O documentário Fogo Pantanal Fogo, filme inédito do cineasta georgiano Sandro Kakabadze – que estreia hoje, 9/12, às 20h, no Cine Marquise, em São Paulo (capital) e, a partir de amanhã, 10/12, poderá ser assistido gratuitamente no canal do Documenta Pantanal no YouTube –, apresenta novas percepções sobre a escalada das queimadas no Pantanal, fenômeno de origens múltiplas que ganhou dimensões gigantescas a partir de 2020, quando a gravidade dos incêndios devastou 26% da maior planície alagável do planeta.
Retrato imersivo
Com produção do Documenta Pantanal – em parceria com a Âmbar Filmes e apoio da Associação Onçafari, Acaia Pantanal, Instituto Homem Pantaneiro, SOS Pantanal e MapBiomas -, o documentário registra a repetição, ano a ano, do drama de 2020, a partir de filmagens rodadas entre junho e outubro deste ano. O resultado é um retrato imersivo das severas queimadas registradas em meio a maior seca histórica do bioma.
“Incialmente eu pretendia fazer um filme sobre desmatamento no Pantanal, mas durante a pesquisa percebemos a iminência dessa nova onda de queimadas, e tanto eu quanto Mônica Guimarães e Teresa Bracher (coordenadoras do Documenta Pantanal) entendemos que o tema mais urgente seria um filme sobre as diferentes facetas do fogo no Pantanal”, explicou.
“As queimadas tiveram uma primeira onda em maio, começamos a gravar em junho e elas se agravaram de agosto a outubro. Infelizmente, temos certeza de que haverá outras mais. Desde que comecei a filmar no Pantanal não tenho memória de uma seca tão severa quanto essa. Minha percepção foi confirmada pelos satélites do MapBiomas, que fazem esses registros desde 1985 e comprovam que essa é a maior seca a devastar o Pantanal”, completa.
O filme está estruturado em três partes:
- o cineasta volta suas lentes para o cerco fechado de três dias de queimadas com um poder avassalador de destruição, fazendo uma imersão na desafiadora rotina dos brigadistas do Prevfogo, grupo estruturado pelo Ibama que atua no combate aos incêndios florestais e queimadas não autorizadas e na indução de mudanças da cultura do uso do fogo na agricultura;
- Kakabadze aborda as diferentes formas como as queimadas têm início, enfatizando não só o impacto da emergência climática e das queimadas criminosas, como, também, revelando o potencial aparentemente menos ofensivo de práticas culturalmente aceitas décadas atrás, tais como o manuseio do fogo para repelir abelhas e pernilongosdurante a coleta de mel silvestre e de iscas para pescas, ações que podem deflagrar focos de grandes queimadas, como exemplifica o filme; e
- retratando um balanço desolador, a terceira parte do “Fogo Pantanal Fogo” registra as consequências da passagem devastadora do fogo para a vegetação nativa e para a fauna pantaneira, num cenário onde o verde é substituído pelo rastro misto de negro e cinza deixado pelo fogo.
Das guerras às causas ambientais
Nascido na Georgia (país localizado no Cáucaso, no extremo leste da Europa, na fronteira com o continente asiático), na Europa Oriental, Kakabadze se formou em Jornalismo pela Universidade Estatal de Moscou.
Atuou como repórter de TV cobrindo pautas sociopolíticas como a Guerra Russo-Georgiana, conflito ocorrido em seu país que, ao longo de cinco dias de agosto de 2008, produziu 800 mortos.
Em consequência desse episódio Kakabadze partiu para a Inglaterra, onde atuou como correspondente internacional e realizou suas primeiras experiências de filmagem.
Estimulado por essa nova linguagem fez mestrado em Documentário na Goldsmiths University of London, se especializando em direção, direção de fotografia e montagem.
Durante sua permanência em Londres conheceu sua atual companheira, a arquiteta Terra Capobianco, e com ela veio morar no Brasil em 2013, ano em que também conheceu a cineasta Eliana Caffé, com quem trabalhou, colaborando em dois longas-metragens: A Margem da Paisagem(2013); e Era O Hotel Cambridge(2016).
Fascinado com os personagens deste último, Kakabadze passou a produzir documentários que retratavam a realidade de refugiados no Brasil e o dia a dia de moradores de ocupações coordenadas por movimentos sociais de luta por direito à habitação.
A guinada do diretor para a temática socioambiental se deu quando ele iniciou a produção de filmes para o MapBiomas, parceria que já acumula mais de 30 títulos e que possibilitou a aproximação de Kakabadze com o Documenta Pantanal.
Impactante, o documentário Fogo Pantanal Fogo repete a fórmula consagrada em mais de 50 filmes de curta, média e longa metragens dirigidos por Kakabadze. Para essas produções, o cineasta percorreu 23 estados do país ouvindo relatos de populações locais, ambientalistas, cientistas, instituições do terceiro setor e entidades governamentais para documentar as transformações que o meio ambiente do Brasil vem sofrendo não só pela ação humana, que recrudesceu a prática do desmatamento e de incêndios criminosos, como também pela acelerada ascensão da emergência climática e do aquecimento global.
“Em 2022, por causa desses trabalhos que fiz para o MapBiomas, Mônica e Teresa me convidaram para fazer o filme A Seca no Pantanal: 2019 – 2022, de 40 minutos. Durante o processo percebi como a seca afeta completamente o ecossistema. Os tipos de animais, por exemplo, logo começam a mudar. A população de cervos, que não precisam tanto de água, rapidamente cresce. A população de jacarés, completamente dependente da água, diminui. Até o tamanho deles é impactado porque há também menos peixes, seu alimento natural”, destaca.
Lançado em 2022, o primeiro longa-metragem de Kakabadze, A Margem do Ouro (não disponível online), foi rodado na bacia do Rio Tapajós, a maior região produtora de ouro do Brasil.
Na 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, o filme conquistou o Prêmio Abraccine de Melhor Diretor Estreante. Em agosto de 2024 também foi laureado com uma Menção Honrosa do Júri da Mostra Ecofalante de Cinema, o mais importante evento sul-americano dedicado ao cinema socioambiental.
“Em dez anos de atuação como documentarista no Brasil, com seu olhar sensível, Sandro já deixou um número expressivo de produções e importantes contribuições para a nossa filmografia, sobretudo no contexto de filmes dedicados à discussão de pautas socioambientais e de preservação”, conta Mônica Guimarães.
“Fogo Pantanal Fogo é a terceira produção que ele desenvolve em parceria com o Documental Pantanal. Para nós, é uma honra poder contribuir para a continuidade dos trabalhos de um jovem diretor tão comprometido em retratar os desafios que temos enfrentado”, completa.
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