Onde existe alguma situação de calamidade pública no país – incêndios, tempestades, inundações -, lá está o Grupo de Resgate de Animais em Desastres (GRAD Brasil) para salvar e atender animais de diferentes espécies (exceto selvagens): cachorros, galos e galinhas, sapos, cavalos, gatos, papagaios…
Foi assim em Brumadinho, em 2019, nas enchentes na Bahia, em 2021, e na tragédia de Petrópolis no ano passado.
Não seria diferente, agora, com a tragédia vivida pelo povo Yanomami, de Roraima. “Os Yanomamis têm uma relação muito próxima com os animais, também os domésticos”, contou Carla Sassi, médica-veterinária e líder do GRAD, no Instagram da organização.

Apoio via PIX
Os brigadistas chegaram há cerca de uma semana em Boa Vista – onde atuaram junto à CASAI-Y, Centro de Assistência à Saúde Indígena Yanomami – e, de lá, seguiram para o atendimento dos animais nas comunidades, entre elas Kanaã, Auaris, Samaria e Ixalopiú, locomovendo-se de barco e/ou a pé.
No Instagram, o grupo mostra os veterinários em ação, conta sobre os procedimentos, também sobre os casos mais alarmantes que encontram e têm feito apelos por apoio financeiro para que possam garantir a continuidade do trabalho (como este).
Quem puder colaborar, basta fazer um PIX para o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal: 04.085.146/0001-38
Num dos posts, o GRAD listou medicamentos e testes mais urgentes como Bravecto, Nexgard ou Simparic, além de complexo vitamínico em comprimido, e testes rápidos para erliquiose, babesiose, giárdia e Fiv/Felv. Alguns seguidores marcaram indústrias farmacêuticas e grandes petshops em seus comentários, convidando-os a colaborar.
Muito além da desnutrição
Os integrantes do GRAD Brasil já atenderam centenas de gatos e cães desnutridos (principalmente o cães, que procuram comida até no meio da fogueira) e muito doentes, “com sinais clínicos compatíveis com diversas patologias”, como miíase (infestação por larvas de mosca na pele, mais conhecida como berne ou bicheira), diversos problemas de pele e oftalmológicos.
“A situação é surreal e absurda”, declarou Carla no quarto dia de trabalho numa das aldeias. “Ainda tenho que parar pra pensar em tudo que tenho visto e aprendido. Ainda tenho que absorver muita coisa pra expor minhas opiniões de forma clara. Mas, sem dúvida, é a pior situação em número de animais desnutridos que já trabalhei. Sem dúvida é a situação mais grave que já vi” (assista ao vídeo no final deste post).
Para detectar as doenças com precisão e tratar dos animais, os veterinários realizam testes rápidos em campo e coletam amostras de sangue que são encaminhadas para a Universidade Federal de Roraima (UFRR), parceira importante nesta jornada.
A infestação por pulgas é um dos problemas mais graves, que acomete tanto os indígenas como os animais. A maioria tem tungíase, infecção popularmente conhecida como bicho-de-pé.
Ela é causada pela fêmea do parasita Tunga penetrans, que ama ambientes secos e solos arenosos, e se alimenta de sangue humano ou de animais. A situação se agrava quando não há tratamento adequado, como é o caso dos Yanomamis e seus bichos.
Uma das principais causas de infestação é a exposição frequente ao meio ambiente, muito comum em favelas, zonas rurais e aldeias indígenas. No território Yanomami, a situação ainda é agravada pelo desequilíbrio ambiental causado pelo garimpo, que torna as infestações ainda mais propícias e frequentes.
O parasita entra na pele por qualquer parte do corpo que esteja em contato com o chão, principalmente pés, mãos, nádegas, causando coceira e ardência. Se não é retirado a tempo, ele coloca seus ovos na pele e a infecção se alastra. Nos casos graves, os animais podem perder o coxim, a parte macia a pata, e as pessoas, podem ter membros amputados (muito raro).
Para controlar essa infecção, Carla Sassi disse à reportagem da BBC Brasil (que esteve no local), que “a ocorrência da tungíase no território Yanomami é um bom exemplo do que chamamos de tríade da saúde única, que é a relação da saúde humana, animal e ambiental. Não adianta tratar cada uma separadamente – apenas tratando os três ao mesmo tempo, por um período de médio a longo prazo, é possível conseguir resultados no controle dessa zoonose”.
Resgate emocionado
A coragem, a determinação e a fé movem os médicos-veterinários e brigadistas do GRAD, além de muita compaixão, que dedicam não somente aos animais (impossível não chorar quando eles aparecem fazendo carinho, dando colo, conversando com os bichos resgatados e, muitas vezes, assustados), mas também aos seres humanos ao redor.
Com os Yanomami, essa situação corriqueira nos resgates ganha ainda maior dimensão devido à crise sanitária e humanitária da qual são vítimas, ao que tudo indica por conta do genocídio arquitetado por Bolsonaro, com a cumplicidade de seus colaboradores, nos últimos quatro anos.
Em um dos posts publicados pela organização, Carla não disfarçou a tristeza e o desespero que sentiu ao ver um rapaz que não conseguia mais caminhar devido à tungíase (foto abaixo), e estava muito deprimido. Ela fez um pedido emocionado às autoridades de Boa Vista para que o resgatassem. Impossível não se emocionar com a situação e seu apelo.
No dia seguinte, um avião foi buscá-lo e levou também, para Boa Vista, uma jovem mãe com seu bebê de 7 meses em estado grave de desnutrição, Junito, que Carla carregou no colo até o avião. Desta vez, o choro foi de emoção e de alegria pelo resgate rápido. Qualquer minuto faz a diferença.
A seguir, veja o último post publicado no Instagram pelo GRAD, que apresenta um dia de rotina no território Yanomami, fazendo testes rápidos e colhendo amostras de sangue. Depois, assista ao vídeo gravado pela médica-veterinária Carla Sassi no quarto dia de trabalho (que comentei no texto).
Fotos: reproduções do Instagram
Um horror. Não há como não participar, ajudando quem ajuda. Toca a alma de qualquer pessoa. Como pode chegar a esse ponto? Pobres animais e pessoas.
Bolsonaro tem que pagar essa e outras tragédias que estão sendo agora mostrada.
A que ponto chegamos; se a vida dos indígenas não teve valor nenhum, porque a dos animais haveria de ter. Tristeza imensa pelo que estamos vendo.