada federal nos últimos quatro anos.
Ela conhece bem os meandros da política, resgatou a Comissão Parlamentar Mista dos Direitos dos Povos Indígenas e lutou incansavelmente contra a bancada ruralista e o lobby da mineração. Além isso, para comandar o ministério, contava com o apoio de dois importantes líderes indígenas: Raoni e Ailton Krenak.
Com as idas de Sonia Guajajara para o Ministério dos Povos Indígenas e de Marina Silva para o Ministério do Meio Ambiente, dois outros nomes assumem suas vagas na Câmara dos Deputados, ambos do PSOL: a professora Luciene Cavalcante e o deputado federal Ivan Valente, os dois primeiros nomes na lista de suplentes.
Célia Xakriabá será a única voz indígena no Congresso Nacional, como foi Joênia Wapichana nos últimos quatro anos, durante a gestão de Bolsonaro.
Foto (destaque): Mídia Ninja