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Formiga se despede da seleção brasileira de futebol em Manaus: ela foi sempre uma voz pelos direitos das mulheres

Formiga se despede da seleção brasileira de futebol em Manaus: ela foi sempre uma voz pelos direitos das mulheres

Por Leanderson Lima*

Foi a última vez que Miraildes Maciel Mota, a jogadora Formiga, de 43 anos, vestiu a camisa 8 da Seleção Brasileira de futebol feminino. E a despedida dela, nesta quinta-feira (25), foi na Arena da Amazônia, em Manaus, na abertura do Torneio Internacional de Futebol Feminino. As brasileiras venceram a equipe da Índia por 6 a 1. A noite foi carregada de emoção e muitos simbolismos.

Formiga é uma lenda viva do esporte mundial. Mulher, negra e lésbica, ela gravou seu nome na história ao se tornar a única jogadora – entre homens e mulheres – a disputar sete Copas do Mundo –  1995, 1999, 2003, 2007, 2011, 2015 e 2019 – e sete edições dos Jogos Olímpicos – 1996, 2000, 2004, 2008, 2012, 2016 e 2021 -, marca que dificilmente será igualada no futebol.

Nas Olimpíadas, foram duas medalhas de prata conquistadas – 2004 e 2008 -, e nas Copas, uma medalha de prata em 2007.  Com a camisa da Seleção Brasileira, a jornada durou 234 jogos, nos quais marcou 37 gols, em 26 anos de atuação.

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Resistência feminina

Formiga se despede da seleção brasileira de futebol em Manaus: ela foi sempre uma voz pelos direitos das mulheres

Mais do que uma craque em campo, Formiga sempre foi uma voz pelo direito de a mulher ser o que ela quiser. Em um país historicamente machista, que chegou a proibir mulheres de praticar futebol, não é pouco.  A proibição estabelecida em decreto assinado pelo então presidente Getúlio Vargas perdurou de 1941 a 1979, e causou sérios atrasos ao desenvolvimento da modalidade no País.

“É bom ver tantas meninas terem a oportunidade de estar na Seleção Brasileira sem enfrentar tanta dificuldade”, disse a veterana, durante coletiva à imprensa. De fato, os tempos são outros para o futebol feminino no Brasil, mas o cenário era totalmente diferente de quando Formiga começou.

“Acredito muito nas meninas que estão chegando agora. Que estão tendo a oportunidade de trabalhar com uma treinadora que tem um currículo invejável, que está ensinando muitas coisas pra elas. Espero que tenham esse comprometimento, que a nossa luta continue. Não vai parar por aqui, temos muito ainda a conquistar”, pontuou a volante.

Para a camisa 8, a hora é de lapidar os diamantes brutos do futebol brasileiro. “Para que elas tenham oportunidade de conquistar o mundo, que possam ter vida longa na Seleção e que construam a história delas, não só por status, mas que realmente tenham uma história linda, que se identifiquem com o futebol feminino e que elas possam ter êxito”, acrescentou a atleta.

Formiga se despede da seleção brasileira de futebol em Manaus: ela foi sempre uma voz pelos direitos das mulheres

Contra o racismo

Antes de a partida começar, as atletas da Seleção Brasileira se ajoelharam e cerraram os punhos para o alto, em protesto contra o racismo. “É lamentável que no século 21, a gente tenha que estar passando por isso. Acredito que não só no futebol feminino, fora dele também. É uma pena que este racismo não foi zerado. Não digo só aqui no Brasil, mas no mundo. Acredito que a gente tenha que começar a aumentar a pena porque isso é crime”, opinou Formiga.

A volante começou o jogo no banco de reservas, afinal, antes das homenagens merecidas à jogadora brasileira, a técnica do Brasil, a sueca Pia Sundhage, precisava fazer alguns testes em campo. E não demorou nem 1 minuto para que a Seleção abrisse o marcador com Debinha. O time da Índia empatou com Manisha. Depois disso, só deu Brasil. No primeiro tempo, Gio marcou e ampliou o placar para 2 a 1. A goleada se consolidou no segundo tempo, com Ary (duas vezes), Kerolin e Geyse.

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Aos 23 minutos do segundo tempo, a torcida começou a pedir a presença da volante em campo. Nove minutos depois ela entrou, no lugar de Debinha. A partida já estava 5 a 1. E a técnica Pia Sundhage decidiu homenagear a brasileira lançando-a para jogar no ataque. Ao longo da carreira, Formiga “carregou o piano”, como se diz no jargão futebolístico, na função de volante – uma jogadora de meio campo que tem funções mais defensivas. E Formiga, lógico, não fez feio, e ainda ajudou na construção da jogada que deu origem ao sexto gol do Brasil, marcado por Ary.

Formiga quase deixou o dela, não fossem as boas defesas feitas pela goleira da Índia. No fim, não teve gol, mas isso não diminuiu o brilho da estrela da festa. Apesar de a despedida ter sido no “ataque”, a história de Miraildes foi construída na defesa da Seleção Brasileira e na defesa da bandeira do futebol feminino.

Quando a árbitra deu o apito final, Formiga foi ovacionada pelo público, homenageada pelas colegas de seleção, e também pela seleção rival. A jogadora foi surpreendida com uma homenagem feita pela Rainha Marta, a maior jogadora de futebol de todos os tempos, eleita seis vezes a melhor do mundo, que veio ao evento especialmente para homenagear a amiga. Na arquibancada da Arena, Formiga também contou com a presença da mãe, Celeste, que pela primeira vez, viajou para acompanhar a filha. Logo ela, que tem medo de voar. A companheira Erica Jesus também estava no estádio.

Jogue Como Uma Garota

Antes da partida de futebol entre as seleções feminina do Brasil e Índia, a jogadora brasileira Formiga foi homenageada pela campanha Jogue Como Uma Garota, que na Copa do Mundo de Futebol Feminino de 2019 mobilizou mulheres de várias cidades do país para torcer para a Seleção Brasileira.

A campanha Jogue Como Uma Garota foi idealizada pela designer Karina Gillon, fundadora da marca feminista @peita, em Curitiba. Ela convidou embaixadoras em 21 cidades brasileiras para promover a mobilização de torcedoras da Seleção Brasileira Feminina. Em Manaus, é embaixadora a jornalista Kátia Brasil, cofundadora da agência Amazônia Real. Já em São Gabriel da Cachoeira, a embaixadora é Ednei Teles, indígena do povo Arapaso, e coordenadora do Campeonato de Futebol Feminino.

Formiga falou de seu legado para o futebol feminino brasileiro. “Eu acredito que hoje elas (as meninas) possam sonhar com um futuro melhor no futebol feminino onde muitas barreiras que enfrentei no começo. Tenho certeza que metade delas não vão passar por tantas barreiras, porque hoje o futebol feminino virou realidade. Que elas continuem esse legado acreditando que a cada dia o futebol feminino está melhorando. A luta foi lá atrás e hoje ela só tem que continuar para que a gente não possa dar três passos para trás. Se for para dar os passos, realmente, que seja para frente para que a gente possa conquistar ainda mais espaço não só no Brasil, mas no futebol feminino mundialmente”, disse Formiga.

*Este texto foi originalmente publicado no site da Amazônia Real, em 26/11/2021, e reproduzido aqui, no Conexão Planeta, por Mônica Nunes

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