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Indígenas Guarani Kaiowá retomam terra no MS após acordo homologado pelo STF: fazendeiros vão receber R$ 145 milhões 

Indígenas Guarani Kaiowá retomam terra no MS após acordo homologado pelo STF: fazendeiros vão receber R$ 145 milhões 

Para tornar possível um acordo de conciliação e garantir a retomada da Terra Indígena Nhanderu Marangatu (Ñande Ru Marangatu) pelo povo indígena Guarani Kaiowá, no município de Antônio João, no Mato Grosso do Sul, o governo federal adquiriu 9.300 hectares dos 9.570 sobrepostos (tomados, talvez com a anuência de algum governo) pela Fazenda Barra, de propriedade de Roseli Ruiz e Pio Queiroz Silva. 

Quer dizer, 270 hectares, que originalmente pertencem aos indígenas, continuarão sob posse dos latifundiários que vão receber R$ 145 milhões para liberar a parte do território comprada. 

Do governo federal, receberão, agora, R$ 28 milhões a título de “benfeitorias de boa fé” apontadas em avaliação feita pela Funai em 2005 (corrigidas pela inflação e a taxa Selic), e depois mais R$ 101 milhões de indenização pela terra nua. Já o governo estadual deve efetuar, em depósito judicial, o valor de R$ 16 milhões.

Assim que o pagamento das benfeitorias for realizado, os proprietários têm 15 dias para se retirar do local. Após esse prazo, os Guarani Kaiowá poderão ingressar no espaço de forma pacífica.

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A celebração do acordo também prevê a extinção, sem resolução de mérito, de todos os processos em tramitação no Judiciário que discutem litígios envolvendo o conflito da demarcação da Terra Indígena.

Para valer, a conciliação ainda depende da homologação pelo ministro Gilmar Mendes e de passar em votação pelo plenário do STF.

“Sete horas”

A audiência para o acordo de conciliação foi realizada em 25 de setembro e durou sete horas, contou Eloy Terenasecretário executivo do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), que coordenou a sessão. A mediação e a relatoria couberam ao ministro Gilmar Mendes, do STF (os dois aparecem na foto acima).

Além de membros da Funai, da Advocacia-Geral da União e do governo do Estado de Mato Grosso do Sul, participaram lideranças Guarani Kaiowá, representantes dos proprietários da fazenda, além do deputado federal Vander Loubet, coordenador da bancada do Mato Grosso do Sul em Brasília (DF), que acompanhou o caso.  

Segundo o parlamentar, parte da área adquirida pelo governo federal já está ocupada pelos indígenas. “É a área mais antiga, a Terra de Marçal de Souza” [indígena assassinado em 25 de novembro de 1983]. “Este acordo põe fim a um conflito que já se arrasta por muitos anos e abre espaço para que outros acordos sejam feitos em situações semelhantes. Ou seja, é um grande avanço nessa questão”.

Para Gilmar Mendes, “o esforço conjunto dos envolvidos na busca por uma solução consensual é digno de elogio”. O ministro Gilmar Mendes, ainda destacou o “desfecho pacífico” para o impasse.

Sete mortes  

Os conflitos entre a família de Roseli Ruiz e os Guarani Kaiowá vem desde o assassinato deSimeão Vilhalva, em 29 de agosto de 2015, após violenta ação de fazendeiros e jagunços armados. Eles partiram da sede do sindicato rural do município de Antônio, que era presidido por Roseli.

“Cansados de esperar que o STF reiniciasse o julgamento da ação, em 12 de setembro os Guarani Kaiowá tentaram mais uma vez a retomada da parte da TI que ainda não está sob a posse dos indígenas”, conta o CIMI – Conselho Indigenista Missionário.

Diferente de outras ações, nesta, Roseli não precisou mobilizar uma ofensiva privada. A Justiça Federal de Ponta Porã autorizou a Polícia Militar do MS a proteger a propriedade da ruralista. Segundo relatos dos próprios indígenas, as rondas foram ostensivas e o pelotão da PM manteve-se alerta ininterruptamente.

Numa das investidas dos Guarani Kaiowá, a PM recebeu-os a tiros, ferindo três indígenas – dois homens por disparos de bala de borracha e uma mulher, atingida no joelho por disparo de arma de fogo.

O conflito fundiário já dura quatro décadas, se intensificou nos últimos 20 anos e ganhou ainda mais visibilidade quando o jovem indígena, Neri da Silva Guarani Kaiowá, de 23 anos, foi assassinado por policial militar com um tiro na cabeça. 

Foi devido à essa execução que, na semana passada (18), a ministra Sonia Guajajara se reuniu com Gilmar Mendes para reiterar a importância de se concluir o processo demarcatório da TI Nhanderu Marangatu.

“A Terra Indígena Nhanderu Marangatu foi declarada para posse e usufruto exclusivo e permanente do povo Guarani Kaiowa” [pela Funai], “em 2002. Em 2005, o presidente Lula homologou a demarcação desse território, mas o então ministro Nelson Jobim (STF) suspendeu os efeitos do decreto presidencial“, contou a ministra à Agência Brasil. A decisão de Jobim atendeu a pedido de fazendeiros, entre eles Roseli Ruiz.

Até a semana passada, foram mortos indígenas, incluindo o adolescente Fred Souza Garcete, de 16 anos. Ele foi encontrado sem vida, cinco dias depois de Neri, às margens da rodovia MS-384, que leva à terra disputada. 

Amanhã (28), das 6h às 17h, será realizada cerimônia religiosa e cultural no local onde Neri da Silva foi morto, com a presença de 300 indígenas e sob a supervisão da Funai e da Força Nacional.

Contrasenso

Por fim, vale destacar que os proprietários da Fazenda Barra são pais de Luana Ruiz, a advogada responsável pela ação que garantia a ‘proteção’ da Fazenda Barra. Ela foi chefe de gabinete na Secretaria de Estado de Infraestrutura e, em agosto, assumiu o cargo de Assessora Especial III na Casa Civil do governo de Eduardo Riedel.

E, como se não bastasse, a latifundiária Roseli Ruiz foi indicada por parlamentares dos partidos Republicanos e Liberal (PL) para ser especialista na próxima audiência da Câmara de Conciliação do STF (que deve acontecer em 23/10) e trata das cinco ações que discutem a constitucionalidade da Lei do Marco Temporal (Lei 14.701/2023) para demarcação de terras indígenas.

Essa lei foi aprovada com urgência pela Câmara dos Deputados em revanche à decisão unânime – 9 votos X 2 votos – do STF, que considerou o marco temporal como inconstitucional.

Na última audiência, em agosto, integrantes da APIB – Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, abandonaram a comissão em protesto por não serem ouvidos em suas reivindicações e, também, porque se recusam a “negociar o marco temporal e outras violações contra os direitos indígenas, já garantidos na Constituição Federal de 1988 e na Convenção 169 da OIT – Organização Internacional do Trabalho”.
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Foto: Antonio Augusto/STF

Com informações da Agência Brasil, do CIMI, GovBr, STF

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