Mangaba, Araticum, Seriguela, Baru e Pequi tinham menos de um mês de vida quando perderam a mãe em 2020. Os filhotes de lobo-guará (Chrysocyon brachyurus) foram encontrados sozinhos, numa toca, localizada nos arredores da Fazenda Trijunção, em Goiás. Só foram resgatados porque a mãe, a fêmea Caliandra, era monitorada através de um colar GPS pelos pesquisadores do Onçafari, que notaram a ausência de sinais de deslocamento.
Os filhotes, que ficaram alguns dias sem serem alimentados, foram levados então para o berçário do Zoológico de Brasília, o lugar mais próximo da região e que tinha condições de cuidar apropriadamente dos pequenos animais. Naquela época, contei essa história, aqui no Conexão Planeta, neste outro texto.
Todavia, com o passar dos meses, o espaço foi ficando pequeno para os cinco irmãos e como a meta era reintroduzi-los na vida selvagem, era necessário prepará-los para a soltura.
Agora, quase dois anos depois do ocorrido, os cinco irmãos se encontram bem e saudáveis. Como a espécie tem hábitos de vida solitários e podem competir entre sim, decidiu-se pelo encaminhamento deles para organizações diferentes, que estão responsáveis agora por treiná-los para a volta à natureza. Mangaba e Araticum ficaram no Onçafari e Baru, Seriguela e Pequi, inicialmente com o Parque Vida Cerrado, na Bahia.
Mas após um ano lá, Pequi foi transferida no mês passado para uma área de preservação em Paraíso da Terra, em Brasília, sob os cuidados da ONG Jaguaracambé. A lobinha, que tem 1 ano e seis meses, está num recinto de 2.750 m2, totalmente inserido numa área de Cerrado. “A partir de agora ela passará por três ciclos de aproximadamente 90 dias cada um, em que começaremos a distribuir a alimentação pelo recinto, incluindo uma maior proporção de frutas nativas, reduzindo a ração e colocando algumas presas, primeiramente abatidas, mas depois vivas para ela caçar”, explica a zootecnista Ana Raquel Gomes Faria.
Os cinco irmãos logo após o resgate em 2020
(Foto: Ivan Mattos)
Treinamento para a vida no Cerrado
Como o objetivo é reproduzir ao máximo o ambiente selvagem com o qual Pequi irá se deparar ao ser solta no futuro, o contato com seres humanos também foi minimizado. Todo o monitoramento dela, dentro do recinto, é feito através de uma câmera, ligada 24 horas. “Ela é literalmente um ‘BBB’ da Pequi. A gente observa ela o tempo todo e neste mês aqui já percebemos algumas coisas interessantes, como o comportamento de caça, a atividade maior noturna e a aproximação de um lobo de vida livre, que não sabemos ainda se é um macho ou uma fêmea”.
A expectativa da equipe da Jaguaracambé é que Pequi fique no recinto por uns dez meses. Neste interim, será feita a análise sanitária de outros lobos presentes na região e também, um projeto de educação ambiental com os moradores das comunidades locais.
“Ela receberá um colar GPS para monitoramento, mas sabemos que ela enfrentará riscos, como qualquer outro lobo-guará, e o que estamos fazendo agora é prepará-la para enfrentá-los”, diz Ana Raquel.
Registro recente de Pequi, já em seu recinto em Paraíso da Terra
(Foto: reprodução Instagram @soueupequi)
Sua chance de contribuir para a soltura de Pequi
Todo o lindo trabalho da ONG Jaguaracambé é realizado com a ajuda de alguns patrocinadores, mas principalmente, de doações. Se você quiser contribuir com ele e assim, promover a soltura da Pequi, acesse este link no site Vakinha.
“É muito importante divulgar que esse é um projeto social. Ainda precisamos recursos para terminar de pagar o recinto, a aquisição do colar, então esse engajamento da sociedade é essencial”, ressalta Ana Raquel.
E você também pode acompanhar todo o progresso da Pequi num perfil criado especialmente para ela no Instagram: Sou eu Pequi.
O projeto de reintrodução de todos os cinco filhotes de lobo-guará faz parte de um Plano de Ação Nacional para a Conservação da Espécie, coordenado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), e que ajudará na elaboração de um protocolo a ser utilizado por outros indivíduos, no futuro, que se encontrem na mesma situação que Mangaba, Araticum, Seriguela, Baru e Pequi.
Espécie típica do Cerrado brasileiro, o Chrysocyon brachyurus é o maior canídeo selvagem da América do Sul. Infelizmente, ele encontra-se ameaçado de extinção, devido principalmente à destruição de seu habitat pelo desmatamento.
O nome guará vem da língua indígena e significa “vermelho”. Com aproximadamente 90 cm de altura, pesa, em média, 23 kg. De hábitos solitários, macho e fêmea se encontram somente para reproduzir e cuidar dos filhotes.
Apesar de carnívoro, o lobo-guará gosta muito de frutas. Uma inclusive, leva seu nome: a fruta-do-lobo.
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Foto de abertura: Marcella Lasneaux