Quando, em 2016, a câmera do robô mergulhador da primeira expedição exploratória em Necker Island, no Havaí, nas profundezas do Oceano Pacífico, encontrou um polvo albino ou polvo fantasma, surpreendeu e confundiu os cientistas que operavam o robô em terra: o animal parecia ‘sentado’ e balançava suavemente seus tentáculos curtos e atarracados.
A descoberta foi um momento marcante para os pesquisadores que integravam a expedição, como lembrou Janet Voight, curadora associada de zoologia de invertebrados do Field Museum of Natural History, localizado em Chicago, EUA, à reportagem do jornal britânico The Guardian.
“Totalmente novo e diferente”, relembrou a especialista sobre as primeiras impressões. De imediato, eles acreditaram que se tratava de uma espécie não descrita e os questionamentos foram imediatos.
Por que uma cor tão pálida se os polvos são hábeis em mudar de cor, seja para se camuflar e se proteger de predadores, seja para caçar? Será sinal de evolução?
A imagem fantasmagórica lhe rendeu um apelido carinhoso: Casper (ou Gaspar, em português), numa alusão ao ‘fantasminha camarada’ que estreou em 1939, numa história em quadrinhos, ficou famoso com a animação de 1945, atravessando diversas gerações, e chegou às telas dos cinemas em 1995.
E assim ele continua sendo chamado, mesmo depois de tanto tempo, porque pouco se sabe da espécie e ninguém se atreveu a lhe dar um nome científico nessas condições.
Casper me parece um bom candidato para isso, mas o fato é que, em todos estes anos, nenhum indivíduo foi coletado para a realização de estudos em laboratório. O que se sabe, hoje, tem por base a análise das imagens coletadas até agora.
E, assim, tanto o tamanho de seus tentáculos – por que tão curtos? – e a profundidade onde foi encontrado – 4.290 metros! – continuam sem respostas.
Falta de pigmentos
Você lembra do polvo Dumbo, chamado assim em homenagem ao elefantinho da Disney por ter ‘abas’ grandes, semelhantes a orelhas em ambos os lados da cabeça? Falamos deles em duas ocasiões: aqui e aqui. Pois eles são os únicos registrados em águas tão profundas, mais precisamente 6.957 metros.
Em relação à Gaspar, a especialista conjectura que sua cor não tem nada a ver com a profundidade onde vive, mas pode estar ligada à falta de pigmentos em sua comida.
Mesmo no fundo do mar, os polvos podem ser coloridos como revelam a espécie de graneledone roxo e verrugoso. Outros, usam uma espécie de manto de pigmentos de pele escura como se quisessem esconder as presas brilhantes e bioluminescentes que capturam com seus múltiplos braços, evitando chamar a atenção de outros predadores.
Tentáculos mais curtos nas profundezas
O polvo fantasma também chamou a atenção de Voight devido a seus tentáculos curtos, mas ela reconhece que essa espécie não é a única a apresentar tal característica, definida pelo local onde a espécie vive: “Quanto mais superficial e tropical o polvo, mais longos e finos serão seus tentáculos”.
Ela acrescenta que não há uma explicação definitiva e cientifica sobre a tendência de tentáculos mais curtos em polvos que vivem nas profundezas.
E a pesquisadora ainda destaca que, em vez de se esticar para pegar comida, esses animais desenvolveram uma tática alternativa de torcer seus corpos para que sua boca, na parte inferior do corpo, fique diretamente sobre a comida.
Mais comum do que se imagina?
Os pesquisadores também observaram que as fêmeas do polvo albino depositam ovos em outros locais, como grandes esponjas marinhas, e não em pedras já que estas não são encontradas em abundância em grandes profundidades. E Voight se pergunta: “Isso é um avanço em sua evolução?”.
Ela ainda acrescenta que, depois da análise de tantas imagens coletadas durante tantos anos, em pesquisas realizadas em águas profundas no Oceano Pacífico, cientistas de diferentes expedições avistaram dezenas de outros povos albinos no fundo do mar, ao que tudo indica, de duas espécies distintas.
E isso trouxe uma nova reflexão: o polvo albino pode ser mais comum do que se imagina, o que indica que sabemos muito pouco sobre “o que está lá embaixo”, de fato. Para acabar com tantos mistérios, é preciso avançar nas pesquisas de laboratório. Só assim será possível conhecer melhor essa espécie que, por ora, parece tão fantástica.
Agora, assista ao vídeo registrado em 2016 pelo Escritório de Exploração e Pesquisa Oceânica do NOAA (National Oceanic and Atmospheric Administration) e veja como o polvo fantasma se movimenta suavemente.
Foto: reprodução vídeo NOAA