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“Não ter os braços é só um detalhe”, diz a jovem bailarina Vitória Bueno, que se tornou inspiração na internet

Vitória Bueno – ou Vih Bueno como é conhecida em seu Instagram – nasceu sem os braços. E, apesar de sua deficiência, em nenhum momento isso foi empecilho para tudo que quis fazer, muito menos para realizar o maior de seus sonhos.

Compreendia que sua condição física não poderia ser um obstáculo em sua vida, e procurava entendê-la como apenas uma condição a ser aceita e superada.

Ainda bem pequena, Vitória já manifestava o desejo de aprender ballet. Um dia, durante uma sessão de fisioterapia na APAE, ela revelou essa vontade.

Vitória para o espetáculo ‘Cats’ / Foto: Academia Ândrea Falsarella

Impressionada com a positividade e a obstinação da menina e também com seu progresso no tratamento, sua terapeuta procurou uma amiga, diretora de uma academia de dança de Santa Rita do Sapucaí, a cidade onde moram, em Minas Gerais, para conversar.

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Lá, relatou à Ândrea Falsarella, dona da academia que leva seu nome, a condição e a personalidade de sua paciente que, na época, estava com cinco anos. Falou também de seu sonho de ser bailarina. “Sabrina acreditava que a dança ajudaria a Vitória não só no desenvolvimento físico mas, também, emocional”, conta. E assim foi.

No dia seguinte, Vanda, a mãe de Vitória, a levou para conhecer Ândrea e conversar. “Jamais vou esquecer seu rostinho quando chegou na academia! Seus olhinhos encantados brilhavam, e eu, também devia estar com os olhos brilhando cheios de encantamento por aquela criança tão especial”.

Jazz, sapateado e samba

Desde que pisou na academia de Ândrea, Vih não parou de estudar e de se dedicar à dança. Está com dezesseis anos. Iniciou pelo ballet clássico, seu grande sonho. Há oito introduziu o jazz em sua rotina e há dois anos se dedica também às aulas de sapateado. Treina duas horas por dia, de segunda a sexta.

Outro dia, em seu perfil no Instagram, publicou um “desafio” (mais conhecido nas redes sociais pelo nome em inglês: challenge) em que troca de roupa e de ‘sapatilhas” e faz alguns movimentos de cada modalidade aprendida, convidando seus seguidores a contarem, nos comentários, de qual performance gostaram mais”.

E, no Carnaval, também mostrou que tem samba no pé, vestida com tutu (sainha típica de bailarina), usando sapatilhas e coroa de princesa.

A imaginação a seu favor

Foto: Lisley Muniz Guimarães para a Academia Ândrea Falsarella

“Não ter os braços é só um detalhe, não sinto necessidade de tê-los. Quando danço, os imagino como se estivessem lá e os sigo com os meus olhos”, conta Vitória.

Foi essa a forma que Ândrea, sua professora de ballet, encontrou para começar a treinar a garota, para que ela não se sentisse menos que as outras alunas e buscasse o equilíbrio para seus movimentos. E, assim, foi ganhando confiança, resistência e flexibilidade.

“Sempre pensei que nenhuma coreografia teria que ser alterada por minha causa”, ressalta Vitória. “Eu, sim, é que teria que me adaptar para acompanhar. Desde pequena me acostumei a acompanhar com os olhos, eu imaginava o movimento. Esquecia que não tinha os braços porque eu os via de forma invisível”.

A professora conta que, nas primeiras aulas com Vitória, se sentia constrangida com receio de magoá-la, por isso, propôs exercícios que enfatizavam os movimentos das pernas.

“No primeiro dia de aula, deixei de lado os exercícios para os braços, e na aula seguinte também. Até que percebi que as outras crianças precisavam fazer esses exercícios, e que eu teria que tratar a Vitória com o máximo de naturalidade possível”, lembra Ândrea.

“Foi então que lembrei da minha professora de ballet, nos ensinando a acompanhar nossos braços com a cabeça e o olhar”. E, assim, orientei a Vitória para que imaginasse que seus braços estavam ali, e os acompanhasse com a cabeça e o olhar”. 

Falsarella destaca que foi preciso adaptar alguns movimentos para que Vitória mantivesse o equilíbrio e subisse “na ponta”, mas ela tem ritmo, que é o que importa na dança, e se adapta muito fácil. “É danada!”.

Pliés, piruetas e outros desafios

Foto: Reprodução do Facebook / Academia Ândrea Falsarella

Assisti alguns vídeos em que Vitória se apresenta sozinha e com outras garotas. Dificilmente se desequilibra e, quando acontece, ri de si mesma. Aliás, está sempre sorrindo.

