No dia em que o Brasil ultrapassou a marca de 500 mil mortes por covid-19 milhares de brasileiros foram às ruas para protestar contra o governo Bolsonaro.
Em 19 de junho, em mais uma manifestação linda – a primeira foi em 29 de maio – moradores de cerca de 400 cidades de todas as regiões do país declararam indignação, repúdio e raiva contra a gestão do presidente que se negou a comprar vacina, desdenhou dos doentes e das mortes, investiu em medicamentos sem eficácia cientifica, reduziu (e suspendeu) o auxílio emergencial e promoveu aglomerações, sempre revelando total descaso com a vida.
Irresponsável e negacionista
Em março deste ano, o médico e neurocientista Miguel Nicolelis previu que o Brasil chegaria a meio milhão de óbitos em 19 de julho, se o lockdown não fosse adotado.
Chegamos à essa marca exatamente um mês antes, em 19 de junho, e estamos passando por numa das piores fases da pandemia, com cepas diversificadas.
“Em breve, ultrapassaremos os Estados Unidos em número de mortos”, disse ele em entrevista ao jornal O Globo na semana passada.
Segundo a Universidade Johns Hopkins, até ontem, 20/6, morreram 601.818 pessoas no país. No Brasil, de acordo com o Consórcio de Veículos de Imprensa – que se baseia em dados das secretarias estaduais de saúde – já chegamos a 501.825 mortos e 17.926.393 casos (dados divulgados às 20h de ontem, sem os do estado de Roraima).
(vale ressaltar, aqui, que esse consórcio foi criado em junho de 2020 para driblar a recusa do Ministério da Saúde de divulgar informações atualizadas sobre a situação da pandemia no país)
Então, este não seria o melhor momento para ir às ruas protestar? Talvez, mas nada é pior do que estar nas mãos de um governante irresponsável e negacionista. Nem o coronavírus.
E este é um movimento pela vida e pelo futuro.
Máscara e vacina pra todos!
O cuidado com as medidas de proteção indicadas pela OMS provam que todos os manifestantes têm empatia e pensam no coletivo. A maioria – se não todos! – usou máscara. Em algumas cidades, grupos ofereciam máscaras e álcool gel gratuitamente. E as aglomerações inevitáveis não foram uma constante.
Cartazes, faixas e palavras de ordem que dominaram as manifestações pelo país destacavam as pautas relacionadas à pandemia – como a falta de vacina e a fome e o desemprego que se agravaram -, além das ameaças à educação, à ciência, aos povos indígenas, ao meio ambiente. À vida.
Muitos foram os brasileiros que declararam que, se Bolsonaro tivesse comprado a vacina – respondido aos mais de 100 e-mails da Pfizer, só para citar um episódio desse crime -, seu pai, mãe, filho/a, avô/avó ou amigo/amiga não teriam morrido.
Teve quem pediu “vacina para todes!”. Quem pediu “vacina no braço e comida no prato” e bradou por emprego e contra o racismo. E quem lembrou da importância da segunda dose da vacina e que Bolsonaro, que não é médico, receitou – e continua receitando – cloroquina!
Paulo Gustavo, indígenas e a carestia
Em São Paulo e Rio de Janeiro cartazes lembraram o ator Paulo Gustavo, vítima fatal da covid-19, que comoveu o país e foi um marco nesta pandemia.
Quinze dias depois de sua morte, em 29 de maio, aconteceu a primeira mobilização nacional contra o governo, que viralizou nas redes sociais com a hashtag #29M, além da tradicional #forabolsonaro.
Em Brasília, os indígenas acampados na cidade desde 8 de junho para reivindicar seus direitos constitucionais – Acampamento Levante pela Terra, como já contamos aqui e aqui -, se juntaram às mobilizações de 19 de junho para, mais uma vez, fazer ouvir sua voz contra as ameaças de Bolsonaro e seus aliados.
O povo Guarani Mbya, que vive no Jaraguá, em São Paulo, está bem representado em Brasília, mas também esteve presente ao ato na Avenida Paulista, reforçando a luta contra o PL 490 – que ignora a Constituição – e os ataques do governo aos povos originários.
A alta disparada dos preços também esteve estampada em faixas e cartazes, aludindo à energia, à comida, ao gás.
A bandeira nacional, de volta
“Sequestrada” pelo presidente logo no início de seu governo, a bandeira nacional virou símbolo de sua gestão alicerçada em mentiras e muita desumanidade:
– Quer que eu faça o que? Não sou coveiro!
– Quer comprar vacina, vai na casa da tua mãe!
– Chega de frescura e de mimimi! Vão ficar chorando até quando?
Seus eleitores fazem questão de usá-la, seja como emoji em seus posts e comentários na internet, ou em manifestações de apoio ao presidente nesta pandemia. Com um detalhe: sempre sem nenhuma proteção contra a covid-19, seguindo as orientações do “mito”.
Mas a bandeira é nossa! É de todos! De todes! Ela voltou às ruas nas manifestações pacíficas do último sábado, 19 de junho.
Nas ruas e nas janelas, em bandeiras ou faixas, por vezes acompanhadas de bandeiras e faixas vermelhas que simbolizavam as mais de 500 mil vidas perdidas, o sangue.
Abaixo, a belíssima imagem de Ricardo Stuckert que viralizou nas redes sociais e dá bem a ideia da dimensão do ato em São Paulo que, numa pandemia tão brutal como esta, ocupou nove quarteirões da Avenida Paulista, entre a Praça do Ciclista, na esquina com a Avenida da Consolação, e o prédio da Fiesp.
Que venham outras manifestações de alerta e indignação! O que não dá mais é pra ficar em casa protestando nas redes sociais, apenas. Todos os atos contra a gestão de Bolsonaro são urgentes e necessários.
Foto (destaque): Mídia Ninja/SP