Ao deslizar pelo palco ou na academia, sozinha, é fácil esquecer que ela não tem braços. Se arrisca em assemblés, piruetas e outros desafios. Em apresentações com outras garotas, é quase imperceptível sua condição, tal sua desenvoltura, força e harmonia de movimentos.

“Dançar não é apenas uma forma de expressar felicidade, mas também uma forma de a alcançá-la”, acrescenta a professora.

Mais confiança

Foto: Reprodução do Facebook / Academia Ândrea Falsarella

Quando fundou sua academia, Ândrea adotou o método da Royal Academy of Dance, conceituada escola inglesa de ballet clássico, que periodicamente envia um representante para avaliar as alunas.

A primeira vez em que Vitória seria avaliada, a tensão foi inevitável. Andrêa conta que a avaliadora enviada, Pamela Richardson, chamou-a para conversar, apreensiva.

“Ela me disse que nunca tinha tido essa experiência, e que não sabia como seria: ‘Eu vou avaliar e enviar a nota para a Inglaterra e eles decidirão o resultado’. Naquela hora meu coração estremeceu porque minha maior preocupação era não constranger a Vitória. E rapidamente respondi: ‘Você vai se apaixonar por ela!”.

E acrescentou: “Quando o exame terminou, ela me chamou de novo. As lágrimas escorriam pelo seu rosto”. Ândrea me enviou o depoimento de Pamela por escrito:

“Me senti privilegiada por ter essa experiência, humilde com a pura alegria que ela expressava em sua dança e cheia de admiração, não apenas por ela, mas por seus colegas que se comportaram de maneira tão gentil e natural com ela, suas professoras que a haviam ensinado tanto, com o cuidado e a atenção de seus pais e familiares que obviamente apoiavam seus sonhos. Essa experiência confirmou meu sentimento de que a vida nunca para de nos mostrar como existem tantas pessoas maravilhosas em todo o mundo”.

E a avaliadora ainda acrescentou: “Eu preciso te agradecer porque hoje eu tive o dia mais emocionante da minha vida. Por mim, a nota dela é a máxima! Os braços não fazem a menor falta pra ela: eu enxergo os braços invisíveis da Vitoria”.

A jovem bailarina foi muito bem na avaliação e na nota final de Pamela: recebeu medalhas de ouro. E, assim conquistou ainda mais confiança em suas escolhas e ações.

“Somos mais do que nossas deficiências”

Foto: Reprodução do Instagram

Nas redes sociais, com sua simpatia, alegria e superação, Vitoria conquista mais e mais fãs a cada dia. Em 14 de janeiro, tinha 60 mil seguidores no Instagram; hoje, são 163 mil.

E se orgulha de ser um modelo para outras pessoas. “Aprendi que não devo desistir, não somente por mim, mas pelas pessoas que se inspiram em mim”.

Feliz com sua trajetória até aqui, diz: “Quando você tem força de vontade, quando você faz o que gosta, nada é um obstáculo. é apenas um desafio que você tem que enfrentar. As limitações e os desafios que a vida e a dança me trouxeram, eu aceitei, não como desculpa, mas como mais uma situação que tinha que enfrentar. Se você gosta, não pode desistir!”.

E finaliza: “Somos mais do que as nossas deficiências, por isso temos de perseguir os nossos sonhos”.

Vitoria dedica muitas horas do dia à prática de dança, mas também estuda. E quer fazer faculdade. “Eu ja falei pra ela que pode fazer faculdade tranquila porque, se precisar de emprego, já tem um lugar garantido aqui na academia, como professora”, ressalta Ândrea.

Tudo com os pés

Foto: Reprodução de vídeo do Instagram

A flexibilidade e a força que conquistou com o ballet não se restringem às práticas na academia. Vitória as aplica também nas tarefas do dia a dia.

Com os pés, ela faz tudo que fazemos com as mãos. Escova os dentes, arruma os cabelos, se veste ou se despe, se maquia, calça as sapatilhas, come, cozinha, segura o celular e navega pelas redes sociais, faz compras no supermercado.

O padrasto de Vitória contou à agência de notícias Reuters que fica admirado com sua destreza: “O que ela faz é impressionante! O que faz só com os pés, às vezes eu não consigo fazer com as mãos”.

Já a mãe contou que não ficou triste quando a filha nasceu sem os braços. Mas tem mágoa, até hoje, ao recordar a insensibilidade dos vizinhos: “As pessoas faziam fila fora de casa para ver Vitória e, quando se aproximavam, levantavam as mangas de sua roupa”.

Foto (destaque): Academia Ândrea Falsarella/Divulgação

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